quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Especialistas discutem o futuro do Judiciário

Especialistas confrontaram leituras otimistas e pessimistas sobre o futuro da justiça brasileira no V Seminário Justiça em Números, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na manhã desta terça-feira (30/10) em Brasília.
 
 O crescimento do volume de processos em tramitação e da classe média brasileira opôs as visões do professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Aurélio Wander Bastos e da pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio) Tania Rangel, expositores do Painel “Políticas Judiciárias”, presidido pelo conselheiro José Lucio Munhoz.
 
Enquanto o professor da UFRJ acredita que o excesso de processos pode comprometer o funcionamento da justiça brasileira, a pesquisadora da FGV-Rio aponta a criação do CNJ como alternativa para os atuais e futuros desafios do Poder Judiciário. A discussão em torno da capacidade do Judiciário de responder as demandas da sociedade foi sugerida pela debatedora do painel, a diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, Janaína Penalva, que citou a necessidade de inclusão social e da sustentabilidade como questões a serem enfrentadas pela Justiça.
 
Bastos propôs, da Física, o conceito de “entropia” (grau de desorganização de um sistema) para descrever sua perspectiva de inviabilidade da Justiça diante do atual volume de processos sem solução nos tribunais brasileiros. “Caminhamos para uma situação entrópica grave em São Paulo e enfrentável no resto do País”, disse Bastos. Segundo o professor, o estoque de processos dos tribunais paulistas representa 40% do estoque do País. “Se tivéssemos de zerar o estoque este ano com o número atual de magistrados, cada um teria de julgar 25 mil processos”, afirmou.
 
A terceira painelista e secretária Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça, Juliana Pereira da Silva, dimensionou a demanda dos consumidores que buscam o órgão para resolver um conflito, no contexto da expansão da classe média. Desde a criação do órgão, em maio deste ano, 7,5 milhões de consumidores procuraram a Secretaria. Mensalmente, 150 mil consumidores apresentam queixas sobre os produtos adquiridos ou serviços prestados. Para resolver o problema, a secretária propôs mais parcerias entre as instituições e cobrou mais participação do setor privado.
“Nove em cada dez consumidores que procuram a Secretaria já tentaram uma solução com as empresas de que se queixam”, disse.
 
A pesquisadora da FGV-Rio Tania Rangel defendeu uma evolução democratizante das instituições no Brasil que ocorreria desde a concessão da autonomia administrativa e financeira pela Constituição Federal de 1988. De acordo com Tania Rangel, a criação do CNJ faz parte desse processo na medida em que cria políticas públicas judiciais que servem não só ao Judiciário, como ao conjunto da sociedade. A pesquisadora citou a política de combate ao nepotismo, a política pró-conciliação e a criação de bancos de dados que facilitam a aplicação da lei.
“O combate ao nepotismo, política pública criada pelo Conselho Nacional de Justiça, serviu de modelo para outros poderes da República e revela a importância do CNJ para a sociedade”, afirmou.
Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Órgãos federais e estaduais são os maiores litigantes da Justiça

Os setores públicos da esfera federal e dos estados foram responsáveis por 39,26% dos processos que chegaram à Justiça de primeiro grau e aos Juizados Especiais entre janeiro e outubro do ano passado. É o que revela a pesquisa 100 Maiores Litigantes – 2012, divulgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na manhã desta segunda-feira (29/10), pelo conselheiro José Guilherme Vasi Werner, em entrevista coletiva na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj). Momentos antes, o conselheiro havia apresentado o estudo para magistrados que participavam do Seminário Brasil–Portugal, realizado pela Emerj.
 
De acordo com Werner, o setor público e os bancos são os setores que lideram a lista dos maiores litigantes. “O setor público federal e os bancos respondem sozinhos por 76% dos processos em tramitação e isso é muito significativo, sendo objeto de todas as nossas preocupações e diálogos institucionais”, explicou o conselheiro.
 
