quarta-feira, 30 de março de 2011

Efetividade da Lei Maria da Penha

          Tendo em vista que recentes decisões da Justiça têm criado obstáculos à  aplicação da Lei Maria da Penha, o Ministério Público Federal e o Executivo assinaram um protocolo de cooperação para aperfeiçoar a sua aplicação.

          Também em 22 de março, realizou-se no plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, a V Jornada de Trabalhos sobre a Lei Maria da Penha, com o objetivo de discutir a efetividade da lei para o combate à violência doméstica e familiar.

          De acordo com Raquel Dodge, subprocuradora-geral da República, conforme dados reunidos pela Secretaria de Políticas para as Mulheres e pelas promotoras públicas especializadas, não houve diminuição da violência contra a mulher após a Lei Maria da Penha.

          A falta de uniformidade na aplicação da lei, faz com que ela seja interpretada diferentemente, a depender do promotor, do juiz, ou do delegado de polícia, abrindo caminho para que vítimas desistam de denúncias, agressoress deixem de ser condenados e processos sejam anulados.

          São três os principais pontos polêmicos que têm  motivado diferentes interpretações:

          Representação da vítima

          Alguns defendem que os crimes praticados em decorrência da Lei Maria da Penha são de ação pública, ou seja, não há necessidade de manifestação da vontade da vítima no sentido de processar criminalmente o seu agressor. Para tanto, basta que a notícia da agressão chegue às autoridades competentes.

          Outra corrente, porém, entende que é necessária a manifestação da vontade da mulher, por meio de representação criminal, de modo a autorizar o ajuizamento da ação pelo Ministério Público.

          Audiência de Confirmação

          Outra controvérsia é sobre a obrigatoriedade de a mulher agredida comparecer perante um magistrado, confirmando a sua intenção de processar o agressor.

           Há quem entenda que, após a manifestação da vítima, já colhida na fase investigatória, essa audiência só deve acontecer quando a mulher manifestar espontaneamente que quer se retratar.

          Já outros, contudo, defendem que essa audiência é obrigatória em todos os casos, mesmo naqueles em que a vítima já tenha feito a representação.

          Segundo informações de juízes, e promotores, em São Paulo e no Distrito Federal essa exigência é de praxe. O índice de desistência nessas audiências chega a 80%, por vários motivos, como medo, vontade de esquecer, ou mesmo reconciliação.

          Em Minas, a audiência também é considerada obrigatória na maioria dos casos e ignorá-la pode levar à anulação do processo, embora já existam decisões que a entendem como facultativa.

          No Rio Grande do Sul, a audiência só ocorre nos casos em que a mulher dá indícios de que pretende desistir da audiência.

          Processo Suspenso

          Outra polêmica na aplicação da lei está relacionada à possibilidade de o agressor, desde que cumpridas determinadas condições, ter o curso de seu processo suspenso por um período de dois a quatro anos. Essa medida vinha sendo defendida por um número significativo de juízes e promotores, sob a alegação de que ela aumentaria a vigilância sobre o agressor e uma solução mais rápida do conflito.

          Em decisão proferida dia 24 deste mês, contudo, o Supremo Tribunal pôs fim à polêmica ao considerar constitucional o artigo 41 da Lei Maria da Penha, que veda esse tipo de benefício nos casos de agressão contra a mulher.

          Essa decisão do Supremo Tribunal reforma entendimento anterior do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, em julgamento ocorrido em dezembro de 2010, passou a admitir para os agressores de mulheres a aplicação da suspensão condicional da pena prevista em casos de condenação do réu à punição inferior a um ano, decorrentes de agressão leve, embora o artigo 41 da Lei Maria da Penha a proibisse.

          No julgamento no Supremo Tribunal, o relator do processo, ministro Marco Aurélio de Mello, alertou para o fato de que a Lei Maria da Penha tem que ser diferenciada das demais. "As mulheres que sofrem violência doméstica não são iguais às que não sofrem violência doméstica", afirmou. Citando Rui Barbosa, concluiu: "A verdadeira igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais".

          O entendimento do Supremo Tribunal Federal, vem reforçar a aplicação efetiva da lei objetivando punir, de fato, a agressão contra as mulheres.

