quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Conciliação na Justiça Trabalhista

É preciso discutir o conciliador na Justiça trabalhista

Um tema importante para a reflexão atualmente no Direito Processual do Trabalho envolve a seguinte pergunta: o artigo 277, § 1º, do Código de Processo Civil se aplica ao Processo do Trabalho?
 
Para começar a reflexão, naturalmente, é preciso partir da compreensão do dispositivo, o qual conta com a seguinte redação: “A conciliação será reduzida a termo e homologada por sentença, podendo o juiz ser auxiliado por conciliador.
A aplicação do CPC ao Direito Processual do Trabalho, conforme a previsão do artigo 769 da CLT, depende de dois requisitos, quais sejam, omissão e compatibilidade.
 
 Quanto ao primeiro, não há dúvida de que inexiste norma específica sobre o tema no texto consolidado. Quanto ao segundo requisito, a questão exige um pouco mais de cuidado e argumentação.
 
Portanto, vamos à análise da existência ou não de compatibilidade.
Primeiramente, é preciso reconhecer que há diversos dispositivos na legislação processual trabalhista que prestigiam a conciliação, enquanto meio para resolução do conflito judicializado. O artigo 764, caput, da CLT estabelece que “Os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho serão sempre sujeitos à conciliação”. Ou seja, a tentativa de conciliação não se trata de uma faculdade, mas de ato de observância imperativa.
Já o § 1º do mesmo dispositivo vai mais longe, impondo ao Juiz do Trabalho o empenho necessário à busca da conciliação, ao estabelecer que “os juízes e Tribunais do Trabalho empregarão sempre os seus bons ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos”. E desta norma vem um primeiro aspecto importante para encontrar a resposta objeto do presente texto: qual o alcance deste emprego de “bons ofícios e persuasão”? Isto pode envolver uma inteligência dos meios empregados para o alcance do resultado esperado pela norma?
Não há dúvida que sim! Por outro lado, o artigo 764 da CLT não estabelece expressamente que o Juiz do Trabalho tem o monopólio da mediação judicial e da conversa com as partes. O referido dispositivo exige, na realidade, que o Juiz do Trabalho seja inteligente e eficiente no emprego dos meios voltados à conciliação.
 
Além disto, também não há dúvida de que o artigo 277, § 1º do CPC tem embutido uma lógica de inteligência e otimização de recursos humanos na mediação judicial.
Todos sabemos que o tempo consiste num dos recursos mais escassos para cumprir uma pauta de audiência. E o auxílio de conciliadores-não Magistrados pode permitir a ampliação deste recurso tão valioso chamado tempo.
 
É óbvio que é preciso capacitação e criação de condições, inclusive estruturais, para que a aplicação da referida norma ocorra de maneira adequada. Porém, do ponto de vista teórico e conceitual, a premissa é de que o auxílio de conciliadores que não ostentam a condição de Magistrados ocorreria de forma adequada, principalmente em termos de capacitação. Mas a execução da aplicação do dispositivo corresponde a um tema específico de política judiciária.
 
Portanto, pela lógica do artigo 764, § 1º da CLT, o artigo 277, § 1º do CPC é manifestamente compatível com o Processo do Trabalho.
E mais, não há nenhuma norma na CLT que estabeleça expressamente a existência do monopólio da mediação judicial por parte do Juiz do Trabalho. Inclusive, o artigo 846 da CLT estabelece que “Aberta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação.”, de modo que não diz que “apenas”, “somente”, “exclusivamente” ou ”privativamente” “o juiz ou presidente proporá a conciliação.”. Aliás, ainda que se entenda que tal dispositivo contempla ato privativo do Juiz, este poderia propor a conciliação e deixar as partes conversando com o conciliador, convocado a auxiliar na forma do artigo 277, § 1º do CPC.
 
Poder-se-ia ainda sustentar que o referido dispositivo depõe contra o princípio da proteção, pois o Magistrado não estaria diretamente em contato com a parte hipossuuficiente, a tornando vulnerável a conciliações inadequadas para os padrões tutelares do Direito e Processo do Trabalho. Contudo, este argumento não vai longe.
 
Primeiramente pelo fato de que a homologação do acordo, conforme os termos do artigo 831 da CLT, trata-se de ato que compete exclusivamente ao Juiz do Trabalho, o qual deve não apenas homologar, mas controlar o seu conteúdo. Por outro lado, conforme a tese da Súmula 418 do TST, o Juiz do Trabalho não é obrigado a homologar acordos, o que significa que cabe a este avaliar o que está sendo proposto e, se entender que não é adequada a proposta, se recusar à homologação.
 
É bem verdade que há vozes no sentido de que adotar o referido dispositivo seria abrir as portas para o retorno da representação classista à Justiça do Trabalho. Não obstante a falta de cientificidade deste argumento, contando com natureza puramente política e corporativa, este revela o desconhecimento ou dos mecanismos atuais de Resolução Apropriada de Disputas, nos quais se insere o artigo 277, § 1º do CPC, ou o que foi a chamada representação classista. Mas o fato é que, definitivamente, um modelo não tem qualquer relação com o outro.
 
De qualquer forma, independente da conclusão que se chegue e dos posicionamentos que sejam assumidos, é preciso que o tema seja discuto de frente e sem receios, com a contraposição de argumentos teóricos, conceituais e práticos. Sem que os compreensíveis medos e traumas do passado impeçam a reflexão, o debate e a evolução.