Esta é a segunda vez que o CNJ elabora a relação dos 100 maiores litigantes do Poder Judiciário brasileiro. A primeira lista foi divulgada no ano passado e teve como foco o estoque de processos em curso no Judiciário até 2010. Já esta edição analisa apenas as novas ações judiciais, ingressadas na primeira instância da Justiça e nos juizados especiais.
Segundo esta edição, o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) continua a ocupar o primeiro lugar no ranking das organizações públicas e privadas com mais processos no Judiciário Trabalhista, Federal e dos estados. O órgão respondeu por 4,38% das ações que ingressaram nesses três ramos da Justiça nos 10 primeiros meses do ano passado.
Na sequência, vem a BV Financeira (1,51%), o município de Manaus (1,32%), a Fazenda Nacional (1,20%), o estado do Rio Grande do Sul (1,17%), a União (1,16%), os municípios de Santa Catarina (1,13%), o Banco Bradesco (0,99%), a Caixa Econômica Federal (0,95%) e o Banco Itaucard S/A (0,85%), respectivamente ocupando da segunda à décima posição.
 
Para o conselheiro, a identificação dos setores que mais litigam ajudará o Poder Judiciário a elaborar políticas voltadas para a redução dos processos. “É uma tarefa do CNJ tentar discutir nacionalmente com as empresas que compõem o setor público e assim construir algum tipo de diálogo para evitarmos que esses processos continuem desaguando no Judiciário”, afirmou o conselheiro.
 
Setores – Na divisão por setores, a pesquisa mostra que o setor público foi o que mais figurou na Justiça Federal, na do Trabalho e na dos estados, com 12,14% do total de casos novos registrados nesses três ramos, entre janeiro e outubro de 2011. Depois, encontram-se os bancos (10,88%), o setor público municipal (6,88%), o setor público estadual (3,75%), a telefonia (1,84%), o comércio (0,81%), a área de seguros/previdência (0,74%), a indústria (0,63%), os serviços (0,53%) e os conselhos profissionais (0,32%).
 
A segunda edição dos 100 Maiores Litigantes também traz a relação das organizações com mais processos por ramo do Judiciário. No âmbito estadual, a pesquisa mostra que os bancos e o setor público (municipal, estadual e federal) foram responsáveis por 34,4% dos processos novos que chegaram à primeira instância entre janeiro e outubro de 201. Nos Juizados Especiais, os bancos e o setor de telefonia figuram como os setores mais litigantes da Justiça Estadual, respectivamente com 14,7% e 8,3% do total de processos ingressados no período.
 
Na Justiça Federal, o setor público federal e os bancos também apresentaram os maiores percentuais de processos novos, respectivamente com 68,8% e 13,4% na primeira instância e 92,3% e 7,2% nos juizados especiais. Nesse segmento, duas instituições se destacaram por concentrar boa parte das novas ações movidas nos 10 primeiros meses do ano passado: o INSS (com 34% de ações no primeiro grau e 79% nos juizados especiais) e a Caixa Econômica Federal (com 13% dos processos no primeiro grau e 7% nos juizados especiais).
 
No Judiciário Trabalhista, a indústria foi o setor que mais respondeu pelas ações movidas entre janeiro e outubro de 2011.
Agência CNJ de Notícias, com informações do TJRJ
 

sábado, 27 de outubro de 2012

VI Encontro Nacional do Judiciário fixará meta de combate à corrupção e à improbidade administrativa

Os presidentes dos 91 tribunais brasileiros vão fixar nos próximos dias 5 e 6 de novembro, durante o VI Encontro Nacional, meta de combate à corrupção e à improbidade administrativa para ser cumprida por todo o Judiciário do País nos próximos anos.
 
 Para o conselheiro do CNJ Gilberto Martins, a definição dessa meta será um marco para a Justiça brasileira. “Se o Judiciário começar a julgar ações de improbidade e corrupção de forma mais eficiente, mais célere, a sociedade passará a confiar mais nas instituições políticas e na própria Justiça, que está dando uma resposta aos anseios da população”, destacou.
 
O conselheiro coordenou o Seminário Nacional de Probidade Administrativa realizado no início de junho pelo CNJ e que resultou na proposição do estabelecimento de uma meta nacional para enfrentar o problema. Segundo Martins, pesquisa realizada com os tribunais demonstrou que essas ações não têm sido tratadas de forma eficiente pelo Judiciário.
 