          Segundo dados do CNJ, até julho do ano passado, a aplicação da Lei Maria da Penha, editada em 2006, resultou em 111 mil sentenças. Esse número com certeza seria muito maior se  não houvesse tanta resistência à aplicação da lei, por força da vigente cultura machista

          Ao defender o texto da lei, no início do julgamento no STF, a subprocuradora-geral da República, Déborah Duprat enfatizou: "Considerando que vivemos numa sociedade marcadamente patriarcal, ao tratar igualmente homens e mulheres numa situação de violência doméstica, incidiríamos em um preconceito".

          Que a decisão do Supremo sirva de exemplo, revertendo o preconceito contra a aplicação da lei!

domingo, 27 de março de 2011

O STF e a Lei da Ficha Limpa

         
        Embora a Lei Complementar 135/10 ( Lei da Ficha Limpa) tenha nascido do anseio popular e angariado 1,6 milhões de assinaturas, corre o risco de ver a sua constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal

         Na opinião do ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), "a constitucionalidade da lei, referente aos seus vários artigos poderá vir a ser questionada futuramente antes das eleições de 2012. Segundo ele, nesse futuro exame "a lei vai ser fatiada como um salame e será analisada alínea por alínea".

           Na última quarta-feira, os ministros do Supremo Tribunal Federal apenas decidiram que em razão de haver sido publicada em 07 de junho de 2010, a lei não poderia ser aplicada para as eleições do ano passado, porque conforme disposto no artigo 16 da Constituição Federal, regras que alteram o processo eleitoral, só são válidas, após um ano de vigência, verbis: " Artigo 16: A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data de sua vigência".                     

        Essa divergência de interpretação, que, em setembro do ano passado, havia dividido o Supremo é decorrente da seguinte indagação: Ao estabelecer novas regras, novas hipóteses de inelegibilidade para a inscrição dos candidatos, a lei estaria alterando o processo eleitoral?

          A interpretação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sempre foi a de que o prazo de um ano para a aplicação da lei só se justificava nas hipóteses em que houvesse desequilíbrio na disputa, beneficiando ou prejudicando determinadas candidaturas. Como a Lei da Ficha Limpa é linear, isto é, aplica-se indistintamente a todos os candidatos, o TSE firmou o entendimento de que não se poderia afirmar que ela interfereria no processo eleitoral. Daí ser imediata a sua aplicação, até porque sempre foi entendimento daquele Tribunal de que o processo eleitoral só se inicia depois do registro das candidaturas, cuja data para as eleições de 2010 era  05 de julho daquele ano. No caso, o princípio de que não se deve alterar o processo eleitoral, depois de começado, não teria pois sido violado, pois a lei foi publicada antes. de ele haver se iniciado.

         Contudo, com a nova votação do STF, esse entendimento do TSE não mais prevalece, pois, por 6 votos a 5, a Suprema Corte entendeu que à luz do artigo 16 da Constituição a Lei da Ficha Limpa não poderia ter sido aplicada às eleições de 2010. Considerando que ao iniciar o julgamento, decidiu-se que ele teria Repercussão Geral, esse novo entendimento se aplica a todos os demais processos, que versem sobre a mesma causa de pedir.

        Outro ponto da lei que vem sendo questionado é o da possibilidade de o político ser excluído da disputa eleitoral por uma condenação ocorrida no passado.

        Tendo o candidato sido condenado antes da vigência da nova legislação,  há uma corrente que valendo-se do princípio de direito penal de que a lei não pode retroagir para prejudicar o réu, entende que a nova lei não se aplica a fatos pretéritos. A prevalecer esse entendimento, todos os políticos condenados por um órgão colegiado, antes de 07 de junho de 2010 - data da publicação da lei - seja por compra de votos, fraude, falsificação de documento público, lavagem e ocultação de bens, improbidade administrativa, entre outros crimes, não seriam atingidos pela norma.

         De acordo com comentários do ministro Gilmar Mendes: " Se você puder apanhar fatos da vida passada para atribuir efeitos futuros, talvez não haja mais limites".

          Essa opinião, porém, não é unânime no meio jurídico. Para a vice-procuradora eleitoral. Sandra Cureau, não há que se cogitar a não aplicação da Ficha Limpa nos processos em tramitação, já julgados, ou em grau de recursos. Também o magistrado Marlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados, integrante do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE), afirma: "Para ser candidato, a lei estabelece as condições. De uma eleição para outra as condições podem ser ampliadas. Foi o que ocorreu com a Ficha Limpa. Portanto, a inelegibilidade não é pena. Sequer é sanção penal".

