quarta-feira, 26 de junho de 2013

A polêmica criação dos novos TRFs

Reorganizar Justiça seria melhor que criar TRFs

A Emenda Constitucional 73/2013, que cria quatro tribunais regionais federais, não foi a medida mais barata para resolver o problema de abarrotamento nessa esfera do Judiciário. A conclusão está em nota técnica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgada nesta segunda-feira (10/6). De acordo com o estudo, a criação de tribunais resultará em gastos adicionais de R$ 922 milhões para o Judiciário, mas aumentará a ociosidade de juízes e não resolverá todos os problemas de produtividade da Justiça Federal.
 
O Ipea afirma que seria mais proveitoso, tanto do ponto de vista financeiro quanto da eficiência, realocar as seções judiciárias. A sugestão é a transferência de juízes e processos entre tribunais mais e menos produtivos. A EC 73 cria quatro tribunais regionais federais com o intuito de desafogar a segunda instância da Justiça Federal. Os novos TRFs ficarão em Manaus, Curitiba, Salvador e Belo Horizonte.
 
A pesquisa do Ipea leva em conta o impacto desses tribunais com base em dados de 2011 publicados pelo Conselho da Justiça Federal (CJF) e pelo relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça. A pesquisa afirma que, com os novos TRFs, as despesas de funcionamento da Justiça Federal aumentarão em 60% e serão necessários 55 juízes, que herdarão acervo de 297.871 processos.
 
Reflexos nos tribunais
Na quantidade de casos pendentes, o maior impacto será no TRF da 1ª Região. Com a saída de Minas Gerais, Bahia, Acre, Amazonas, Roraima e Rondônia dessa área de abrangência, o estoque cairá quase 60%, de 390 mil para quase 156 mil ações. No TRF–4, que não responde mais por Paraná e Santa Catarina e ficará restrito ao território do Rio Grande do Sul, a queda também será expressiva (46,7%), de pouco mais de 80 mil para 37 mil processos.
O estudo afirma que, ao contrário do que vem sendo alegado, o congestionamento dos tribunais decorre da perpetuação de problemas do sistema judiciário do passado, e não do aumento repentino da demanda pela Justiça. Por conta disso, o Ipea afirma que, levando em conta apenas os TRFs 1 e 4, vai haver quedas sensíveis nas taxas de congestionamento.
No caso da 1ª Região, a taxa cairá de 89% para 73%. Já em relação à 4ª Região, o declínio vai resultar em ociosidade: a taxa de congestionamento sai de 29% e vai para -57%. Nas demais regiões, afirma o Ipea, as mudanças nos acervos de processos serão pouco significativas.
 
Demandas divergentes
Pelos cálculos do Ipea, os quatro novos TRFs já nasceriam com demandas e responsabilidades muito discrepantes. Enquanto o  TRF–7, de Minas Gerais, já começaria com aproximadamente 159 mil casos à espera de análise, o TRF–9, com abrangência no Acre, Amazonas, Rondônia e Roraima, herdaria somente 18,7 mil ações. Como a Constituição veda tribunais com menos de sete integrantes, o número de julgadores seria maior que a proporção fixada pelo critério da taxa de demanda na corte federal do Norte do país.
O TRF–6, que abarca Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul, nasce saudável do ponto de vista da eficiência, com baixo congestionamento e julgando mais processos do  que recebe. Mas a corte de origem, o TRF–4, ficará com estrutura superior ao necessário para atender apenas à demanda gaúcha. "A distorção é tamanha que, mantida a produtividade, a redução instantânea da carga de trabalho resultaria em taxas de congestionamento negativas, que implicariam em ociosidade absoluta", diz o estudo. No longo prazo, o documento ainda prevê a necessidade de remover 47 desembargadores dos TRF–1 e TRF–5 pela alteração de carga de trabalho.
 
Alternativas de reestruturação
A sugestão do Ipea é realocar os estados entre as regiões, com respeito à contiguidade territorial. Bahia seria incorporada à 2ª Região; o Mato Grosso do Sul seria incorporado ao TRF–4, enquanto Goiás e Minas Gerais migrariam para o TRF–3. Essa possibilidade custaria, segundo a nota técnica, R$ 878 milhões a menos que os novos TRFs, com desempenho agregado semelhante. Já em um cenário de realocação de magistrados e servidores entre nove TRFs, sem criação de nenhum novo cargo, as despesas seriam de R$ 335 milhões a menos que o previsto na emenda. 
“Em suma, o que a EC 73 faz é reproduzir ou multiplicar a ineficiência através da criação de novos órgãos, embora seus defensores invoquem o princípio teórico, porém pouco atraente, de que um novo tribunal seria mais eficiente que aquele que lhe deu origem”, ressaltam os pesquisadores.
 
Veio tarde
A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) criticou o estudo do Ipea. Em nota, disse que "o trabalho poderia ter sido apresentado antes", ainda quando a hoje Emenda Constitucional 73 era a Proposta de Emenda à Constituição 544. A Ajufe relembra que a PEC ficou mais de dez anos em trâmite no Congresso Nacional e inclusive já foi debatida pelo CNJ.
 
Os juízes federais também criticam a metodologia usada pelo Ipea. Segundo a entidade, o estudo deveria ter usado os dados dos processos distribuídos nos últimos anos, e não somente os de 2011. A associação também alega que os pesquisadores partiram da hipótese simplista de que as novas cortes reproduzirão as mesmas estruturas de funcionamentos do TRFs já existentes.
 
A Ordem dos Advogados do Brasil não falou sobre o estudo, mas elogiou a aprovação da EC 73 e a consequente criação dos tribunais. O presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coelho, disse que esteve com o presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Felix Fischer, e explicou suas demandas: “Pugnamos por tribunais mais enxutos, tribunais modernos, que já pensassem no processo sem papel e que venham a colaborar com a Justiça mais próxima da  população, sem gastos excessivos”.
Marcus Vinícius disse esperar que a lei que regulamentará a questão crie TRFs com "uma estrutura enxuta, que represente o mínimo de gastos possível".
Clique aqui para ler o estudo do Ipea.