Rogério Neiva é juiz do Trabalho da 10ª Região.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Procon atendeu dois milhões de consumidores em 2012

Em 2012, Procon atendeu dois milhões de consumidores

Em 2012, o Procon registrou 2 milhões de atendimentos a consumidores. A quantia expressa um aumento de 19,7% em relação aos 1,6 milhão de atendimentos no ano de 2011.
 
O setor mais demandado pelos consumidores que procuram os Procons é o financeiro (banco comercial, cartão de crédito, financeira e cartão de loja) com 23,8%. Além disso, foi possível constatar um aumento de demandas no setor de telecomunicações (telefonia celular, telefonia fixa, TV por assinatura e internet), que saltou de 17,4% em 2011, para 21,7% dos registros em 2012.
 
Entre os produtos e serviços que mais importunaram o consumidor brasileiro ao longo do ano passado destacam-se telefonia celular (9,1%), banco comercial (9%), cartão de crédito (8,2%), telefonia fixa (6,6%) e financeira (5,1%). A publicação mostra que a empresa Oi lidera o ranking com 120.374 demandas. Em seguida estão a Claro-Embratel, com 102.682, o grupo Itaú, com 97.578, Bradesco, com 61.257, e Vivo-Telefônica, com 44.022 reclamações.
 
Os principais problemas enfrentados pelos consumidores em 2012 foram: 37,4% relativos a cobranças (falta de informação sobre valores, cobranças duplicadas etc); 17,3% relativos a oferta de produtos e serviços; 13,2% problemas com contrato (alterações unilaterais, descumprimento de ofertas e publicidades enganosas), 17,5% referentes à qualidade de produtos (vício ou má qualidade de produto/ serviço, defeitos e garantia de produtos).
 
As mulheres representam 52,97% das pessoas que procuraram os Procons em 2012. A maioria dos consumidores tem entre 21 e 50 anos.
 
As informações foram divulgadas pelo Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (Sindec) e fazer parte do Boletim Sindec 2012, divulgado em 16/10 pela Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça (Senacon/MJ).
 Com informações da Assessoria de Imprensa do Sindec.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Programas do CNJ sobre Direitos Humanos

 No dia 10/12, foi comemorado em todo o mundo o Dia Internacional dos Direitos Humanos. A data marca a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
 
No Brasil, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) possui diversos programas voltados à proteção dos direitos humanos. Entre eles, estão os mutirões carcerários e o Justiça ao Jovem, que inspecionam os presídios e as unidades de internação de crianças e adolescentes, com o objetivo de garantir os direitos fundamentais e o tratamento digno a presos e jovens que cumprem medidas socioeducativas.
 
 Desde que esses programas foram criados, em 2008 e 2010, respectivamente, unidades de todos os estados já foram visitadas.
 
Em parceria com os tribunais brasileiros, o CNJ também coordena o Começar de Novo, que busca a reinserção social e a reintegração ao mercado de trabalho de presos e egressos do sistema carcerário. Estima-se que, atualmente, cerca de 20% da população carcerária exerça algum tipo de trabalho dentro ou fora dos presídios. Como resultado do Começar de Novo, hoje, 8 dos 12 estádios brasileiros que serão sede da Copa do Mundo 2014 estão sendo erguidos com a ajuda de 148 presos e ex-detentos, empregados nessas obras.
 
Outro programa voltado à garantia dos direitos humanos é o Cidadania, Direito de Todos, que facilita o acesso da população indígena à documentação civil. Desde 2010, quando teve início, o projeto já emitiu cerca de 21 mil documentos, como certidão de nascimento, CPF e carteira de trabalho. A meta é expedir 100 mil até julho do ano que vem, para garantir aos indígenas acesso a serviços básicos, por meio da documentação.
 
Dia internacional – A declaração universal foi o primeiro documento internacional a afirmar a universalidade dos direitos fundamentais e a igualdade entre todos os seres humanos. Por isso, é considerada marco para a proteção e o respeito dos direitos humanos. Embora ela tenha sido aprovada em 1948, o dia internacional em homenagem ao documento foi instituído apenas dois anos depois, em 1950, pela ONU, com o objetivo de alertar os governantes de todo o mundo para o cumprimento das regras universais que visam à proteção dos direitos dos homens.
 
Confira os principais programas do CNJ voltados à proteção dos direitos humanos:
 
Justiça ao Jovem – Lançado em junho de 2010, o Programa Justiça ao Jovem inspeciona unidades de internação de jovens em conflito com a lei, com o objetivo de melhorar a condição e o tratamento dado a crianças e adolescentes que cumprem medidas socioeducativas.
 
Justiça Plena – Monitora e dá transparência ao andamento de processos de grande repercussão social, como questões criminais, ações civis públicas, ações populares, processos em defesa do direito do consumidor e ambientais. Atualmente 129 casos são monitorados e 25 já foram finalizados com o apoio do programa.
 
Lei Maria da Penha – O CNJ possui uma campanha de fortalecimento da aplicação da Lei Maria da Penha e da atuação dos juizados especiais, que tratam de ações de violência doméstica.
 
Mutirão Carcerário – Lançado em 2008, o programa inspeciona unidades prisionais de todo o País, com o objetivo de melhorar a condição dos presos e garantir o cumprimento da Lei de Execuções Penais.
 
Começar de Novo – Busca a reintegração dos presos e ex-detentos no mercado de trabalho. O objetivo do programa é promover a cidadania e, consequentementereduzir a reincidência de crimes.
 
Cidadania, Direito de Todos – Criado em 2010 pelo CNJ, busca facilitar o acesso da população indígena à documentação civil. O programa já emitiu cerca de 21 mil documentos, como certidão de nascimento, CPF e carteira de trabalho.
 