          Objetivando esclarecer eventuais dúvidas pontuais da constitucionalidade da lei, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, disse que a entidade estuda ingressar com uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADC), para que o Supremo se pronuncie sobre a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa.

          Nas suas palavras, embora o sentimento da sociedade seja de frustração, tal fato não significa uma derrota, porquanto a lei é constitucional e será aplicada nas próximas eleições.

           É o que o povo brasileiro espera!

            


          



          

quarta-feira, 23 de março de 2011

Repercussão da Campanha em Defesa do CNJ

          A Campanha em  Defesa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) , lançada em 21 deste mês e que contou, de imediato, com a adesão da CNBB, Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), foi definida pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, como um ato cívico fiel à trajetória da OAB, no sentido de escrever e promover a história das instituições republicanas deste País.

          A ministra Eliana Calmon, que anteriormente confirmara presença, optou por prestigiar um convite da Fundação Getúlio Vargas, para, no mesmo dia e horário, integrar uma mesa redonda, em companhia do Vice-Presidente da República, Michel Temer, pelo Presidente do STF, ministro Cezar Peluso e pelo Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, objetivando discutir o novo pacto republicano.

          Em ofício encaminhado à OAB, a corregedora nacional de Justiça elogiou a campanha lançada por seu Conselho Federal, preocupado com as recentes decisões judiciais que anularam processos do órgão de controle do Judiciário, favoráveis ao afastamento de magistrados envolvidos em processos de desvio de conduta e em irregularidades.

        A ministra esclareceu que a preocupação da OAB, também a assaltou, quando passou a ver a sustentação em praticamente todos os processos disciplinares, como tese de defesa, a questão da competência subsidiária do CNJ.

        Segundo informou, esse fato, fez com que, na condição de autoridade coatora, apresentasse em memoriais números concretos dos procedimentos disciplinares paralisados ou prescritos por inação das Corregedorias, muitas delas inteiramente desestruturadas para atender à demanda disciplinadora.

          Em seu discurso, Ophir lembrou que o CNJ nasceu de uma demanda da sociedade brasileira por  maior transparência do Judiciário, fruto da Emenda Constitucional 45/2004, e em decorrência da falência das corregedorias das justiças estaduais. Acrescentou, ainda, que, assim como aconteceu no seu surgimento, quando enfrentou forte resistência, "o CNJ hoje vem sofrendo um combate muito forte por parte de determinado segmento conservador da magistratura brasileira, que ainda não compreende o verdadeiro papel do controle social, do controle externo a que todos os poderes devem se submeter".

          Afirmou, também, que a Campanha Nacional em Defesa do CNJ, portanto, constitui reconhecimento da OAB - que tem assento naquele Conselho - sobre o progresso que esse órgão tem obtido pela construção de um Judiciário mais transparente e, ao mesmo tempo, um alerta à sociedade brasileira de que há forças contrárias a esse progresso.

          A seguir, Ophir salientou que: "O CNJ incomoda por isso, tem tido certos inimigos, perfeitamente identificáveis, que são aqueles que não querem esse papel de profilaxia do Judiciário. É um segmento pequeno da magistratura, mas que tem uma repercussão grande na sociedade brasileira, em função daquilo que o Judiciário representa como o grande instrumento para lutar contra as injustiças, contra os desmandos, contra abusos de autoridade e por nossos direitos".

          Finalizou, enfatizando: " Defendemos essa instituição republicana, essa instituição constitucional, que nos faz cada vez mais acreditar que podemos mudar. Nós, advogados e cidadãos, somos as maiores vítimas do corporativismo nos tribunais, sobretudo nos Tribunais de Justiça desse país afora. Quantas e quantas reclamações correcionais eram feitas, quantas e quantas denúncias eram formuladas e não eram ouvidas. Claro que ainda hoje isso acontece, mas diminuiu bastante com o CNJ, e não podemos perder de vista o que era antes e o que é agora em termos de transparência do Judiciário".  

           À propósito da atual polêmica sobre o papel subsidiário do Conselho Nacional de Justiça, ao ser questionado se o CNJ deve ter autonomia em relação aos tribunais para iniciar processos contra Juízes, o ex-Corregedor Nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, afirmou: "Tem o CNJ autoridade suficiente para, sem prejuízo da autotutela dos tribunais inferiores, realizar investigações por sua iniciativa. Sustentar entendimento diverso seria contrariar a razão e a função do controle externo. As objeções suscitadas com base na regra da subsidiariedade, de que o CNJ só poderia atuar depois dos órgãos locais, contradiz seu significado lógico e prático".

