segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Prisão preventiva somente deve ser aplicada a fatos concretos

A prisão preventiva é uma medida excepcional, só devendo ser aplicada diante de fatos concretos, e não de suposições, afirmou o ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça, ao conceder Habeas Corpus a um empresário do Paraná.
O homem foi preso preventivamente acusado de organização criminosa e receptação qualificada. Na decisão que determinou a prisão, o juiz afirmo que a medida era necessária, dentre outros motivos, pela periculosidade praticadas, em tese, pelos investigados. Considerou ainda que a maioria dos investigados possui maus antecedentes, podendo voltar a cometer crimes.
O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná manteve a decisão do decreto prisional, alegando que há indícios de que o empresário faz parte de uma organização criminosa, e que a prisão seria necessária para evitar coação e ameaças a testemunhas.Em defesa do empresário, o advogado Salir Pinheiro da Silva Junior ingressou com Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça, alegando ausência de fundamentos concretos para a decretação da prisão preventiva.
Em decisão liminar, o HC foi concedido pelo ministro Sebastião Reis Júnior, que substituiu a prisão preventiva por medidas alternativas à prisão.
A decisão ressaltou que com a Lei 12.403/2011, a prisão cautelar passou a ser, mais ainda, a mais excepcional das medidas, devendo ser aplicada somente quando comprovada a inequívoca necessidade.
"Em que pesem as relevantes considerações realizadas pelas instâncias ordinárias, não há, por ora, dados concretos (mas, apenas suposições) que indiquem que o paciente tentou obstruir as investigações e, muito menos, que ele pretende fugir da comarca", afirmou o ministro, ao concluir que existem medidas alternativas à prisão que melhor se adequam ao empresário.
Como medidas alternativas, o ministro determinou o afastamento do réu de sua empresa, proibição de manter contato com os corréus e comparecer em juízo no prazo e nas condições fixadas pelo juiz. Em caso de descumprimento, ressaltou o ministro, a prisão preventiva será restabelecida.
Superior Tribunal de Justiça S30 HABEAS CORPUS Nº 412.921 - PR (2017/0206611-7) RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR IMPETRANTE : SALIR PINHEIRO DA SILVA JUNIOR ADVOGADO : SALIR PINHEIRO DA SILVA JUNIOR - PR060047 IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ PACIENTE : MARCELO CORSINO FELIX (PRESO) DECISÃO Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de Marcelo Corsino Felix apontando-se como autoridade coatora a Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (HC n. 1710290-2). Consta dos autos que o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Ibiporã/PR (Autos n. 0003223-68.2017.8.16.0090) decretou a prisão preventiva do paciente, dentre outros corréus, pela suposta prática dos crimes previstos no art. 2º, da Lei n. 12.850/2013, art. 180, § 1º, do Código Penal (fl. 109). Impetrado writ, na origem, o Tribunal estadual denegou a ordem nos termos desta ementa (fls. 136): HABEAS CORPUS CRIME. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA BEM ESTRUTURADA. QUADRILHA ESPECIALIZADA EM ROUBO DE CARGAS E RECEPTAÇÃO DE MERCADORIAS. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. NECESSIDADE DE GARANTIA À ORDEM PÚBLICA EM RAZÃO DO MODUS OPERANDI DO GRUPO. POSSIBILIDADE DE COMETIMENTO DE NOVOS DELITOS E DE OBSTRUÇÃO Ã PRODUÇÃO DAS PROVAS. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. DECISÃO QUE DETERMINOU A PRISÃO DO PACIENTE BEM FUNDAMENTADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA. Daí o presente mandamus, em que o impetrante sustenta, em síntese, a ausência de fundamentos concretos para a decretação da prisão preventiva do paciente. HC 412921 C=40<5854164485@ 2017/0206611-7 Documento Página 1 de 5 (e-STJ Fl.168) Documento eletrônico VDA17226423 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): MINISTRO Sebastião Reis Júnior Assinado em: 22/08/2017 13:45:10 Publicação no DJe/STJ nº 2267 de 24/08/2017. Código de Controle do Documento: AB87862A-E76E-43C7-BAAC-83DA8EC5C5D0 Superior Tribunal de Justiça S30 Alega que o Paciente é primário, portador de bons antecedentes, o crime ora imputado carece de violência ou