Combate ao Tráfico de Pessoas – O CNJ já realizou dois Simpósios Internacionais para discutir a adoção de medidas de combate ao tráfico de pessoas. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o tráfico de pessoas é uma das atividades criminosas mais lucrativas, fazendo cerca de 2,5 milhões de vítimas e movimentando aproximadamente 32 bilhões de dólares por ano.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Enfam quer disciplina de introdução à Magistratura

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) quer fazer com que os estudantes de Direito do país se familiarizem, ainda na graduação, com as especificidades, desafios e responsabilidades do ofício de magistrado. A disciplina “Magistratura – Vocação e Desafios”, que será oferecida como matéria eletiva, pretende instigar o autoconhecimento dos graduandos e estimular aqueles vocacionados a seguir o caminho da magistratura.

“Nós queremos colher os talentos nas árvores”, explica o juiz-auxiliar da Enfam, Ricardo Chimenti, um dos idealizadores do projeto. O objetivo da Escola é que a disciplina seja oferecida nos 89 cursos de Direito que possuem o selo de qualidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O programa da disciplina “Magistratura – Vocação e Desafios” foi elaborado pela equipe pedagógica da Enfam e contemplará quatro módulos.
 
O primeiro enfocará a questão da vocação para a magistratura, abordando as competências e habilidades do ofício, bem como tratando da necessidade do magistrado ser vocacionado para enfrentar os desafios e responsabilidades intrínsecos ao cotidiano da profissão.
 
O segundo módulo tratará da interdisciplinaridade da atividade judicante, enfocando os diferentes papéis desempenhados pelos magistrados. “Acreditamos que a atividade do juiz deve ser múltipla e essa disciplina vai abordar justamente a questão do juiz sociólogo, do psicólogo, do gestor, do mediador, do comunicador e, ao mesmo tempo, do juiz enquanto agente de poder”, esclarece o secretário-executivo da Enfam, Benedito Siciliano.
 
Desafios – A terceira unidade da disciplina será focada nos desafios presentes e futuros da magistratura. Nesse módulo serão trabalhadas questões como o aumento progressivo da demanda judicial, a morosidade processual e a necessidade de capacitação permanente. Outros temas a ser abordados serão as novas tecnologias de informação, o excesso de formalismo e o prejudicial distanciamento dos magistrados da realidade social, a primazia do conflito e da solução heterocompositiva, além da qualidade da prestação jurídica e o compromisso com a satisfação do jurisdicionado.
 
Por fim, o quarto módulo da disciplina “Magistratura – Vocação e Desafios” será dedicado à reflexão acerca da ética na atividade judicante. Nesta unidade, além do estudo sobre os princípios do Código de Ética da Magistratura, os graduandos serão confrontados com questões como: a utilidade social da atividade de magistrado; sua legitimidade frente à população; e o magistrado enquanto agente de poder e prestador de um serviço público essencial.
 
“O que queremos com essa disciplina é que o estudante conheça mais a fundo o trabalho do magistrado, com todos os seus ônus e bônus, para assim poder melhor estruturar sua carreira no campo do Direito. É fundamental que os graduandos entendam que a magistratura é um ofício para vocacionados, e não apenas uma possibilidade profissional”, esclarece a ministra Eliana Calmon.
 
O professor de Direito Público da Universidade de Brasília (UnB), Mamede Said, considera válida a proposta, já que, segundo ele, os alunos vocacionados para a magistratura acabam se formando sem conhecer os pormenores da profissão. “Sem dúvida alguma é salutar a criação de uma disciplina específica sobre o assunto”, afirma.
 
Já a estudante Natália Guedes de Souza, que cursa o décimo semestre de Direito na Universidade Católica de Brasília (UCB), revela que boa parte dos cursos jurídicos não proporciona um conhecimento específico e prático sobre as carreiras profissionais da área. “Ao final do curso, o estudante se encontra despreparado e com uma infinidade de dúvidas a respeito da profissão que deseja seguir. A proposta de uma disciplina voltada para a prática da magistratura é de suma importância para a formação dos graduandos em Direito.”
 
A expectativa da Enfam é que a maioria dos 89 cursos de Direito com selo da OAB já ofereçam a disciplina “Magistratura – Vocação e Desafios” ao longo de 2013.
Da Enfam

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

CNJ: Conciliações ultrapassam R$ 700 milhões

Resolução de conflitos

Conciliações ultrapassam R$ 700 milhões, aponta CNJ

Os acordos firmados durante a VII Semana Nacional da Conciliação do Conselho Nacional de Justiça somaram R$ 744.867.513,79, segundo o balanço parcial do evento, que aconteceu entre os dias 7 e 14 de novembro. Foram 349.544 audiências no período, que resultaram em um total de 174.790 acordos.
Conforme avaliação do comitê gestor da Conciliação do CNJ, mesmo com a greve nas Justiças Federal e Trabalhista, a Semana bateu os números do ano passado, quando foram homologados 168.841 acordos.
 
 Isso comprova, segundo o comitê, que a capacitação de conciliadores e mediadores pelo CNJ e Ministério da Justiça está fazendo a diferença na resolução de conflitos por meio da prática da conciliação.
 
No ano passado, 48,29% de acordos foram homologados durante as audiências. Este ano, foram firmados 52,01% de acordos em relação às audiências. Na Semana Nacional durante o final de semana — uma das novidades desta edição — foram firmados 9.210 acordos.
 