                

domingo, 20 de março de 2011

Acesso à Justiça

          Para se permitir o acesso à Justiça a todos os cidadãos é necessário, primeiro, identificar os principais obstáculos que impedem ou limitam esse acesso.

          O primeiro deles é decorrente de ordem material: a Justiça, além de inacessível financeiramente para muitos, é, ainda, excessivamente formal. Assim, afasta aqueles que não reconhecendo os seus ritos, por não compreendê-los, não vê nela o caminho adequado para a solução dos seus conflitos e, aqueles que não tendo meios financeiros necessários deixam de buscá-la.

          Sem acesso à Justiça, esse grupamento social termina por resolver seus conflitos, ao seu modo, muitas vezes com violência.

          Há ainda aqueles que, por não acreditarem no sistema judiciário, buscam esquecer as injustiças sofridas, atribuindo-lhes um caráter inexorável.

          Ao marginalizar esse grupamento social, o Estado deixa de cumprir o seu papel constitucional de prestar Justiça, igualmente acessível a todos.

          Para Joaquim Falcão, " pouco a pouco se consolida a ideia de que fazer justiça, como dever do Estado, é um serviço público a ser oferecido como qualquer outro. O cidadão tem direito  à educação, saúde, segurança, transporte e à justiça também".

         É, ainda Falcão quem noticia  recente persquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) com Fernando Barbosa e Márcio Grijó (http://cpdoc.fgv.br/fgvopiniao/pesquisaspublicas), a respeito do índice de percepção carioca sobre a presença do Estado por meio da dimensão dos serviços públicos e da dimensão de cidadania. Os entrevistados foram divididos em três categorias: os moradores do morro do Alemão, os da Zona Sul e os das zonas Norte e Oeste. E  a pesquisa acompanhou os anos de 2010 e 2011, já sob os efeitos da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Os resultados sugeriram, fortemente, a necessidade de o Poder Judiciário ir às favelas. Abrir varas judiciais, abrir juizados especiais, tal como lá estão abrindo escolas, postos de saúde. A Rocinha, com cerca de 100 mil habitantes, já tem quatro escolas públicas, uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), mas não tem nenhuma vara judicial, nem um juizado especial. O mesmo ocorre no Morro do Alemão, onde a oferta da justiça é feita por policiais, como mediadores.

          Indagados se a lei e a Justiça protegem a todos igualmente, em todas as áreas, somente cerca de 30% dos cidadãos acreditam que sim. Se a Justiça ajuda a resolver os problemas dos moradores, menos de 50% concordam que sim.

          Sobre o tema do acesso à Justiça,  Gláucia Falsarella Foley, em sua dissertação de mestrado na Universiade de Brasília, assinala que o desafio republicano de construir caminhos para viabilizar o acesso à Justiça a todos os cidadãos impõe ao Estado o dever de impulsionar reformas no sentido de assegurar que o acesso à Justiça - não necessariamente ao sistema jurisdicional - seja efetivamente universal. Essa impulsão, em sua análise, pode ser efetivada por meio da articulação de quatro movimentos, que se comunicam e se complementam, sem qualquer ordem cronológica ou hierárquica de prioridade.

          O primeiro movimento objetivaria a superação das restrições impostas à parcela dos excluídos e dos já incluídos na Justiça formal e se daria mediante investimentos em reformas processuais para conferir maior celeridade, eficiência, acessibilidade ao sistema judiciário.

          O segundo movimento implicaria o fortalecimento das defensorias públicas, para que a população excluída fosse plenamente incluída no sistema jurisdicional formal, por meio de atendimento eficiente e de qualidade.

          O terceiro movimento seria caracterizado pela busca de mecanismos alternativos e democráticos de acesso à Justiça formal. As experiências já consolidadas de juizados especiais, juizados itinerantes, mediações forenses, juizados fluviais, justiça volante, entre outras, demonstram que, com criatividade, vontade política e baixo custo, é possível facilitar o acesso à Justiça e aproximar o Judiciário do povo.