grave ameaça, desse modo, não há que se falar em garantia da ordem pública pois não é elemento perigoso, o crime não é grave, não precisa ser retirado do convívio social, e, de forma alguma na mais remota hipótese poderá haver reiteração delituosa pois a suposta orcrim foi desarticulada (fl. 7). Destaca que ainda que condenado o Paciente não será levado ao regime fechado, se não bastasse o mesmo tem endereço fixo, empresa constituída, família, filhos matriculados nas escolas da cidade, jamais o mesmo iria se furtar da aplicação da lei penal (fl. 7). Destaca que o paciente é primário, tem residência fixa e emprego lícito, sendo inclusive, proprietário de uma empresa (Mercado Dia a Dia), onde contrata diretamente 20 pessoas. Menciona que a situação exposta nestes autos se assemelha à situação retratada em outro habeas corpus, impetrado em favor de dois corréus, cuja liminar foi deferida para revogar a prisão preventiva e aplicar outras medidas cautelares. Requer, inclusive liminarmente, a revogação da prisão preventiva ou, subsidiariamente, a substituição da prisão por outras medidas cautelares diversas da prisão. No mérito, pugna pela confirmação da liminar. É o relatório. A concessão de liminar em habeas corpus é medida de caráter excepcional, cabível apenas quando a decisão impugnada estiver eivada de ilegalidade flagrante, demonstrada de plano. Na decisão que decretou a prisão preventiva, o Magistrado de piso se manifestou nesses termos (fl. 104/109 - grifo nosso): HC 412921 C=40<5854164485@ 2017/0206611-7 Documento Página 2 de 5 (e-STJ Fl.169) Documento eletrônico VDA17226423 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): MINISTRO Sebastião Reis Júnior Assinado em: 22/08/2017 13:45:10 Publicação no DJe/STJ nº 2267 de 24/08/2017. Código de Controle do Documento: AB87862A-E76E-43C7-BAAC-83DA8EC5C5D0 Superior Tribunal de Justiça S30 [...] Quanto aos fundamentos da custódia cautelar, evidente a PERICULOSIDADE DAS CONTUDAS praticadas, em tese, pelos investigados, sendo possível concluir que a engenhosidade da quadrilha e o modus operandi, fazem com que seja justificada, ao menos neste momento, a necessidade de suas prisões preventivas para garantia da ordem pública, aplicação da lei penal e para a conveniência da aplicação criminal. [...] Consoante demostrado no relatório de tópico I desta decisão, a periculosidade dos investigados restou demonstrada pelo modus operandi dos delitos, uma vez que existem fortes indícios no sentido de que eles formam uma organização criminosa responsável por roubos/furtos de cargas de transportadoras, sendo que, posteriormente, estas são receptadas a outros membros do bando, em tese, empresários desta cidade, o que evidencia alta reprovabilidade social desta atividade. [...] Com efeito, observa-se que o comportamento dos investigados (práticas, em tese, de crimes de formação de organização criminosa, furtos qualificados, falsa comunicação de crime, receptação qualificada - atentados especialmente contra o patrimônio), repercute manifesta e induvidosamente de maneira negativa na comunidade local, razão pela qual a necessidade de garantia da ordem pública é indiscutível, sendo necessária a segregação dos requeridos do meio social, evitando-se com isso a prática de novos delitos. Desta forma, inegável que a custódia preventiva dos investigados é aconselhável para a efetiva colheita das provas, assim como para garantir o tranqüilo andamento do feito, uma vez que soltos traria uma sensação de impunidade, além do risco de reiterações criminosas, já que a maioria dos investigados possuem maus antecedentes, conforme já dito. [...] Por conseguinte, a garantia à ordem pública consubstancia-se em que a prisão seja necessária para afastar o autor do delito do convívio social em razão de sua periculosidade por ter praticado, por exemplo, crime de extrema gravidade, como é o caso dos autos, ou por ser pessoa voltada à prática reiterada de infrações penais. Outrossim, além da gravidade do crime, a restrição de liberdade dos investigados também decorre da garantia da aplicação de futura lei penal, ante a possibilidade concreta de fuga. De mais a mais, suas prisões preventivas se fazem necessárias para conveniência da instrução criminal, a fim de evitar a coação e ameaça a testemunhas, bem como para garantir a