Justiça Estadual - O ramo da Justiça que mais celebrou conciliações foi a Estadual, com 295.175 audiências, que resultaram em 155.717 acordos, montante este que alcançou a cifra de R$ 403.426.065,66. Ficam de fora desse balanço os Tribunais de Justiça de Alagoas e Paraíba, que não enviaram os dados até o fechamento do levantamento (10/12).
 
O Judiciário Trabalhista, por sua vez, celebrou 46.745 audiências de conciliação. Foram 13.187 conciliações no valor de R$ 232.306.353,83. As conciliações da Justiça do Trabalho geraram, ainda, o recolhimento de R$ 10.210.415,72 em impostos para a Receita Federal e o Instituto Nacional de Seguro Social. O levantamento acerca da 7ª edição da Semana nesse segmento não considera os Tribunais Regionais do Trabalho da 4ª, 9ª, 13ª, 16ª e 23ª Região, que também não enviaram os resultados ao CNJ.
 
Na Justiça Federal, os cinco tribunais brasileiros encaminharam os dados da Semana ao Conselho. Esse ramo do Judiciário fez 7.624 audiências em todo o Brasil. Dessas, 5.886 terminaram em acordos que somaram R$ 109.135.094,30.
 
Prêmio Conciliar - A Semana Nacional da Conciliação faz parte do Movimento Conciliar é Legal, criado pelo CNJ em 2006 para incentivar a solução de conflitos por meio do diálogo, de forma a garantir mais celeridade e efetividade à Justiça. A iniciativa conta com a participação de todos os tribunais do país.
No intuito de promover e estimular a conciliação, o CNJ outorga o Prêmio Conciliar é Legal. Os vencedores dessa iniciativa, que se encontra na 3ª edição, receberam a homenagem na sessão plenária de terça-feira (11/12), das mãos do presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa.
Serão nove os agraciados: o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (na categoria Tribunal Estadual), o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (na categoria TRF e o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (na categoria TRT), além de uma julgadora na categoria juiz individual, uma estudante na categoria acadêmicos de graduação em Direito e uma empresa na categoria sociedade civil. O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, o TRF da 2ª Região e o TRT da 1ª Região também recebem a homenagem em razão dos acordos que efetuaram durante a Semana Nacional da Conciliação.
 Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

País tem 3,8 milhões de inquéritos policiais sem conclusão

País tem 3,8 milhões de inquéritos sem conclusão

O Brasil tem mais de 3,8 milhões de inquéritos policiais ou notícias-crime sem conclusão. A quantidade equivale a 72% do total de 5,3 milhões de inquéritos recebidos pelas Promotorias e Procuradorias estaduais e federais. É o que revelam os dados do relatório Ministério Público — Um retrato, divulgado em dezembro pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Com números inéditos sobre a atuação dos Ministérios Públicos estaduais e da União, a publicação traz o total de inquéritos acumulados até o ano de 2011. O estudo, porém, não diz o início da contagem. O cálculo leva em conta os inquéritos recebidos pelos MPs que não foram arquivados nem viraram denúncia.
 
Segundo Michel Romano, promotor de Justiça em São Paulo e membro auxiliar do conselho, não existe meta para baixar o número total de inquéritos sem conclusão. “O CNMP não publica esses dados para fazer algum tipo de cobrança. A exposição dos números é uma forma de melhorar a gestão. Cada MP vai analisar seus dados”, afirma.
Ele diz que, na metade de 2013, o CNMP publicará nova edição do relatório, em que os inquéritos estarão separados ao menos por título penal.
 
Inquéritos
Área Criminal
Região
Inquéritos Policias / Notícias Criminais
Centro-Oeste
Nordeste
Norte
Sudeste
Sul
Total
Recebidos
544.564
368.537
359.791
3.199.539917.6845.390.115
Arquivados44.90148.81123.701415.095138.655671.163
Denúncias Oferecidas120.713122.35775.306384.615142.913845.904
Pendentes378.950197.369260.7842.399.829636.1163.873.048
Percentual dos pendentes70%54%72%75%69%72%
Fonte: Ministério Público - Um retrato - dados relativos a 2011
 
Na opinião do promotor de Justiça em Minas Gerais André Luís Melo, o número de casos sem conclusão é alto. “A cada 30 dias, a delegacia tem que mandar todos os inquéritos para o fórum. De cada dez desses inquéritos, sete estão indo e voltando pedindo mais prazo,” analisa.
Na avaliação do promotor, o maior problema nos inquéritos é que eles não têm o nome do réu e, assim, não é possível processar. “Por isso, ficam indo e voltando. Só se arquiva em caso de prescrição, ou quando o fato não é crime, ou ainda se é aplicável o princípio da insignificância”, diz.
Melo diz também que o número elevado de casos pendentes é reflexo direto de uma interpretação equivocada sobre a ação penal. “É preciso romper com o mito da obrigatoriedade da ação penal. Temos de estabelecer prioridades”, defende. “Com esse volume de ocorrências, não tem como investigar, relatar e apurar a autoria em 30 dias. A não ser que seja prisão em flagrante. Os crimes mais complexos acabam parados. Na Europa ou nos Estados Unidos, investiga-se só os mais graves.”
Segundo o artigo 10 do Código de Processo Penal, a Polícia deve concluir o inquérito em dez dias nos caso de indiciado preso em flagrante, e em 30 dias quando ele estiver solto. “Tenho inquérito iniciado em 2003 indo e voltando da delegacia para o fórum”, queixa-se o promotor.
 