          Por fim, o quarto movimento  estaria relacionado à democratização da própria realização da Justiça. Foley cita como modelo a Justiça Comunitária, operada na comunidade, para a comunidade e, sobretudo, pela comunidade. Informa que o Programa Justiça Comunitária, implementado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, criado com o objetivo de democratizar a realização da justiça, restituindo ao cidadão e à comunidade a capacidade de gerir seus próprios conflitos com autonomia, é, talvez, um dos caminhos mais efetivos e generosos para impulsionar, do ponto de vista local, o processo de universalização do acesso à Justiça. (Disponível em:  www.tjdf.gov,br/tribunal/insitucional/proj_justiça_comunitária/index.asp).

          Caminhos existem. Basta querer trilhá-los.

         

sexta-feira, 18 de março de 2011

Debate na internet sobre o projeto do Código de Processo Civil

          No final deste mês, por meio de uma consulta on line, em seu site, o Ministério da Justiça iniciará um debate público pela Internet sobre a reforma do Código de Processo Civil. Após essa etapa, a ideia é reunir juristas para discutir os pontos polémicos e enviar as contribuições ao Congresso.

          De acordo com o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, seria impossível que um código como esse não provocasse polêmica. O importante é encontrar o que melhor representa o pensamento comum e dominante da sociedade.

          Aprovado pelo Senado em dezembro, o projeto de lei que estabelece mudanças para o novo Código de Processo Civil, ainda terá que passar pelo crivo da Câmara dos Deputados.

          Um dos seus objetivos é acelerar o andamento dos processos, reduzindo pela metade o tempo de tramitação das ações que, atualmente, em decorrência dos inúmeros recursos e seus efeitos suspensivos, podem durar décadas.

          De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 86,6 milhões de processos abarrotam os tribunais. Destes, somente 40 milhões estão em fase de execução.

          Segundo o presidente da comissão,que elaborou o anteprojeto do novo CPC,  ministro Luiz Fux, à época, do Superior Tribunal de Justiça, com o novo código a duração dos processos individuais será reduzida em 50% e a dos processos coletivos (em que várias pessoas pleiteam o mesmo direito) será de 70%.

          Vários de seus artigos são questionados pelos advogados e outros operadores do direito, notadamente por seu ineditismo.

           Um dos questionamentos refere-se ao artigo que prevê multa de até 20% do valor da causa para a litigância de má-fé, ou seja para a parte que alterar a verdade dos fatos, praticar atos de deslealdade processual e criar embaraços à Justiça. Conforme o processualista Humberto Theodoro Júnior é necessário não apenas o recrudescimento do tratamento repressivo da litigância de má-fé, como mudar a cultura dos tribunais para aplicação das multas.

          Outro artigo do projeto que vem sendo questionado no meio jurídico, embora a sua importância seja incontestável, refere-se aos processos que envolvem ações semelhantes, onde várias pessoas pleiteam o mesmo direito. O projeto permite que o juiz de primeira instância submeta os processos ao Tribunal de Justiça do Estado para que seja proferida uma decisão refletindo o entendimento comum sobre a matéria. Reconhecido o chamado "incidente de resolução de demandas repetitivas", todas as ações daquele tipo seriam paralisadas, até que fosse julgada a questão, por meio dos cabíveis recursos ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal. Pacificada a questão, todos os juízes de primeira instância passariam a julgar as ações de maneira uniforme.

          Essa proposta é defendida pela Associação dos Magistrados Brasileiros, embora alguns segmentos do Judiciário a critiquem por entender que haveria um engessamento da primeira instância. É notório, contudo, que o estrangulamento dos tribunais ocorre, de modo significativo, em função das sentenças divergentes em processos idênticos no conteúdo e na causa de pedir.

          Importante, também, a modificação proposta que diz respeito ao chamado recurso de apelação, cabível atualmente em todas as sentenças de primeira instância, que deixa de ter efeito suspensivo (suspende os efeitos da decisão) imediato. No projeto, esse efeito terá que ser declarado, ou não, por um desembargador. Sem efeito suspensivo, a execução da sentença será imediata, o que diminuiria a morosidade dos processos, desestimulando os recursos meramente protelatórios. Atualmente, conforme estimativa do professor e desembargador Caetano Levi Lopes, os recursos procrastinatórios somam 60% , em média,

          No que se refere à inovação que permite aos advogados intimarem as testemunhas (hoje essa atribuição é exclusiva dos oficiais de justiça), na opinião de Ophir Cavalcante, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), "causa polêmica porque o advogado não tem poder coercitivo para obrigar ninguém a ir à Justiça". Os advogados também não aprovam a ideia de se criar um mediador de qualquer profissão (e não necessariamente advogado) para atuar na conciliação entre as partes.

