quarta-feira, 30 de março de 2011

Efetividade da Lei Maria da Penha

          Tendo em vista que recentes decisões da Justiça têm criado obstáculos à  aplicação da Lei Maria da Penha, o Ministério Público Federal e o Executivo assinaram um protocolo de cooperação para aperfeiçoar a sua aplicação.

          Também em 22 de março, realizou-se no plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, a V Jornada de Trabalhos sobre a Lei Maria da Penha, com o objetivo de discutir a efetividade da lei para o combate à violência doméstica e familiar.

          De acordo com Raquel Dodge, subprocuradora-geral da República, conforme dados reunidos pela Secretaria de Políticas para as Mulheres e pelas promotoras públicas especializadas, não houve diminuição da violência contra a mulher após a Lei Maria da Penha.

          A falta de uniformidade na aplicação da lei, faz com que ela seja interpretada diferentemente, a depender do promotor, do juiz, ou do delegado de polícia, abrindo caminho para que vítimas desistam de denúncias, agressoress deixem de ser condenados e processos sejam anulados.

          São três os principais pontos polêmicos que têm  motivado diferentes interpretações:

          Representação da vítima

          Alguns defendem que os crimes praticados em decorrência da Lei Maria da Penha são de ação pública, ou seja, não há necessidade de manifestação da vontade da vítima no sentido de processar criminalmente o seu agressor. Para tanto, basta que a notícia da agressão chegue às autoridades competentes.

          Outra corrente, porém, entende que é necessária a manifestação da vontade da mulher, por meio de representação criminal, de modo a autorizar o ajuizamento da ação pelo Ministério Público.

          Audiência de Confirmação

          Outra controvérsia é sobre a obrigatoriedade de a mulher agredida comparecer perante um magistrado, confirmando a sua intenção de processar o agressor.

           Há quem entenda que, após a manifestação da vítima, já colhida na fase investigatória, essa audiência só deve acontecer quando a mulher manifestar espontaneamente que quer se retratar.

          Já outros, contudo, defendem que essa audiência é obrigatória em todos os casos, mesmo naqueles em que a vítima já tenha feito a representação.

          Segundo informações de juízes, e promotores, em São Paulo e no Distrito Federal essa exigência é de praxe. O índice de desistência nessas audiências chega a 80%, por vários motivos, como medo, vontade de esquecer, ou mesmo reconciliação.

          Em Minas, a audiência também é considerada obrigatória na maioria dos casos e ignorá-la pode levar à anulação do processo, embora já existam decisões que a entendem como facultativa.

          No Rio Grande do Sul, a audiência só ocorre nos casos em que a mulher dá indícios de que pretende desistir da audiência.

          Processo Suspenso

          Outra polêmica na aplicação da lei está relacionada à possibilidade de o agressor, desde que cumpridas determinadas condições, ter o curso de seu processo suspenso por um período de dois a quatro anos. Essa medida vinha sendo defendida por um número significativo de juízes e promotores, sob a alegação de que ela aumentaria a vigilância sobre o agressor e uma solução mais rápida do conflito.

          Em decisão proferida dia 24 deste mês, contudo, o Supremo Tribunal pôs fim à polêmica ao considerar constitucional o artigo 41 da Lei Maria da Penha, que veda esse tipo de benefício nos casos de agressão contra a mulher.

          Essa decisão do Supremo Tribunal reforma entendimento anterior do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, em julgamento ocorrido em dezembro de 2010, passou a admitir para os agressores de mulheres a aplicação da suspensão condicional da pena prevista em casos de condenação do réu à punição inferior a um ano, decorrentes de agressão leve, embora o artigo 41 da Lei Maria da Penha a proibisse.

          No julgamento no Supremo Tribunal, o relator do processo, ministro Marco Aurélio de Mello, alertou para o fato de que a Lei Maria da Penha tem que ser diferenciada das demais. "As mulheres que sofrem violência doméstica não são iguais às que não sofrem violência doméstica", afirmou. Citando Rui Barbosa, concluiu: "A verdadeira igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais".

          O entendimento do Supremo Tribunal Federal, vem reforçar a aplicação efetiva da lei objetivando punir, de fato, a agressão contra as mulheres.

          Segundo dados do CNJ, até julho do ano passado, a aplicação da Lei Maria da Penha, editada em 2006, resultou em 111 mil sentenças. Esse número com certeza seria muito maior se  não houvesse tanta resistência à aplicação da lei, por força da vigente cultura machista

          Ao defender o texto da lei, no início do julgamento no STF, a subprocuradora-geral da República, Déborah Duprat enfatizou: "Considerando que vivemos numa sociedade marcadamente patriarcal, ao tratar igualmente homens e mulheres numa situação de violência doméstica, incidiríamos em um preconceito".

          Que a decisão do Supremo sirva de exemplo, revertendo o preconceito contra a aplicação da lei!