Medidas despenalizadoras O relatório também traz o número de Transações Penais e de Suspensões Condicionais do Processo. Ambos os benefícios são para crimes de menor potencial ofensivo. Para ter direito a eles, o acusado deve cumprir alguns requisitos. Segundo os dados, foram contabilizadas, em 2011, 151 mil transações penais e 86,7 mil suspensões de processos. A soma das duas medidas chega a 237,7 mil casos — o equivalente a apenas 4% do total de 5,3 milhões de inquéritos recebidos pelo MP.
Segundo o promotor André Luis Melo, há resistência dentro do MP ao uso dessas práticas. “Se o réu não cumprir a transação, o que acontece? A legislação não fala. Isso gera insegurança na sua aplicação. A legislação diz que, se não houver cumprimento, o sujeito é preso, mas o STF julgou a norma inconstitucional, sob a justificativa de que, nesse caso, não haveria processo.”

Outro ponto que dificulta a extensão do benefício a um maior número de casos é seu alcance restrito. “A suspensão só cabe se a pena mínima for de até 1 ano, e sem antecedentes. Para roubo, não pode. Para tráfico, mesmo privilegiado, não pode. E para furto qualificado, também não pode. Não é uma gama tão grande de crimes.” Ele diz que, apesar de isso não constar da estatística, são esses os crimes mais registrados nos MPs estaduais.
Segundo o promotor Michel Romano, o número de transações e suspensões deve ser maior do que o contabilizado pelo relatório, já que muitos dos MPs deixam de fazer os lançamentos de dados de forma sistematizada.
 
De acordo com a legislação vigente, a suspensão do processo é válida para crimes cuja pena mínima seja de até um ano e deve ser proposta pelo MP quando oferecer a denúncia. Ela só pode ser aplicada a acusados que não estejam sendo processados e que não tenham condenação. Já a transação penal é cabível no caso de crimes com pena de até dois anos, que pode ser trocada por multa ou restrição de direitos. Nesse caso, o acusado também não pode ter condenação anterior nem ter sido beneficiado com a transação nos últimos cinco anos.

Medidas Despenalizadoras
Inquéritos Policiais/ Notícias CriminaisCentro-OesteNordesteNorteSudesteSulTotal
Recebidos544.564368.537359.7913.199.539917.6845.390.115
Transações Penais13.24223.6116.27992.48515.408151.025
Percentual2,4%6,4%1,7%2,9%1,7%2,8%
Suspensão do Processo2.6108.0552.61745.71627.77286.770
Percentual0,5%2,2%0,7%1,4%3%1,6%
Medidas alternativas (TP + Sursis processual)15.85231.6668.896138.20143.180237.795
Percentual2,9%8,6%2,5%4,3%4,7%4,4%
Fonte: Ministério Público - Um retrato - dados relativos a 2011

Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 10 de janeiro de 2013
 

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Nota Legal: OAB-DF ajuiza ação contra decreto do GDF


  Com o objetivo de defender os interesses do cidadão-contribuinte, a OAB/DF  ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal contra o Decreto 33.963/12, na parte que determina a retroatividade a maio de 2012 da redução do percentual do crédito do Programa Nota Legal outorgado ao contribuinte pela Lei 4.159/08.  O presidente da seccional, Ibaneis Rocha, afirmou que a ação marca o início de sua gestão na busca do respeito aos direitos do cidadão.

 A entidade pede a suspensão do artigo 4º do Decreto 33.693/2012, que substituiu o anterior (23.396/2008), e uma portaria que trata do programa (187/2012).

Instituído pela Lei 4.159/2008, o Nota Legal concede a pessoas físicas e jurídicas crédito de até 30% do ICMS ou do ISS recolhidos pelos estabelecimentos fornecedores ou prestadores para abatimento no IPTU ou IPVA. Segundo a OAB-DF, porém, a portaria 187, ao criar o Fator de Multiplicação para o Cálculo do Crédito, reduz o crédito do contribuinte.

“O artigo 2º da referida portaria criou, com fundamento de validade no Decreto 33.963/12, o índice FMCC que nada mais é do que um fator de redução do crédito. Pela inovação, se o FMCC for igual a um, mantém-se os 30% de crédito até então vigentes, mas quando ele for inferior a um, haverá redução proporcional do crédito do contribuinte.”

Outro ponto questionado pela OAB-DF refere-se à data em que o novo regulamento passaria a vigorar. Pela decreto, os seus efeitos devem ser retroativos a 1º de maio de 2012. Para a OAB-DF, a nova regra é um “artifício inconstitucional do Governo do Distrito Federal para reduzir retroativamente a isenção fiscal concedida aos contribuintes do IPVA e do IPTU que vencerão no início do ano de 2013, o que resultará em aumento ilegítimo da arrecadação tributária”.
Segundo a OAB-DF, o novo decreto delegou à Secretaria de Fazenda do Distrito Federal o poder de definir, com efeitos no passado, o percentual do ICMS ou do ISS a ser concedido como crédito.
 
A Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal desconsiderou o percentual anterior de 30% não apenas para as operações futuras, mas para todas aquelas realizadas a partir de maio de 2012. A nova regra constitui artifício inconstitucional do Governo do Distrito Federal para reduzir retroativamente a isenção fiscal concedida aos contribuintes do IPVA e do IPTU que vencem nas próximas semanas. Segundo os termos do documento, tal iniciativa resultará em aumento ilegítimo da arrecadação tributária.

A presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da OAB-DF, Christiane Pantoja, explica que o decreto viola a Constituição Federal e a Lei Orgânica do DF, que determina a irretroatividade das leis e o respeito à segurança jurídica, aos princípios da boa-fé, da confiança e do direito adquirido. Segundo ela, a alteração trará consequências drásticas ao cidadão, que terá seus créditos reduzidos no abatimento dos impostos (IPTU ou IPVA).

O assunto é de extrema relevância, já que prevê graves repercussões na ordem social e na segurança jurídica. O contribuinte será prejudicado na previsão orçamentária pessoal, sendo surpreendido com o pagamento de um valor maior do que o esperado. É muito importante que a liminar seja deferida para a defesa da garantia constitucional do direito adquirido das pessoas de manter seus créditos na forma da legislação então vigente.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Candidato aprovado para cadastro de reserva tem direito à nomeação

Aprovado para cadastro de reserva tem direito a nomeação

 
A aprovação de candidatos em concurso público para cadastro de reserva tem direito à nomeação se, dentro do prazo de validade do concurso, houver o surgimento de vagas para o cargo disputado. O entendimento foi fixado pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em sua última sessão de julgamento do ano passado.
 
O relator do recurso, ministro Mauro Campbell, afirmou que o candidato reserva tem direito de ser nomeado independentemente dos motivos pelos quais as novas vagas foram abertas: seja em razão da criação de novos cargos por lei, seja em virtude de vacância decorrente de exoneração, demissão, aposentadoria, posse em outro cargo ou morte. O voto do relator foi seguido por unanimidade pela 2ª Turma.
Segundo o ministro Campbell, “a classificação e aprovação do candidato, ainda que fora do número mínimo de vagas previstas no edital do concurso, confere-lhe o direito subjetivo à nomeação para o respectivo cargo se, durante o prazo de validade do concurso, houver o surgimento de novas vagas, desde que aprovado dentro do número máximo de vagas abertas”.
 
A candidata aprovada para cadastro reserva recorreu ao STJ contra decisão do Tribunal de Justiça do Acre. Os desembargadores acreanos decidiram que a nomeação dos candidatos aprovados em cadastro de reserva — fora do número de vagas estipuladas em edital — estaria adstrita ao poder discricionário da Administração Pública. Ou seja, o administrador poderia decidir nomeá-los segundo sua conveniência e oportunidade, ainda que houvesse vacância ou criação de cargos por lei. Na prática, a decisão do TJ do Acre fixava que os aprovados em cadastro reserva têm mera expectativa de direito. Já a 2ª Turma do STJ entendeu que os candidatos têm o direito subjetivo à nomeação.
 
De acordo com o relator do recurso no STJ, o administrador público é obrigado a observar as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000) para a criação e provimento de novos cargos na Administração. Precisa, assim, demonstrar o suporte orçamentário e financeiro necessário para o custeio dos cargos.
Logo, não pode o gestor público alegar que o candidato aprovado e classificado dentro do chamado cadastro de reserva não tem direito à nomeação se as vagas decorrentes da criação legal de cargos novos ou vacância ocorrem no prazo do concurso ao qual se habilitou e foi aprovado. A exceção à regra se dá no caso de o custeio com a folha de pagamentos alcançar os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
 
No caso concreto, contudo, o recurso da candidata foi rejeitado pelos ministros da 2ª Turma. Isso porque, mesmo com o número de vagas criadas para o cargo de auditor da Receita do estado do Acre, a colocação da candidata não seria atingida para sua convocação.
A Lei 2.265/2010 do Acre estabeleceu nova estrutura da carreira para os servidores públicos estaduais da Secretaria da Fazenda e fixou o número de 140 cargos para auditor da Receita Estadual. De acordo com informações prestadas pela Secretaria da Fazenda, 138 cargos foram preenchidos e existem duas vagas a serem supridas. Pela ordem de classificação, a candidata seria a terceira a ser chamada. Por isso, sua colocação não foi atingida para a convocação, o que não lhe dá o direito de ser nomeada.
RMS 37.882

sábado, 5 de janeiro de 2013

Conciliação e Mediação como pilares do novo Judiciário

Transcrevo, na íntegra, artigo do professor André Gomma de Azevedo:
 
Um dos grandes desafios para o Poder Judiciário no século XXI consiste em desafiar posições singularistas de que para cada conflito de interesse só pode haver uma solução correta — a do magistrado, que sendo mantida ou reformada em grau recursal, torna-se a “verdadeira solução” para o caso. A ideia de que o jurisdicionado, quando busca o Poder Judiciário, o faz na ânsia de receber a solução de um terceiro para suas questões vem progressivamente sendo alterada para uma visão de Estado que oriente as partes para que resolvam de forma mais consensual e amigável seus próprios conflitos e, apenas excepcionalmente, como última hipótese, se decidirá em substituição às partes.
Naturalmente, essa noção de substituição e excepcionalidade não se mostra, ao menos no campo teórico, em nada inovadora. Processualistas têm sustentado há quase um século que a jurisdição deve ocupar o campo destinado à atividade secundária de resolução de disputas. Isso porque a jurisdição possui uma propriedade fundamental denominada “substitutividade”. Essa é tida como a atribuição do Estado de substituir a vontade das partes envolvidas no conflito para, quando provocado, definitivamente compor a lide.
 