Segundo o estudo, em 2011 houve 256 julgamentos definitivos com base na Lei n. 8.429 (Lei de Improbidade), 251 deles pela Justiça dos estados. Ao final do ano, havia 4.250 processos de improbidade tramitando na Justiça Federal e 14.011 nos tribunais estaduais. “Temos de fazer alguma coisa para mudar esse panorama, que é desastroso para o Judiciário”, salienta Martins.
 
Com base nas conclusões obtidas no Seminário, os tribunais brasileiros encaminharam ao CNJ 62 propostas de metas a serem estabelecidas no intuito de acelerar o julgamento de crimes de improbidade e corrupção no País. Dessas, os gestores e diretores de planejamento estratégico dos tribunais selecionaram 11, durante a reunião preparatória para o encontro nacional, realizada na última semana em Brasília.
Entre as medidas selecionadas está a de garantir que os tribunais superiores julguem todos os processos distribuídos, em grau de recurso, até 31 de dezembro de 2011. Outra proposta é a criação de um “índice de percepções de corrupção” e também a publicação de relatórios anuais que demonstrem por estado e segmento da Justiça o grau em que a corrupção é percebida pela sociedade. O dado possibilitaria a fixação de metas futuras para os tribunais visando reduzir esse grau de percepção da corrupção em relação ao Judiciário.

Além dessas medidas, os gestores sugeriram a capacitação de servidores em técnicas de diagnóstico e combate à corrupção e à improbidade, além do estabelecimento de medidas capazes de aprimorar a alimentação do Cadastro Nacionais de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade, coordenado pelo CNJ.
 
Todas essas propostas servirão de base para que os presidentes das Cortes definam o objetivo que deverá ser perseguido por todo o Judiciário nos próximos anos. “O tratamento mais eficiente dessas ações pelo Estado e pelo Poder Judiciário pode garantir a retirada do cenário político dos agentes autores de crimes contra a administração pública”, conclui Gilberto Martins.
 
O VI Encontro Nacional é voltado para presidentes, vice-presidentes e corregedores de todos os ramos da Justiça brasileira. Para participar é preciso se inscrever pela página do CNJ, até a próxima segunda-feira (29/10).

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

CJF aprova alvará de soltura eletrônico

Foi aprovado pelo Colegiado do Conselho da Justiça Federal a implantação do sistema de alvará de soltura eletrônico, que será disponibilizado para toda a Justiça Federal. O sistema consiste no envio de documento com assinatura eletrônica do juiz responsável diretamente para o sistema penitenciário onde se encontra preso o réu.
 
O corregedor-geral da Justiça Federal, ministro João Otávio de Noronha, explica que hoje, para soltar um preso, o juiz tem de enviar um oficial de justiça até o presídio para entregar pessoalmente o mandado à autoridade penitenciária. Em muitos casos, a penitenciária fica distante da vara federal, o que pode resultar em muito tempo gasto no deslocamento.
 
O juiz auxiliar da Corregedoria-Geral, Jorge Costa, esclarece ainda que a Justiça Federal possui convênios com os estados para manutenção de alas no sistema prisional estadual destinadas aos réus presos por determinação de juízes federais. Em decorrência disso, as ordens de soltura podem demorar mais de um dia para serem cumpridas, já que normalmente essas ordens são encaminhadas às secretarias de segurança pública estaduais para checagem dos dados.
 
De acordo com Jorge Costa, uma experiência exitosa de convênio entre a Justiça Federal em Minas Gerais e o Tribunal de Justiça daquele estado tem permitido o cumprimento das decisões de soltura com muito mais celeridade e efetividade em relação aos réus presos naquele estado. Ele informa que a proposta de solicitar ao TJ-MG a cessão do sistema para utilização em toda a Justiça Federal nasceu no Fórum de Corregedores da Justiça Federal, presidido pelo ministro corregedor-geral.
 
