segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Retrato Justo

Ineficiente e muito caro. Esse é o retrato que emergedo Poder Judiciário brasileiro a partir da leitura demais uma edição da publicação "Justiça emNúmeros", que acaba de ser divulgada pelo ConselhoNacional de Justiça (CNJ).
De 2009 a 2015, aumentou 19,4% no número de autos acumulados, que passou a 73,9 milhões. Apesar de ganhos recentes na produtividade, permanece a impressão de que os magistrados fazem pouco mais que enxugar gelo.

No ritmo atual, seriam necessários três anos sem nenhuma demanda nova para que o estoque represado baixasse a zero.
O tamanho dessa pilha de ações, salvo pela atualização dos dados, não chega a ser novidade; há alguns anos ela é conhecida, talvez como a ponta de um iceberg.

O relatório deste ano, contudo, traz uma novidade: o tempo médio de duração dos processos. Embora seja difícil reunir num único indicador temporal situações muito heterogêneas, a tarefa foi cumprida a contento pelos técnicos do CNJ, o que permite fazer comparações nem sempre favoráveis ao Brasil.

Por aqui, leva-se em média um ano e seis meses para produzir uma sentença de primeira instância. Na Dinamarca, na Estônia, na Áustria e na Holanda, por exemplo, anuncia-se a decisão em menos de cem dias; em Portugal ou na Grécia, a tarefa toma em torno de dois anos.

Na Europa, todavia, a prolação da sentença indica que o processo está chegando ao fim; no Brasil, trata-se apenas do começo. Depois dela ainda se somam mais quatro anos e quatro meses, o tempo médio para a decisão ser executada.
O quadro se torna realmente assustador quando se consideram os custos. O Judiciário brasileiro consome 1,3% do PIB do país. O valor vai a 1,8% se a ele acrescentamos as despesas com os Ministérios Públicos e as Defensorias.
Na Europa, nenhum país investe mais de 1% do PIB no Judiciário. O mais pródigo é a Bélgica, com 0,65%, mas a maioria das nações fica no patamar de 0,3%.

O exemplo externo, infelizmente, pouco reflete aqui. Registra-se no Brasil uma tendência de aumento dos gastos como proporção do PIB. Como comprova o relatório, a alocação de cada vez mais recursos não basta, por si só, para conferir maior efetividade à Justiça.
Nesse quadro desanimador, destaque-se o esforço do "Justiça em Números". Conhecer os gargalos e as dificuldades do Judiciário é um passo importante para que a primeira frase deste texto deixe de representar um retrato justo.
(Transcrito do Jornal Folha de São Paulo, de 24.10.2016).