terça-feira, 2 de junho de 2015

Soluções extrajudiciais de conflitos X Avanço do processo civilizatório

MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM

Soluções extrajudiciais são avanço do processo civilizatório da humanidade

Por Flavio Crocce Caetano e Luiz Felipe Salomão

A Constituição de 1988 inaugurou uma nova era de garantias aos direitos dos cidadãos, sobretudo no campo do acesso à justiça, de sorte que, no afã de conferir solução às mais diversas disputas, o País vem experimentando crescimento exponencial de demandas judiciais sobre as mais diversas controvérsias, sendo a judicialização uma característica desse fenômeno.
Entretanto, o crescimento da sociedade e sua complexa estruturação num mundo globalizado orientaram a adoção de um modelo temperado de divisão de tarefas – que conferisse alternativas seguras para a solução de conflitos, com facilitação do acesso à justiça.
A implementação de instrumentos de pacificação social eficientes, mas que não desvirtuem os ideais de justiça, permite a desobstrução do Judiciário, mantendo as garantias sociais exigidas. São inúmeros os exemplos de práticas bem-sucedidas no mundo, envolvendo, dentre outros, a mediação e a arbitragem.
A arbitragem – método em que os litigantes atribuem a um terceiro a decisão do conflito – está regulada no Brasil pela Lei 9.307, de 1996. Com o seu reconhecido texto dinâmico, deflagrou uma forte tendência do uso desse mecanismo, que passou a ser observada em diplomas legislativos posteriores. Curiosamente, com o advento da Lei de Arbitragem, observou-se um número crescente de câmaras arbitrais também especializadas em mediação.
O Projeto de atualização da Lei da Arbitragem, convertido na Lei 13.129, de 26 de maio de 2015 – produzido pela Comissão de Juristas indicada pelo Senado Federal em abril de 2013 –, estabeleceu a plena utilização do instituto para a administração pública. Um salto enorme para solucionar rapidamente litígios a envolver o poder público, diminuindo a presença, no Judiciário, daquele que é o maior litigante judicial. Ademais, a possibilidade da arbitragem em contratos públicos, com a garantia de árbitros especializados nas diversas questões da infraestrutura, carrega a perspectiva de atrair grandes investimentos, nacionais e internacionais.
Ainda, a nova lei dispôs sobre a utilização desse instituto para dirimir conflitos societários, com cláusula a ser instituída por assembleia de acionistas, assegurado o direito de retirada aos sócios minoritários, o que permitirá solucionar, rapidamente, tais impasses, que, muitas vezes, acabam paralisando grandes empresas.
Foram atualizados os procedimentos, regulada a prescrição e a forma da sentença arbitral, dispondo-se também sobre medidas cautelares, ou tutelas de urgência.
Houve veto em dois pontos, que ainda serão analisados pelo Senado Federal: arbitragem para os contratos de consumo por adesão e para os contratos trabalhistas, em cargos de elevada hierarquia nas empresas. Em ambos os casos, só quando o consumidor ou trabalhador tivessem a iniciativa de instituir a arbitragem.
Por outro lado, a mediação, ainda carente de um marco legal regulatório específico, é um procedimento autocompositivo pelo qual um terceiro – imparcial e independente –, dotado de técnicas específicas e sem sugerir a solução, busca aproximar as partes, facilitando-lhes o diálogo para que compreendam a origem e as facetas de suas posições antagônicas e construam a resolução do embate, com o almejado efeito de prevenir novos desentendimentos. Nesse contexto, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 125, em outubro de 2010, indicando a mediação como meio de resolução de conflitos.
Nesse particular, o substitutivo aprovado na CCJ, de autoria do deputado federal Sergio Zveiter (PSD-RJ) e que será votado em definitivo no Plenário do Senado em 2 de junho de 2015, vem sendo trabalhado em conjunto pelo Ministério da Justiça e pela Comissão de Juristas do Senado.
Estão em destaque os seguintes pontos: a mediação, extrajudicial ou judicial, pode ser utilizada para dirimir qualquer conflito que admita transação; a mediação extrajudicial independe de registro em cadastro de mediadores; os mediadores judiciais precisarão ser graduados há pelo menos dois anos e cursar escola de formação de mediadores; a medição considera-se instituída a partir da data em que é firmado o termo inicial de mediação – marco da suspensão do prazo prescricional –, encerrando-se com a lavratura de seu termo final; é possível a utilização da mediação em conflitos envolvendo órgãos da administração pública direta e indireta de todos os entes federados; é viável a realização de mediação via internet ou qualquer outro meio que permita a transação a distância.
Em conclusão, pode-se afirmar com segurança que as soluções extrajudiciais, em especial a arbitragem e a mediação, representam o avanço do processo civilizatório da humanidade, que, de maneira consciente, busca mecanismos de pacificação social eficientes. Indiretamente, carrega perspectiva de racionalidade para a jurisdição estatal, hoje assoberbada com o decantado volume de processos.
Revista Consultor Jurídico, 31 de maio de 2015.