O plano de implantação do sistema, segundo o juiz auxiliar, contempla o desenvolvimento de um projeto piloto no CJF, aproveitando a expertise do TJ-MG. A ideia é que inicialmente esse piloto seja implantado nas quatro penitenciárias federais de segurança máxima existentes no país, que estão sob a custódia de juízes federais. Em seguida, a intenção é implantar o sistema em toda a Justiça Federal,com a vantagem de poder integrá-lo ao processo judicial eletrônico (PJe), com o qual é compatível. Com informações da Assessoria de Imprensa do CJF.
Revista Consultor Jurídico, 23 de outubro de 2012.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Novos métodos de solução de conflitos

A enorme quantidade de processos atualmente à espera de uma decisão judicial impõe ao Poder Judiciário o desafio de criar e promover métodos mais eficazes de solução de conflitos. Foi o que defendeu o conselheiro José Roberto Neves Amorim, coordenador do Movimento Conciliar é Legal, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), durante a abertura do II Seminário sobre a Conciliação que acontece nesta segunda-feira (22/10), no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG).
 
O Seminário faz parte dos preparativos para a Semana Nacional da Conciliação, cuja 7ª edição ocorrerá em todo o Brasil, de 7 a 14 de novembro, com o apoio do CNJ. De acordo com Neves Amorim, esforços para estimular a solução consensual dos processos são necessários no Brasil. É que atualmente tramitam no Poder Judiciário brasileiro mais de 80 milhões de processos. “Com esse número, não podemos pensar apenas em soluções processuais. Temos de pensar em uma nova Justiça, moderna e cidadã. Temos de partir para métodos mais harmonizadores. A conciliação e a mediação podem ser uma solução”, afirmou o conselheiro.
 
Presente à abertura do Seminário, o governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia, disse que parte considerável das ações em curso na Justiça envolve órgãos governamentais e, na grande maioria dos casos, embora benéfica para o próprio poder público, a conciliação não é possível por restrições da legislação em vigor. “Como representante do Poder Executivo, lamento muito que a maior parte dessas ações envolva o poder público. Mas a legislação, ao estabelecer a indisponibilidade do bem público, acabou por impor limites à conciliação”, afirmou.
 
Nesse sentido, o governador pediu aos representantes do CNJ uma atuação mais contundente de forma a mudar esse quadro. “Naturalmente, superar esses tumores é grande atributo. No entanto, faço votos de que o CNJ consiga mudar os rumos ou mesmo a legislação, para que possamos valorizar não a contenda, mas a conciliação”, defendeu.
 
Para o presidente do TJMG, desembargador Herculano Rodrigues, investir na conciliação é imprescindível, já que esse método tem se mostrado capaz de proporcionar resposta rápida e satisfatória à sociedade. De acordo com ele, essa é uma das razões pelas quais a corte mineira vem ao longo dos anos apostando cada vez mais nessa via de solução de litígios. Atualmente são mais de 20 postos de conciliação, instalados pelo tribunal em 20 comarcas da capital e do interior.
“O Tribunal de Justiça mineiro tem uma trajetória que evidencia a atenção dada a esse tema tão relevante”, afirmou o presidente do TJMG, destacando que a conciliação tem contribuído também para a maior acessibilidade à Justiça.
 
“É que a conciliação envolve posturas inclusivas. Ela também representa um passo na evolução humana e social já que as partes, em vez de delegarem à outra pessoa a decisão sobre seus problemas, passam a fazer escolhas de forma madura e salutar. Com isso, temos respostas mais rápidas e satisfatórias para a sociedade”, afirmou.
Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Lei Maria da Penha é aplicada para enquadrar irmão agressor

