quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Conciliação na Justiça Trabalhista

É preciso discutir o conciliador na Justiça trabalhista

Um tema importante para a reflexão atualmente no Direito Processual do Trabalho envolve a seguinte pergunta: o artigo 277, § 1º, do Código de Processo Civil se aplica ao Processo do Trabalho?
 
Para começar a reflexão, naturalmente, é preciso partir da compreensão do dispositivo, o qual conta com a seguinte redação: “A conciliação será reduzida a termo e homologada por sentença, podendo o juiz ser auxiliado por conciliador.
A aplicação do CPC ao Direito Processual do Trabalho, conforme a previsão do artigo 769 da CLT, depende de dois requisitos, quais sejam, omissão e compatibilidade.
 
 Quanto ao primeiro, não há dúvida de que inexiste norma específica sobre o tema no texto consolidado. Quanto ao segundo requisito, a questão exige um pouco mais de cuidado e argumentação.
 
Portanto, vamos à análise da existência ou não de compatibilidade.
Primeiramente, é preciso reconhecer que há diversos dispositivos na legislação processual trabalhista que prestigiam a conciliação, enquanto meio para resolução do conflito judicializado. O artigo 764, caput, da CLT estabelece que “Os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho serão sempre sujeitos à conciliação”. Ou seja, a tentativa de conciliação não se trata de uma faculdade, mas de ato de observância imperativa.
Já o § 1º do mesmo dispositivo vai mais longe, impondo ao Juiz do Trabalho o empenho necessário à busca da conciliação, ao estabelecer que “os juízes e Tribunais do Trabalho empregarão sempre os seus bons ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos”. E desta norma vem um primeiro aspecto importante para encontrar a resposta objeto do presente texto: qual o alcance deste emprego de “bons ofícios e persuasão”? Isto pode envolver uma inteligência dos meios empregados para o alcance do resultado esperado pela norma?
Não há dúvida que sim! Por outro lado, o artigo 764 da CLT não estabelece expressamente que o Juiz do Trabalho tem o monopólio da mediação judicial e da conversa com as partes. O referido dispositivo exige, na realidade, que o Juiz do Trabalho seja inteligente e eficiente no emprego dos meios voltados à conciliação.
 
Além disto, também não há dúvida de que o artigo 277, § 1º do CPC tem embutido uma lógica de inteligência e otimização de recursos humanos na mediação judicial.
Todos sabemos que o tempo consiste num dos recursos mais escassos para cumprir uma pauta de audiência. E o auxílio de conciliadores-não Magistrados pode permitir a ampliação deste recurso tão valioso chamado tempo.
 
É óbvio que é preciso capacitação e criação de condições, inclusive estruturais, para que a aplicação da referida norma ocorra de maneira adequada. Porém, do ponto de vista teórico e conceitual, a premissa é de que o auxílio de conciliadores que não ostentam a condição de Magistrados ocorreria de forma adequada, principalmente em termos de capacitação. Mas a execução da aplicação do dispositivo corresponde a um tema específico de política judiciária.
 
Portanto, pela lógica do artigo 764, § 1º da CLT, o artigo 277, § 1º do CPC é manifestamente compatível com o Processo do Trabalho.
E mais, não há nenhuma norma na CLT que estabeleça expressamente a existência do monopólio da mediação judicial por parte do Juiz do Trabalho. Inclusive, o artigo 846 da CLT estabelece que “Aberta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação.”, de modo que não diz que “apenas”, “somente”, “exclusivamente” ou ”privativamente” “o juiz ou presidente proporá a conciliação.”. Aliás, ainda que se entenda que tal dispositivo contempla ato privativo do Juiz, este poderia propor a conciliação e deixar as partes conversando com o conciliador, convocado a auxiliar na forma do artigo 277, § 1º do CPC.
 
Poder-se-ia ainda sustentar que o referido dispositivo depõe contra o princípio da proteção, pois o Magistrado não estaria diretamente em contato com a parte hipossuuficiente, a tornando vulnerável a conciliações inadequadas para os padrões tutelares do Direito e Processo do Trabalho. Contudo, este argumento não vai longe.
 
Primeiramente pelo fato de que a homologação do acordo, conforme os termos do artigo 831 da CLT, trata-se de ato que compete exclusivamente ao Juiz do Trabalho, o qual deve não apenas homologar, mas controlar o seu conteúdo. Por outro lado, conforme a tese da Súmula 418 do TST, o Juiz do Trabalho não é obrigado a homologar acordos, o que significa que cabe a este avaliar o que está sendo proposto e, se entender que não é adequada a proposta, se recusar à homologação.
 
É bem verdade que há vozes no sentido de que adotar o referido dispositivo seria abrir as portas para o retorno da representação classista à Justiça do Trabalho. Não obstante a falta de cientificidade deste argumento, contando com natureza puramente política e corporativa, este revela o desconhecimento ou dos mecanismos atuais de Resolução Apropriada de Disputas, nos quais se insere o artigo 277, § 1º do CPC, ou o que foi a chamada representação classista. Mas o fato é que, definitivamente, um modelo não tem qualquer relação com o outro.
 
De qualquer forma, independente da conclusão que se chegue e dos posicionamentos que sejam assumidos, é preciso que o tema seja discuto de frente e sem receios, com a contraposição de argumentos teóricos, conceituais e práticos. Sem que os compreensíveis medos e traumas do passado impeçam a reflexão, o debate e a evolução.

Rogério Neiva é juiz do Trabalho da 10ª Região.