Diferenças regionais no acesso à Justiça chegam a 100% no Brasil

O acesso à Justiça no Brasil é muito mais desigual do que a distribuição de renda, a educação e a saúde afirmou o secretário da reforma do Judiciário durante discussão da ONU sobre os indicadores nacionais e a importâncias do acesso à Justiça para todos na agenda pós-2015.
“O acesso à justiça é fundamental para fortalecer a democracia, fortalecer os direitos dos cidadãos e, sobretudo, é um direito humano essencial básico”, afirmou a representante residente adjunta do Programa da ONU para o Desenvolvimento (PNUD), Ana Inés Mulleady, na abertura do debate entre especialistas sobre Indicadores de acesso à justiça no Brasil.
A declaração reforça o 16º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS): promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. Esse é um dos objetivos – atualmente em negociação entre os Estados-membro das Nações Unidas – da agenda de desenvolvimento pós-2015.
Realizado pelo PNUD na Casa da ONU, em Brasília, o debate teve como objetivo promover a discussão e troca de informações entre instituições que trabalham com indicadores e pesquisa sobre acesso à justiça. O tema central girou sobre a aplicação de indicadores para mensuração e o acompanhamento do acesso a Justiça no Brasil, bem como o desenvolvimento de uma estratégia de colaboração sobre o tema e aprimoramento dos indicadores de acesso à justiça disponíveis no país. Participaram representantes de órgãos de pesquisa, universidades e instituições do executivo e judiciário relacionados ao tema.
Acesso desigual no Brasil
Tendo em vista a disponibilização, para todos os brasileiros, de informações sobre a justiça e outros órgãos onde os cidadãos podem reivindicar seus direitos, a Secretaria de Reforma do Judiciário, em parceria com a UnB, desenvolveu uma ferramenta eletrônica única em âmbito global: o atlas de acesso à justiça.
Depois de apresentar o projeto, o secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Crocce Caetano, explicou que o Brasil desenvolveu um índice para quantificar o acesso à justiça dos brasileiros. O Índice Nacional de Acesso à Justiça (INAJ) revelou que 14 estados estão abaixo da média nacional em acesso à justiça; pessoas mais pobres e mais vulneráveis têm menos acesso à justiça; a unidade federativa mais bem colocada no índice – Distrito Federal – apresenta uma diferença de 1000% em relação à pior colocada – Maranhão.
“No Brasil, a diferença de IDH entre o maior e o menor estado chega a 20%, já o INAJ chega a 1000%, ou seja, o acesso à justiça no Brasil é muito mais desigual do que a distribuição de renda, a educação e a saúde”, concluiu o secretário.
Um dos instrumentos utilizados para medir o acesso à Justiça no Brasil é uma pesquisa com defensores públicos de todo o país que pode ser respondida, pela internet, até o dia 12 de junho.
Fonte: PNUD