          Embora a Comissão criada pelo Senado para elaboração do novo Código de Processo Civil já tenha procurado ouvir a sociedade brasileira em audiências públicas, recebendo 13 mil contribuições da comunidade jurídica, segundo informações do ministro Luiz Fux, agora, com o projeto a ser votado na Câmara, novamente será reaberto o debate com a sociedade, via Internet.

          Tomara que depois de ouvir a sociedade, sem mais delongas, a Câmara se empenhe em votar o novo Código de Processo Civil, tão ansiado por aqueles que desejam uma Justiça célere e eficaz\.

sábado, 12 de março de 2011

Campanha da OAB em defesa do CNJ

          No dia 21 deste mes, será lançada no Salão do Conselho Nacional da OAB, em Brasília, a Campanha Nacional em defesa do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

          O movimento, a ser deflagrado, decorre da preocupação da OAB com as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), anulando procedimentos do órgão de controle externo do Judiciário favoráveis ao afastamento de magistrados envolvidos em processos de desvio de conduta e finalidade.

          Instituído em obediência ao disposto no artigo 103-B da Constituição Federal, o Conselho Nacional de Justiça é um órgão que tem por missão contribuir para que a prestação jurisdicional seja realizada com moralidade, eficiência e efetividade, em benefício da sociedade.

          Contudo, existe uma movimentação no cenário político com claro intuito de esvaziar o CNJ e que tem gerado insegurança no meio jurídico.

          Nas palavras de Cláudio Stábile, presidente da seccional da OAB do MT, " o CNJ tem o papel constitucional de aprimorar a administração do Judiciário e punir magistrados que têm graves desvios de conduta. São quebras de paradígmas que incomodam a muitos e a OAB não pode permanecer inerte neste cenário".

          O movimento da OAB decorre de recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, que tem expedido liminares garantindo o retorno à magistratura de juízes e desembargadores afastados por desvio de conduta. Chamou atenção recente decisão do ministro Celso de Mello que, em liminar a favor de 10 magistrados do Mato Grosso aposentados compulsoriamente por decisão do CNJ, entendeu que o papel do CNJ deve ser subsidiário e não concorrente.

          Notícia do Estado de São Paulo, da lavra do jornalista Felipe Recondo, informa o seguinte: "O Presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Cezar Peluso, trabalha para influir na escolha dos novos integrantes do órgão. Os mandatos  de 12 dos  Conselheiros terminam apenas em junho e julho deste ano. Mas Peluzo começou a atuar, desde o mês passado, para levar ao órgão pessoas mais afinadas com suas ideias de um grupo menos interventor, mais focado nas atividades administrativas dos tribunais e menos propenso a abrir seguidas investigações contra magistrados suspeitos de desvios."

          Em outubro do ano passado, em reunião realizada com o então Ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, já manifestara posição contrária da entidade de classe ao projeto de lei, encaminhado pelo presidente do Conselho Nacional de Justiça, Cézar Peluso, à apreciação daquele ministério, alterando a composição do CNJ. Na nova composição o Conselho passaria a contar rambém com representantes do Superior Tribunal Militar (STM) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

          Ao pretender ampliar de nove para onze o número de representantes da magistratura no CNJ, contra seis da sociedade civil - aí somados 2 representantes da OAB, 2 representantes do Ministério Público e mais 2 do Senado e Câmara dos Deputados - além do viés corporativista, na opinião de Ophir o projeto é também inconstitucional, pois não respeita a regra de proporcionalidade estabelecida na EC 45.

          Desde que assumiu a presidência do CNJ, em substituição ao ministro Gilmar Mendes, Cezar Peluzo vem sendo criticado no meio jurídico por sua postura corporativista e por seu descaso com aquele Conselho numa tentativa de esvaziá-lo. Aliás, em seu discurso de posse informou que pretendia "colocá-lo nos trilhos".

          Começou por enfraquecer o seu Conselho Consultivo (Comissão de notáveis, indicados em 2009, para orientar e acompanhar as pesquisas do CNJ), deixando de convocar reunião da comissão durante 2010. Sobre a inexistência de reunião em 2010, Maria Tereza Sadek, Diretora do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais e professora da USP, assim se manifestou: "Eu lamento muito. Poderia ser feito um importante trabalho. Sugerimos pesquisas fundamentais para um diagnóstico mais apurado das varas e tribunais, que poderiam se transformar em políticas públicas". Depois. enviou projeto de lei com o intuito de aumentar a participação de magistrados no CNJ, agora, tenta influenciar na renovação do Conselho.