Apesar de as agressões de maridos e namorados serem mais conhecidas, a Lei Maria da Penha pode contemplar outros graus de parentesco. A 5ª Turma do STJ considerou que a ameaça de agressão praticada por um homem em Brasília contra a irmã deve ser enquadrada na Lei Maria da Penha. O caso aconteceu em agosto de 2009.
O agressor se dirigiu à casa da irmã e atirou pedras contra o carro dela, além de enviar mensagens por celular a xingando e ameaçando agredi-la. O irmão queria assumir o controle da pensão recebida pela mãe, que estava sob responsabilidade da irmã. Ele ainda não foi condenado.
O Ministério Público do Distrito Federal, responsável pela acusação, havia entrado com um recurso especial alegando que o caso deveria ser encaminhado aos juizados especiais criminais, por se tratar de um conflito "entre irmãos" , que não apresentava "indício de que envolvesse motivação de gênero".
Mas o STJ decidiu que cabia a aplicação da Lei Maria da Penha, argumentando que "a legislação teve o intuito de proteger a mulher da violência doméstica e familiar", acrescentando "ser desnecessário configurar a coabitação entre eles".
Em decisão unânime, os ministros consideraram que, embora a Lei Maria da Penha tenha sido editada com o objetivo de coibir com mais rigor a violência contra a mulher no âmbito doméstico, o acréscimo de pena introduzido no parágrafo 9º do artigo 129 do Código Penal pode perfeitamente ser aplicado em casos nos quais a vítima de agressão seja homem.
O artigo 129 descreve o crime de lesão corporal como ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, estabelecendo a pena de detenção de três meses a um ano. Se a violência ocorre no ambiente doméstico (parágrafo 9º), a punição é mais grave. A Lei Maria da Penha determinou que, nesses casos, a pena passasse a ser de três meses a três anos, contra seis meses a um ano anteriormente.
O relator do recurso, ministro Jorge Mussi, disse que a Lei Maria da Penha foi introduzida no ordenamento jurídico para tutelar as desigualdades encontradas nas relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, e embora tenha dado enfoque à mulher, na maioria das vezes em desvantagem física frente ao homem, não se esqueceu dos demais agentes dessas relações que também se encontram em situaçãode vulnerabilidade.
Como exemplo, o ministro citou o caso de agressões domésticas contra portadores de deficiência (parágrafo 11), circunstância que aumenta em um terço a pena prevista no parágrafo 9º do artigo 129 também conforme modificação introduzida pela Lei 11.340. (RHC nº 27622).

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Domínio do fato X Ônus da prova

A respeito do assunto, transcrevo artigo do penalista, desembargador Ali Mazloum:

Domínio do fato não exime quem acusa do ônus da prova

No julgamento da ação penal 470 – cognominada de mensalão – tem sido recorrente a invocação da teoria do domínio do fato. O que vem a ser isso? Praticado um crime, surge o desafio de estabelecer com precisão a responsabilidade, para que inocentes não venham a ser condenados ou culpados absolvidos. A maioria dos delitos tem natureza monossubjetiva, ou seja, podem ser praticados por uma única pessoa. É o caso do homicídio. Outros há em que se exige a presença de mais de um agente. São os plurissubjetivos: a bigamia é um bom exemplo.
 
As dificuldades de se divisar a participação ou o modus operandi de cada agente surgem no primeiro caso, vale dizer quando duas ou mais pessoas agem com unidade de desígnios para a realização de um determinado tipo penal monossubjetivo.
No concurso de pessoas, enquanto um realiza o verbo núcleo do tipo, como matar, subtrair, o outro presta auxílio: segurar a vítima enquanto o comparsa desfere facadas mortais. Ordinariamente, só é autor quem realiza o verbo nuclear do crime, sendo considerado partícipe quem de outra maneira contribui para a sua realização.
O primeiro tem pena mais grave que o segundo, daí a importância de se conhecer a diferença entre coautoria e mera participação.
 
O Código Penal resolve a dilemacidade do concurso de pessoas no artigo 29: “quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.” Essa é a regra regente, da qual, somadas a outras, extrai-se a possibilidade da aplicação da teoria do domínio do fato em nosso ordenamento jurídico.
 
Essa refinada teoria alemã supre, no pensamento de Roxin, a hipótese do autor mediato, aquele que não aparece e normalmente vale-se de terceira pessoa para a prática delitiva. Imagine-se o médico que, pretendendo matar o paciente diabético, determina à enfermeira a aplicação letal de glicose. Apenas o médico tinha conhecimento da doença e apenas ele tem o domínio funcional do fato: impedir que a glicose seja efetivamente ministrada. Portanto, tem domínio do fato quem pode fazer cessar a atividade criminosa ou quem domina a vontade do executor do crime.
 
Por conseguinte, o autor imediato do delito é quem o executa, aquele que seguiu as ordens do mandante realizando o verbo nuclear do tipo penal. Este efetua disparos de arma de fogo contra a vítima, visando matá-la, por determinação daquele. O mandante não aparece na cena do crime, não realiza o ato de matar, mas por ter o domínio funcional do fato pode impedir sua ocorrência.
Questão interessante atine ao aspecto da prova. Como e quando o autor mediato pode ser responsabilizado pelo delito?
 