Desde o início da década de 1990, iniciou-se o estímulo à conciliação por meio de reformas legislativas como política pública de alteração sistêmica do Poder Judiciário. Com o início do Movimento pela Conciliação, do Conselho Nacional de Justiça, em 2006, passou-se a trabalhar a noção de que o Estado precisa preparar o jurisdicionado para adequadamente utilizar o sistema público de resolução de disputas.
Alegoricamente, imagine-se um cirurgião que, ao adentrar uma sala de cirurgia, nota que o paciente está com roupas cotidianas e sujo — não passou pela assepsia usual a essa prática. O mesmo, com adaptações necessárias, foi identificado na prática brasileira da conciliação. Frequentemente, partes chegavam à conciliação sem a adequada preparação: pelo conciliador, pela empresa, ou mesmo pela parte pessoa física. O “cirurgião” recebia apenas breves apontamentos teóricos de como “operar” e os “pacientes”, sem nenhuma orientação de como se prepararem. O tempo da “cirurgia” era definido pela pauta do cirurgião e não pela complexidade do caso. Não era sem motivo a patente insatisfação com a conciliação no final do século XX e nos primeiros anos do século atual.
 
O ano de 2012, no âmbito da conciliação, foi marcado pela preparação de conciliadores e prepostos para uma atuação mais profissional na conciliação e na mediação. Merecem destaque as seguintes iniciativas: i) o lançamento, pela Secretaria de Reforma do Judiciário e pelo Conselho Nacional de Justiça, da Escola Nacional de Mediação e Conciliação – Enam; ii) a formação de instrutores em mediação judicial e conciliação pela Enam/CNJ-SRJ; iii) os cursos de capacitação de prepostos de empresas; e iv) a adoção de meios de Resolução de Disputas Online (RDOs) por empresas que, por intermédio de atendentes treinados em técnicas de negociação e mediação, lograram índices nunca antes obtidos.
 
i) A Escola Nacional de Mediação e Conciliação – Enam
Pouco tempo após o Movimento pela Conciliação ser lançado, em 2006, a Secretaria de Reforma do Judiciário, do Ministério da Justiça, apoiou a iniciativa. Construiu-se, então, uma das mais importantes parcerias entre os Poderes Executivo e Judiciário para a implantação de novas forma de solução de disputas. Desde então, tem-se trabalhado com a premissa de que é possível uma abordagem mais pluralista dentro do próprio Poder Judiciário, aceitando-se que podem existir diversas respostas concomitantemente corretas (e legítimas) para uma mesma questão levada a juízo. Nessa hipótese, cabe às partes construírem a solução para suas próprias questões e, assim, encontrarem a resposta que melhor se adeque ao seu contexto fático. Dessa forma, passa-se a buscar o resgate, sempre que possível, do relacionamento social pré-existente ao conflito. Aos poucos, abandona-se a perspectiva de que, no Poder Judiciário, as partes estão em lados opostos, para se adotar a visão de que podem estar do mesmo lado.
Nesse contexto, com o intuito de criar conjuntamente um centro de difusão de conhecimento e prática de métodos consensuais de resolução de conflitos, criou-se a Escola Nacional de Mediação e Conciliação - Enam, cuja atuação se dará em três eixos. São eles: i) capacitação de operadores do Direito, membros da academia e da sociedade civil; ii) realização de seminários e outros eventos de difusão do conhecimento; e iii) promoção de projetos e atividades de ensino e pesquisa.
A Enam, dirigida pelo conselheiro José Roberto Neves Amorim, do Conselho Nacional de Justiça, e pelo secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Caetano, do Ministério da Justiça, começa os seus trabalhos com um ambicioso objetivo: melhorar a percepção do jurisdicionado em relação ao Poder Judiciário e desfazer a visão de que este consiste exclusivamente em uma instituição de sentenças. Assim, adota-se progressivamente a perspectiva de que o Poder Judiciário é essencialmente um órgão de aproximação de pessoas em conflito — ou um “hospital de relações sociais”.
 
ii) A formação de novos instrutores em mediação judicial e conciliação pela Enam/CNJ-SRJ
Após a identificação do reduzido número de instrutores em mediação e conciliação no país, o CNJ e a SRJ envidaram esforços para multiplicar o número de instrutores em mediação e conciliação no Brasil, visando a formação de efetivos facilitadores que desempenhem suas funções satisfatoriamente para a população. As aulas foram ministradas para servidores dos tribunais de Justiça e voluntários, com a condição de já possuírem ampla experiência em mediação. Os novos instrutores, para receberem seus certificados, devem lecionar cinco cursos básicos de mediação — sem custo aos tribunais ou aos participantes — e são também avaliados pelos seus próprios alunos.
 