          Como órgão de controle externo do Poder Judiciário, o CNJ, além de contrariar interesses corporativos, tem também incomodado com a sua eficiente atuação, aumentando o rigor na análise de pedidos de contratação de servidores para a Justiça e criação de varas judiciai, diminuindo as despesas e aumentando a eficiência..

          Quando de sua instalação, muitos temiam que o CNJ coonestasse um modelo  jurisdicional em que o valor "eficiência" se confundisse com o "custo benefício da decisão". Sua atuação provou o contrário.

          Lutemos para que assim continue!

quarta-feira, 9 de março de 2011

Próximos julgamentos do STF

          Embora a abertura do ano judiciário tenha ocorrido em fevereiro, o Supremo Tribunal somente a partir de agora, com a posse  do novo ministro Luiz Fux, no dia 03 deste mês, começará a julgar temas mais complexos, constantes de sua pauta.

          O primeiro deles é sobre a aplicabilidade para as eleições de 2010 do artigo 2º, alínea "k" da Lei Complementar n° 135 (Lei da Ficha Limpa), que proibe a candidatura de membros do Congresso Nacional, que tenham renunciado ao seu mandato. Como o anterior julgamento do Supremo Tribunal, ocorrido em 27.10.10, acabou empatado, por sugestão do ministro Celso Mello, acatada pelos demais, prevaleceu o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que já decidira sobre a sua aplicabilidade para essa legislatura.

          Se o Supremo decidir que a lei não se aplica às eleições de 2010, políticos que renunciaram ao seu mandato para evitar  uma provável cassação, ou que foram condenados em segunda instância, mas o processo ainda aguarda julgamento de recurso para os tribunais superiores, poderão assumir seus mandatos.

          Outro tema polêmico é sobre quem deve assumir a vaga deixada por um parlamentar: deverá ser  observada a ordem de votação no partido ou na coligação?

          Os questionamentos sobre a chamada dos suplentes surgiram em dezembro, quando o STF concedeu liminar ao PMDB determinando que a vaga aberta com a renúncia do deputado Natan Donadon (PMDB -RO) fosse ocupada por um suplente do partido, o deputado João Batista (PMDB-RO), e não pelo candidato mais bem votado da coligaçao. A decisão liminar amparou-se na Resolução n° 22.580/07 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que afirma pertencer ao partido o mandato parlamentar, e que a coligação se extingue após o processo eleitoral. 

          Em dezembro a decisão do plenário do Supremo Tribunal foi no sentido de que: "as coligações partidárias contituem pessoas jurídicas de natureza efêmera, por deixarem de existir tão logo encerradas as eleições, e que o mandato parlamentar conquistado no sistema eleitoral proporcional pertence ao partido político". O posicionamento de cinco ministros, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e o presidente da corte, Cezar Peluso, foi no sentido de que o mandato pertence ao partido. Somente Dias Toffoli, Ayres Britto e Ricardo Lewandowski entenderam que a vaga deve ser ocupada pelo suplente.

          Contudo, em um novo julgamento, uma vez que várias outras liminares foram concedidas, poderão votar, além dos ministros que não participaram do julgamento ocorrido em dezembro, Ellen Gracie e Celso de Mello, o novo ministro Luiz Fux, havendo ainda a possibilidade de os demais ministros mudarem o seu voto.

          Outro tema em evidência, que terá que ser apreciado pelo STF, é a arguição de inconstitucionalidade pelos partidos de oposição da Lei que reajustou o novo salário mínimo, prevendo que até 2015 os novos reajustamentos serão feitos por decreto presidencial, obedecidos os critérios por ela estabelecidos. Os constituconalistas divergem sobre a matéria e caberá ao guardião da constituição, em sua composição plena, a palavra final.
   
          Também caberá ao Supremo decidir se o refúgio concedido pelo presidente Lula a Cesare Battisti foi ou não legal.

          Na ótica de Walter Ceneviva, "a lei brasileira cria dois enquadramentos distintos: o da extradição e o do refúgio. Ambos voltaram à esfera do Judiciário depois que o presidente Lula reconheceu Battisti como refugiado sob alegação de temores de perseguição política na Itália, com fundamento no art.1° da lei n°9.474/97". Se esta condição de refugiado for confirmada pelo Supremo Tribunal, nos termos da lei "ficará sustado o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão do refúgio".