Da mesma forma que se exigem provas para condenar o executor, devem existir provas também contra o mandante. A circunstância de ter o acusado o domínio do fato não exime quem o acusa do ônus de provar a acusação. Nosso sistema processual penal, na avaliação da prova, adota o sistema do livre convencimento motivado, exigindo do magistrado decidir a causa de acordo com sua livre convicção, desde que fundamentada em elementos constantes dos autos.
 
Neste sentido, “prova” seria a soma dos fatos produtores da convicção, o que pode se dar até mesmo por meios indiciários, analisados em conjunto, formando um quadro probatório robusto. A lei estabelece que indício é a circunstância conhecida e provada que, tendo relação com o fato que se quer provar, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra. O método indutivo pretende extrair uma regra geral a partir da recorrência de determinadas circunstâncias particulares. Figurativamente, agente com faca em punho perto do corpo da vítima pode ser, prima facie, o assassino.
 
Percebe-se que a “teoria do domínio do fato” também requisita, ao menos, indícios para que se possa vincular o mandante ao crime realizado pelo executor. Indícios, porém, não suplantam indigência probatória. Inadmite-se presumir responsabilidades ou aplicar regras da experiência em substituição à prova. Não é na cabeça do juiz, nem da opinião pública ou da “opinião publicitária”, que esses indícios devem coeexistir, mas, sim, no bojo do processo criminal. Dali é que devem ser hauridos. Lidar com indícios, como se vê, requer muita cautela, pois nem sempre onde há fumaça há fogo.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Proteção dos direitos da infância e da juventude


O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e representantes do governo federal, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e da Defensoria Pública firmarão acordo nesta terça-feira (9/10) para proteger os direitos das crianças e dos adolescentes. O objetivo do acordo é pautar e coordenar as ações dos poderes Executivo e Judiciário em torno de quatro eixos de atuação: estímulo à convivência familiar, combate à violência sexual contra crianças e adolescentes, melhora do sistema socioeducativo e erradicação do trabalho infantil. Pelo Poder Judiciário, assinará o documento o presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Ayres Britto.
 
A solenidade está prevista para começar às 10 horas, no Plenário do CNJ. Estão confirmadas as presenças da ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, principal interlocutora do Poder Executivo federal na elaboração do pacto, da ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, e do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
Chamado de “Carta de Estratégias em Defesa da Proteção Integral dos Direitos da Criança e do Adolescente”, o termo também propõe ampliar para além do âmbito do Estado o esforço de dar efetividade aos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes. Por isso convoca outros atores políticos, como a sociedade e a família, conforme estabelecido no artigo 227 da Constituição Federal, a participar da mobilização.
“A assinatura da Carta consolida as ações que já vinham sendo implementadas e lança outros desafios para que crianças e adolescentes, enfim, ostentem, no âmbito do Poder Judiciário, a prioridade absoluta que lhes foi constitucionalmente outorgada”, afirma a juíza auxiliar da Presidência do Conselho Cristiana Cordeiro.
 
Convivência familiar – A Carta prevê controle mais efetivo dos adolescentes acolhidos, com o registro dos jovens no Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA). Também prevê medidas como a reavaliação periódica das medidas de acolhimento pela Justiça, além do estímulo à reinserção dos adolescentes acolhidos, pela convivência familiar e comunitária, educação e capacitação profissional.
 
Violência sexual – O documento também trata de um conjunto de ações para combater a violência sexual contra crianças e adolescentes. A prevenção dos crimes, o julgamento e a punição aos culpados são as propostas que os órgãos deverão encampar para assegurar que a parte mais jovem da população esteja protegida de “toda forma de exploração, violência, crueldade e opressão”, conforme a Constituição.

Sistema socioeducativo – As medidas relacionadas aos adolescentes em conflito com a lei abrangem desde o fortalecimento da aplicação da medida socioeducativa mais branda (meio aberto) até o acompanhamento do jovem que já cumpriu a medida mais grave (internação). Passam pela reavaliação judicial dos casos de internação provisória e pela criação de regimento interno nas unidades de internação e semiliberdade.
 
Trabalho infantil – A estratégia do acordo para erradicar o trabalho infantil inclui a publicização do tema com audiências públicas e campanhas institucionais. A ideia é reverter o quadro de aceitação do trabalho infantil por parte da sociedade. Também se prevê intensificar a fiscalização e melhorar o atendimento dos casos de trabalho infantil.