regular aquisição, conservação e veracidade da prova, pois caso os representados permaneçam soltos, terão livre acesso, podendo prejudicar as provas a serem produzidas em Juízo, tanto é, que quando tiveram conhecimento da prisão de MARCIANO, bem como da fiscalização realizada pela Receita Estadual no estabelecimento comercial de HC 412921 C=40<5854164485@ 2017/0206611-7 Documento Página 3 de 5 (e-STJ Fl.170) Documento eletrônico VDA17226423 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): MINISTRO Sebastião Reis Júnior Assinado em: 22/08/2017 13:45:10 Publicação no DJe/STJ nº 2267 de 24/08/2017. Código de Controle do Documento: AB87862A-E76E-43C7-BAAC-83DA8EC5C5D0 Superior Tribunal de Justiça S30 RICARDO e DIEGO, aparentemente, buscaram obstruir a colheita de provas ao as esconderem da polícia. [...] O Tribunal de Justiça, por sua vez, deixou consignado no acórdão o seguinte (fl. 139/140 - grifo nosso): [...] Já o periculum libertatis (perigo concreto causado pela permanência do paciente em liberdade) está demonstrado em razão da necessidade de garantia da ordem pública, diante das peculiaridades do caso em espécie, pois há fortes indícios de que o paciente integre uma quadrilha organizada, com perfeita divisão de tarefas, com o fim de roubar mercadorias das transportadoras e depois comercializá-las em estabelecimentos comerciais da cidade, com sonegação de impostos. A prisão preventiva do paciente também se faz necessária para a conveniência da instrução criminal, para se evitar a coação e ameaça a testemunhas. Note-se que o Juízo Coator, ao justificar a necessidade da prisão, observou que o paciente junto com os comparsas, ao tomarem conhecimento da prisão de Marciano, bem como da fiscalização realizada pelo Receita Estadual no estabelecimento comercial de Ricardo e Diego, aparentemente, buscaram obstruir a colheita de provas escondendo as mesmas da polícia. [...] Ocorre que, com o advento da Lei n. 12.403/2011, a prisão cautelar passou a ser, mais ainda, a mais excepcional das medidas, devendo ser aplicada somente quando comprovada a inequívoca necessidade, devendo-se sempre verificar se existem medidas alternativas à prisão adequadas ao caso concreto. A propósito: HC n. 255.834/MG, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 15/9/2014. Assim, da análise dos trechos transcritos, verifica-se que, em que pesem as relevantes considerações realizadas pelas instâncias ordinárias, não há, por ora, dados concretos (mas, apenas suposições) que indiquem que o paciente tentou obstruir as investigações e, muito menos, que ele pretende fugir da comarca. Quanto ao risco de reiteração de criminosa, o Magistrado tratou todos os investigados de uma única forma, como se todos tivessem HC 412921 C=40<5854164485@ 2017/0206611-7 Documento Página 4 de 5 (e-STJ Fl.171) Documento eletrônico VDA17226423 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): MINISTRO Sebastião Reis Júnior Assinado em: 22/08/2017 13:45:10 Publicação no DJe/STJ nº 2267 de 24/08/2017. Código de Controle do Documento: AB87862A-E76E-43C7-BAAC-83DA8EC5C5D0 Superior Tribunal de Justiça S30 antecedentes criminais e, por isso, pudessem continuar a prática delitiva. O que não condiz com a realidade. Nesse caso, existem medidas alternativas à prisão que melhor se adequam à situação do imputado. Ante o exposto, defiro a liminar para substituir a prisão preventiva do paciente nos Autos n. 0003223-68.2017.8.16.0090 da comarca de Ibiporã/PR, pelas medidas alternativas à prisão consistentes em afastamento da empresa, proibição de manter contato com os corréus e comparecer em juízo no prazo e nas condições fixadas pelo Juiz singular, alertando-se o paciente que, em caso de descumprimento, a prisão preventiva será restabelecida. Comunique-se com urgência. Solicitem-se informações, a serem prestadas no prazo de 10 dias, à autoridade coatora e ao Juízo da Vara Criminal da Comarca de Ibiporã/PR (Autos n. 0003223-68.2017.8.16.0090) acerca da atual situação do paciente e do andamento da ação penal, encaminhando-se, inclusive, cópia da sentença caso tenha sido proferida. Após, dê-se vista dos autos ao Ministério Público Federal. Publique-se. Brasília, 22 de agosto de 2017. Ministro Sebastião Reis Júnior Relator
HC 412.921.
 

Revista Consultor Jurídico, 03 de setembro de 2017