iii) Cursos de capacitação de prepostos de empresas
Seguindo preocupação de melhor preparar os usuários para utilizar adequadamente o sistema público de resolução de disputas — ou, como indicado acima, “preparar o paciente para a cirurgia” —, diversos tribunais, dentre os quais o TJ-DF, o TJ-RJ e o TJ-SP, iniciaram treinamento de capacitação de prepostos. Nesses treinamentos, advogados e diretores jurídicos e financeiros das empresas são estimulados a identificar falhas comuns  na atuação cotidiana em conciliações, dentre as quais destacam-se: a) desconsiderar o custo de imagem que uma conciliação mal administrada pode gerar para a empresa. Muitas empresas despendem significativos recursos para captar novos clientes, mas não consideram o custo de perder um cliente em razão de uma atuação descuidada do preposto na conciliação. Nesses treinamentos, estimula-se as empresas a considerarem o custo da captação do novo cliente (gasto com propaganda e marketing dividido pelo número de novos clientes por ano) ao planejarem como será a atuação dos seus prepostos na conciliação; b) negociar na conciliação como se estivesse em audiência de instrução. No que concerne à adequada compreensão das partes e advogados quanto às características intrínsecas da conciliação, cumpre registrar que há uma prática profissional específica em processos autocompositivos. Na conciliação, a adoção de uma postura do preposto deve ser humanizada, zelosa e solucionadora, sob pena do outro interessado/parte não se engajar de forma plena no processo de resolução de problemas que, em essência, é o trabalho da conciliação. A compreensão de que a conciliação seria uma instrução “disfarçada” somente contribui para a imprópria condução da conciliação e, por conseguinte, baixa resolutividade, excessiva litigiosidade e, naturalmente, insatisfação das partes com seu desenvolvimento; c) tentar vencer o conflito. Ao tratar o conflito como uma dinâmica na qual um dos envolvidos pode sair como claro vencedor, transformando o outro em patente perdedor, frequentemente as partes envolvidas se engajam em condutas competitivas visando mais do que vencer, incutir a perda ao outro. Como resultado, ao menos parcialmente, ambos tendem a perder e inadvertidamente abdicam de diversos interesses que possuem, como a manutenção do relacionamento social pré-existente com a outra parte ou a resolução dos pontos controvertidos como objetivamente apresentados no início do conflito, não em razão de um acirramento do conflito que se expandiu tornando-se “independente de suas causas iniciais”. A percepção, em um determinado conflito, de que é necessário que a parte “vença a outra” — e não “objetivamente resolva os pontos em relação aos quais as partes divergem” — faz com que as partes envidem esforços para prejudicar uma à outra e não necessariamente apenas resolvam os pontos controvertidos; d) perceber a conciliação como alternativa. A experiência dos últimos 30 anos tem mostrado que o comprometimento com a forma de resolução de disputa adotada (com respectivas características) influi significativamente no adequado desenvolvimento do processo e, por conseguinte, na satisfação das partes com a solução alcançada. Empresas e escritórios de advocacia que tratam a conciliação ou mediação como uma “forma secundária” de resolução de disputas tendem a não investir em treinamento de seus advogados e administradores. Como consequência, há o exercício intuitivo desses processos, que em regra se resume a aplicar a conduta profissional característica do processo judicial à mediação ou à conciliação. Naturalmente, como visto acima, essa prática intuitiva, em regra, leva ao desvirtuamento da conciliação e a consequentes custos mais elevados (ou redução dos níveis de satisfação dos usuários).
Merece destaque que, após o treinamento de prepostos e advogados no TJ-DF, os índices de conciliação subiram em mais de 120%. Empresas como Vivo, Tim e Casas Bahia receberam treinamento e o Núcleo Permanente de Mediação e Conciliação ofereceu esse treinamento sem nenhum custo aos participantes.
 
iv) o estímulo à adoção de meios de Resolução de Disputas Online (RDOs) por empresas, por intermédio de atendentes treinados em técnicas de negociação e mediação
A empresa de telecomunicações SKY Brasil Serviços Ltda. recebeu o prêmio “Conciliar é legal” do Conselho Nacional de Justiça em razão do desenvolvimento de um projeto de prevenção de litígios. Trata-se de um totem de negociação direta, informalmente chamado de “totem de conciliação”, ao qual se redireciona uma demanda que originalmente seria proposta em um juizado especial para uma videoconferência com um atendente treinado em técnicas de negociação e mediação. Com isso, a referida empresa buscou reduzir a perda de clientes em razão de demandas judiciais propostas. O projeto iniciado no primeiro semestre deste ano até o presente momento alcançou índices de acordo de quase 100%. Da referida prática, merece destaque a preocupação da Sky Brasil de manter clientes ao final do processo de resolução de disputas e zelar pela estratégia de marketing da empresa, cuja preocupação de “ter os clientes mais satisfeitos” tem se estendido do momento da captação de novos clientes até o direcionamento de processos de resolução de disputa. Ademais, como indicado acima, consta implicitamente a política institucional da citada empresa de que a conciliação seja o principal meio de resolução de disputas, deixando-se o processo judicial como meio excepcional.
 
Com muito bem indicado pelo conselheiro Neves Amorim, o Poder Judiciário tem passado por mudanças profundas quanto à sua essência, deixando de ser um espaço desumanizado de prolação de sentenças para ser um centro vivo de soluções reais para o jurisdicionado. Nota-se a formação de um “Judiciário 2.0”, que correlaciona o conceito de acesso à Justiça não com o acesso à norma positivada aplicada ao caso concreto — o que o manteria significativamente singularista —, mas com a efetiva satisfação do jurisdicionado, dentro de parâmetros realizáveis, com o processo de resolução de disputas. Dessa forma, a própria concepção de Direito é costurada com uma abordagem mais pluralista. Esse “Judiciário 2.0” está tão somente adequando-se à essa nova concepção de Direito apresentada contemporaneamente por diversos autores, dos quais se destaca Boaventura de Souza Santos, segundo o qual “concebe-se o direito como o conjunto de processos regularizados e de princípios normativos, considerados justificáveis num dado grupo, que contribuem para a identificação e prevenção de litígios e para a resolução destes através de um discurso argumentativo, de amplitude variável, apoiado ou não pela força organizada”[1].
[1] SANTOS, Boaventura de Sousa. O discurso e o poder; ensaio sobre a sociologia da retórica jurídica. Porto Alegre : Fabris, 1988, p. 72.
André Gomma de Azevedo é juiz de Direito na Bahia, pesquisador associado da Universidade de Brasília e membro do Comitê Gestor da Conciliação do Conselho Nacional de Justiça.