domingo, 12 de dezembro de 2010

Projeto do Novo Código de Processo Penal

          Aprovado pelo Senado Federal, no dia 07 deste mês, o projeto que altera o Código de Processo Penal, tido por alguns como o "código dos réus", traz inovações polêmicas.

          Uma das principais é a criação do juiz das garantias, que atuaria apenas na fase de investigação do processo, ficando impedido de julgar o caso, o que seria feito por outro juiz. Constam entre as atribuições do juiz de garantia: decretar prisão provisória e temporária, ou outra medida cautelar; decidir sobre a quebra de sigilos e sobre pedido de interceptação telefônica; decidir sobre o pedido de produção antecipada de provas; prorrogar o prazo de duração do inquérito; determinar o trancamento do inquérito quando não houver fundamento razoável; solicitar documentos, laudos e informações ao delegado; julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia.

          Aqueles que defendem a separação de responsabilidades entre os juízes argumentam que, atualmente, ao participar da fase de produção de provas o magistrado acaba se "contaminando", o que interferiria na imparcialidade necessária ao juiz para o julgamento do caso. Também para a Ordem dos Advogados Brasil (OAB) o juiz das garantias é uma " homenagem à imparcialidade".

         Já para o presidente da Ajufe (Associação dos Juizes Federais), juiz Gabriel Wedy "é importante que o juiz responsável pela determinação da produção de provas e por ouvir os réus e testemunhas seja o mesmo a dar a sentença". Em seu entender é evidente que o magistrado que vai apenas decidir não terá amplo conhecimento do processo, uma vez que não terá ouvido o réu e as testemunhas, por exemplo, só tendo acesso aos registros. Receberá a prova de forma fria dentro do processo. Também o juiz federal criminal Odilon de Oliveira afirma, categoricamente, que: "Dois juízes, entre os poucos que existem para um processo penal é ideia de quem ignora também os aspecto geográfico do país. A grande maioria das quase 3.000 comarcas possui apenas uma vara e um magistrado, também porque a quantidade de processos não comporta mais de um juiz. Concluída a investigação, o juiz ficará impedido. O inquérito policial terá que ser remetido para outra comarca - mas os investigados e as testemunhas ficarão - ou outro magistrado deixará a sua comarca e deslocará, por várias vezes àquelourtra, recebendo diárias e atrasando os seus próprios processos". Para ele esse é mais um mecanismo de resistência no combate ao crime organizado, pois haverá morosidade, gastos, prescrição e impunidade.

          O relator do projeto senador Renato Casagrande, contudo, avalia que o dispositivo traz avanços, pois permitirá a especialização de juízes na parte da investigação. Como algumas comarcas contam com apenas um juiz não foi estipulado prazo para a sua implementação.

          Além do juiz das garantias, o projeto ainda propõe as seguintes alterações:

          a) Embargo de Declaração
          Hoje não há limite para oposição de embargo de declaração para esclarecer ponto obscuro, contraditório ou duvidoso na sentença. No projeto caberá apenas um embargo em cada instância;

          b) Inquérito Policial
           Iniciado o inquérito, o Ministério Público deverá ser imediatamente comunicado;
 
          c) Vítima
          A vítima será informada sobre os diferentes aspectos do processo, como da conclusão do inquérito e do oferecimento da denúncia, inclusive sobre a prisão ou soltura do suposto autor do crime, sobre o arquivamento da investigação e da condenação ou absolvição do acusado;

          d) Interceptação Telefônica
          Hoje o prazo de interceptação é de 15 dias, mas pode ser prorrogado indefinidamente. No projeto as interceptações só serão autorizadas nos casos de crimes cuja pena seja superior a 2 anos, exceto nos crimes de formação de quadrilha. O prazo de duração da interceptação não deverá exceder de 60 dias, em geral,  mas pode chegar a 360 dias, ou até mais, nos casos de crime permanente;

          e) Júri
          Os jurados poderão se comunicar uns com os outros, exceto durante a fase de instrução e dos debates. O voto de cada jurado continua secreto, mas o juri pode se reunir, reservadamente, por até  1 hora para discutir e deliberar a votação;

          f) Fiança
          Atualmente varia de 1 a 100 salários mínimos. Conforme o projeto, seu valor será fixado entre 1 a 200 salários mínimos para infrações cujo limite máximo da pena privativa de liberdade fixada seja igual ou superior a 8 anos. Nas demais infrações penais, o valor continua de 1 a 100 salários mínimos;

          g) Medidas Cautelares
          Para que o juiz disponha de alternativas na condenação e com o objetivo de desafogar os presídios o projeto estabelece, além da fiança, mais 15 tipos de medidas cautelares, como o recolhimento domiciliar e o monitoramento eletrônico, nos casos em que haja suspeita de uma possível fuga, suspensão do exercício da profissão, da atividade econômica ou da função pública e a suspensão das atividades de pessoa jurídica, entre outras;

          h) Prisão Especial
         O projeto acaba com a prisão especial para quem tem curso superior. Esse tipo de prisão permanecerá, apenas em caso de proteção da integridade física e psíquica de qualquer prisioneiro que estiver em risco de ações de retaliação;

          i) Prisão Preventiva
          No caso de prisão preventiva deverão ser obedecidas três regras: jamais será utilizada como forma de antecipação da pena; a gravidade do fato ou o clamor público não justifica, por si só, a sua decretação; só será imposta se outras medidas cautelares pessoais forem inadequadas ou insuficientes. Além disso, não poderá ultrapassar 180 dias se decretada no curso da investigação ou antes da sentença condenatória recorrível, ou de 360 dias se decrretada ou prorrogada por ocasião da sentença condenatória recorrível;

          j) Prisão Provisória
         A prisão provisória fica limitada a três modalidades: flagrante, preventiva e temporária.
         Será nulo o flagrante preparado e a prisão temporária continua com  o prazo máximo de 5 dias, admitida uma única prorrogação por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade;

          k) Sequestro e Alienação de Bens
         O sequestro de bens atualmente não é permitido na área criminal e a alienação só é permitida nos processos envolvendo tráfico de drogas. O projeto prevê as duas hipóteses. O acusado pode apresentar caução para levatar o sequestro;

          l) Interrogatório
          O interrogatório passa a ser tratado como meio de defesa e não mais de prova: antes o acusado deverá ser informado do inteiro teor dos fatos a ele imputados e reunir-se em local reservado com o seu defensor. Passa a ser permitido também o interrogatório do réu preso por videoconferência em caso de prevenir risco à segurança pública ou viabilizar a participação de réu doente;

          m) Prescrição
          Uma mudança importantíssima e que tem gerado polêmica, trazida pelo projeto, é a da regra que prevê o congelamento da contagem do tempo para a prescrição de crimes, enquanto o processo estiver pendente de julgamento de recursos em terceira instância (STJ e STF). Uns entendem como cerceamento do direito de defesa, outros acham importante porque evita que a defesa se utilize de recursos procrastinatórios para conseguir a prescrição.

          Em linhas gerais, essas são as principais alterações propostas pelo projeto do novo Código de Processo Penal, votado no Senado \Federal, cujo texto ainda precisará passar por aprovação na Câmara dos Deputados.