quinta-feira, 5 de abril de 2012

Conciliação como resolução de conflitos em juízo


Na 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que cuida de processos previdenciários vindos de São Paulo e Mato Grosso do Sul a realidade é desoladora. Só no ano passado, a seção recebeu quase 100 mil recursos, o que dá mais de 6 mil novos casos para cada um dos 16 desembargadores responsáveis por julgar se o INSS deve ou não pagar o que pede um trabalhador que contribuiu a vida toda ou uma família que não tem como se sustentar. O acervo sem julgamento apurado até agosto chegou a 146 mil casos.

Difícil, mas não impossível. Empossado em 2004 como desembargador pelo quinto constitucional, o advogado Antônio Carlos Cedenho conseguiu reduzir um estoque de 12 mil processos para 7 mil em seis anos. Gestor do próprio escritório e da subseção da OAB de Santo André, com 3,5 mil advogados inscritos, Cedenho levou a expertise para a Justiça. Com método, colaboração e força de vontade, deu certo.

 Bem articulado, o hoje desembargador mostrou habilidade ao costurar convênios com o INSS para solucionar processos repetitivos. O sucesso o levou, em 2008, ao comando do recém-criado Gabinete da Conciliação do tribunal, onde ficou até este ano. No último dia 19 de março, passou o bastão para a também experiente conciliadora desembargadora Daldice Santana. No currículo, Cedenho ostenta mais de 30 mil casos solucionados pela negociação amigável, o que tratando-se de órgãos do Poder Executivo em um dos lados da demanda, é um feito histórico.

 Em entrevista concedida ao Consultor Jurídico para o Anuário da Justiça Federal 2012, o desembargador relatou sua experiência, demonstrando que com gestão e intuição é possível reduzir o estoque de processo na Justiça.

 Indagado se o seu sucesso em solucionar demandas era uma questão de gestão, respondeu: " A gente ouve falar muito em gestão, mas não temos uma formação acadêmica para poder tratar desse assunto como se fosse realmente uma gestão administrativa. Vai um pouco de intuição também".

Outro ponto interessante da entrevista é sobre a divisão de tarefas em seu gabinete. Nesse sentido o desembargador afirma: "Adotamos uma rotina. Há funcionários que preparam voto só dentro de um determinado tema. Tem gente que só cuida de agravos, porque o número de agravos também é bastante grande. Outros pegam só mandados de segurança. Alguns só cuidam da parte criminal, em que o cuidado que se tem é evitar a prescrição. Fazemos um pente fino nos processos que chegam ao gabinete para saber quais são os principais atos processuais, e em quais há contagem de prazo prescricional. Além disso, hoje em dia o gabinete também se volta para a questão da estatística, o que envolve um controle administrativo para fornecer dados ao CNJ.

 Informa, ainda o desembargador, que já passaram pelo Gabinete da Conciliação aproximadamente 60 mil processos, dos quais aproximadamente 29 mil foram resolvidos. Na área previdenciária, foram mais de 20 mil conciliações.

Perguntado sobre como funciona o Gabinete da Conciliação esclareceu: "No caso do Sistema Financeiro de Habitação, que traz processos em que as pessoas financiam imóveis, mas acabam não conseguindo pagar, as conciliações são feitas tanto em relação aos processos da primeira quanto da segunda instâncias. Temos um calendário anual, marcamos semanas de conciliação, não só na capital, mas também em algumas subseções da nossa jurisdição. São marcadas as audiências. No Fórum Pedro Lessa, por exemplo, temos cerca de 12 mesas de conciliação. São convocados juízes e os processos são selecionados pela Caixa Econômica Federal e pela Emgea, que é uma empresa que cuida do passivo desses processos, de tudo o que foi considerado perdido pela Caixa. Ela tenta, então, fazer conciliação e recuperar parte desse passivo. As partes são intimadas a comparecer e então fazemos a conciliação.

Em relação aos casos previdenciários, foi firirmado um convênio com o Ministério da Previdência Social e o INSS. Temos um número de funcionários dentro do Gabinete da Conciliação, que no inicio eram 12 e mais quatro procuradores. Os gabinetes da 3ª Seção do tribunal mandavam de cem a duzentos processos por ano para a conciliação. Lá, só trabalhamos com processos que versem sobre aposentadoria por idade do trabalhador rural porque o número de processos sobre isso é muito grande no tribunal, e são processos que para o próprio INSS é mais fácil analisar.

No SFH, por exemplo, a negociação leva em conta caso a caso. Já no previdenciário, o INSS concorda em pagar 80% dos valores atrasados e implantar os benefícios imediatamente. Os valores são corrigidos, inclusive os honorários advocatícios, que também são pagos em 80%. Uma vez analisado o processo, feitos os cálculos, uma correspondência é enviada ao advogado da parte, com envelope timbrado do tribunal, com cópia do convênio e um ofício assinado por mim, falando da assinatura do convênio entre o tribunal e o INSS. Segue também uma planilha de cálculo dos valores corrigidos, além de uma petição, que nós chamamos de petição-proposta, já dirigida ao Gabinete da Conciliação e assinada pelo procurador do INSS, com campo próprio para a parte e para o advogado assinarem. A petição já pode ser enviada no próprio envelope-resposta, segundo convênio que fizemos com os Correios. Chegando ao gabinete, eu homologo a proposta por assinatura digital e isso já entra no sistema. O INSS, via DataPrev, comunica às agências e o benefício é implantado. Como esses valores estão aquém do valor do precatório, são pagos através do sistema de Requisição de Pequeno Valor, e o processo volta ao juízo de origem. Em 30 ou 40 dias, no máximo, esses 80% são pagos na origem.

 Antônio Cedenho também enfatizou quanto à conciliação a importância da atuação do CNJ, que pela Resolução 125 criou as centrais de conciliação institucionalizando a conciliação em todo o Judiciário nacional. Hoje, obrigatoriamente, tem que ser criado um programa de conciliação em todos os tribunais.

Na 3ª Região, o cumprimento dessa resolução iniciou com a instalação da Central de Conciliação na Praça da República, que corresponde à subseção judiciária da Capital de São Paulo. Lá, inicialmente foram priorizados os processos de conselhos de classe. Um levantamento demostrou que existe, na primeira instância, só no estado de São Paulo, cerca de 130 mil processos de conselhos de classe. Isso ao ver do desembargador Cedenho só é possível resolver por intermédio da conciliação, não tem outro meio.

Outra tentativa é também levar para a conciliação as ações que envolvem a carteira comercial da Caixa Econômica, processos sobre cheque especial, empréstimos e cartão de crédito. Os acordos já têm sido excelentes. Em um mutirão que fizemos recentemente, 80% dos casos foram resolvidos por conciliação, ressalta.