          No caso Battisti, para ser aplicada a Lei 9.474, que regula a concessão do refúgio, o Supremo terá quer decidir se ele é dissidente político ou criminoso comum. Caso se entenda que os atos por ele praticados foram de puro terrorismo, como afirma a Itália, Battisti não terá direito ao refúgio, conforme disposto no artigo 5°, inciso XLIII da Constituição Federal, sendo, pois anulada a sua concessão.

          Outros temas vitais para a vida dos cidadãos também aguardam na fila para serem julgados pela Suprema Corte, alguns há décadas, mas não se sabe quando irão a julgamento, tais como: a legalidade ou não dos expugos do plano Bresser e Verão, a inclusão ou não do ICMS na base de cálculo do Cofins, a redução de dez para cinco anos para os contribuintes cobrarem do governo o que pagaram a mais de impostos, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade do artigo 32 da Lei 9.656, que obriga os planos de saúde a reembolsarem o SUS, entre outrros.

          São temas cruciais. Enquanto o Supremo não decide persiste a insegurança jurídica dos cidadãos.

domingo, 6 de março de 2011

O TJSP cria o Centro Judiciário de Solução de Conflitos

          A Folha de São Paulo do dia 03 de março, noticia a inauguração pelo Tribunal de Justiça de São Paulo de um Centro Judiciário de Solução de Conflitos em Segunda Instância para viabilizar o fechamento de acordos, principalmente em processos sobre relações de consumo.

          Referido centro cuidará de ações que já tiveram sentenças proferidas em primeira instância e estão em fase de recurso, relacionadas a bancos, convênios médicos e seguros de saúde, administradores de cartões de crédito, operadoras de telefonia, associações de estabelecimentos de ensino e empresas de financiamento habitacional, entre outros.

       Elogiado pela ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de justiça, o projeto TJ conciliando SP, dará prioridade à conciliação nos processos da área de direito privado que tramitam no 2º grau e prevê a realização de 5 mil audiências mensais, com a expectativa de que 40% dos processos no 2º grau sejam solucionados por meio de conciliação. Caso se concretize esse percentual, até o final de 2011 o tribunal paulista terá resolvido, definitivamente, em torno de 12 mil recursos da sua seção de direito privado.

         Metade da produção do centro será pautada pela chamada Meta 2 do Judiciário nacional, que objetiva o julgamento de todas as causas iniciadas até dezembro de 2005. 

         Empresas que possuam muitas causas, em andamento no Tribunal de Justiça, poderão indicar ao centro processos nos quais há maiores chances de solução amigável entre as partes.

         Na verdade, a criação desse órgão, o primeiro do país, é decorrente da Resolução nº 125, de 2010, do Conselho Nacional de Justiça, determinando a estruturação de setores de conciliação judicial nos diversos tribunais do país.

         Mencionada Resolução, estabeleceu, enfaticamente, no parágrafo único de seu artigo 1º, que: "Aos órgãos judiciários incumbe, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.

           A Resolução 125/10 do CNJ também enfatiza, em seus considerandos, que a conciliação e a mediação são  instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, ressaltando a necessidade de uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios.

           Pesquisa divulgada em 1º de março deste ano pela Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, demonstra a necessidade de se criar meios para facilitar a solução de litígios entre consumidores e empresas. O levantamento feito pela FGV em sete Estados, entre outubro e dezembro do ano passado, concluiu que 25% das 1570 pessoas entrevistadas informaram já ter sofrido cobranças indevidas decorrentes da relação de consumo.

          Conforme a coordenadora da pesquisa, professora Luciana Goes Cunha, será muito difícil conter a demanda em juízo, de causas desse tipo nos próximos anos, daí a importância de se fortalecer as instâncias administrativas para solucionar conflitos oriundos das relações de consumo.

            De acordo com  dados estatísticos, São Paulo tem hoje os maiores tribunais, na justiça federal, na justiça trabalhista e na justiça estadual, passando por eles metade dos processos em andamento no país.

           É de se esperar que outros Estados brasileiros, sensíveis aos apelos do CNJ, sigam o seu exemplo criando órgãos de mediação e conciliação, como efetivos instrumentos de pacificação social.

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