“Desde a sua criação, o CNJ tem desempenhado relevante papel nas questões da infância e juventude, por meio de campanhas, projetos, recomendações e resoluções. Em nenhuma outra época da história do Judiciário, houve tanta visibilidade para essa área peculiar da administração da Justiça, que cuida da parcela da população que mais necessita de proteção e cuidado”, diz a juíza auxiliar da Presidência do Conselho Cristiana Cordeiro.

Além do ministro Ayres Britto, firmam o documento a ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo; da Saúde, Alexandre Padilha; do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello; da Educação, Aloízio Mercadante; e do Trabalho e Emprego, Brizola Neto. Também assinam pelo CNMP o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e a presidenta do Conselho Nacional dos Defensores Públicos Gerais, Norma Brandão Lavenère Machado.
Agência CNJ de Notícias

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A prática da conciliação ganha força do Judiciário brasileiro

O coordenador do Movimento Gestor pela Conciliação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conselheiro José Roberto Neves Amorim, costuma abrir reuniões e workshops sobre o tema deixando clara a força que tem a conciliação para o Judiciário. “O Judiciário brasileiro não funciona apenas para litigar, não vive só de litígios”, afirma. Ao longo desses 14 meses em que integra o Conselho, Neves Amorim tem pregado com iniciativas diversas de aperfeiçoamento de magistrados e servidores do Judiciário a importância da conciliação para o País. “A Justiça fica mais aberta para a população, melhora o atendimento aos jurisdicionados e o estoque de processos existentes nos tribunais desafoga consideravelmente”, enfatiza.
Apesar disso, o conselheiro reconhece se tratar de uma prática que, apesar de exitosa, precisa ser intensificada, por representar mudança profunda no modo de pensar dos brasileiros. “Não é fácil, porque a conciliação de certa forma reflete um modo de ser da própria sociedade, que tem sido orientada a litigar desde décadas passadas”, costuma afirmar. No momento, atarefado com os preparativos para a VII edição da Semana Nacional da Conciliação, que será realizada de 7 a 14 de novembro, o conselheiro tem expectativa de que o evento repita ou supere os bons índices das edições anteriores. Na entrevista abaixo, ele relata como têm sido as várias experiências observadas durante os mutirões realizados nos estados brasileiros e os motivos pelos quais acha que a prática é, hoje, fundamental.
 
Como o sr. vê o crescimento e a disseminação da conciliação no Judiciário?
A conciliação é uma prática que veio para ficar. É uma condição de pacificação social necessária e definitiva para o Judiciário brasileiro. Entre as várias vantagens da prática de solução consensuada de conflitos, podemos destacar o fato de a conciliação deixar a Justiça mais aberta para a população, melhorar o atendimento aos jurisdicionados e desafogar o estoque de processos existente nos tribunais.
 
Desde 2010, com a Resolução n. 125 do CNJ, a pacificação de conflitos por meio da conciliação passou a ser uma política nacional do Judiciário. A seu ver, a política tem sido bem implantada pelos tribunais?
Sim, embora as ações tenham sido ampliadas a cada ano. Tanto a administração dos tribunais como magistrados e servidores já perceberam que a conciliação contribui para a redução dos processos e dos conflitos como um todo. Temos notado o grau de engajamento de muitos magistrados na implantação da Resolução n. 125/2010 e a progressiva implantação de diversos centros de conciliação em todo o País.
 
Há uma boa expectativa em relação à próxima Semana Nacional da Conciliação?
Claro, até porque os bons números obtidos nas conciliações formalizadas durante as últimas semanas revelam que a conciliação precisa ser disseminada muito mais, já que ajuda a tornar a Justiça mais efetiva não apenas nos processos que estão dentro dos tribunais. Precisamos estimular cada vez mais, também, a resolução dos litígios durante a fase pré-processual.
 
O CNJ se prepara para a VII edição da Semana Nacional da Conciliação. O que mudou do ano passado para cá?
A semana do ano passado se destacou das anteriores por ser a primeira vez que se realizou após a criação da Política Nacional de Conciliação, que foi implantada em dezembro de 2010 pela Resolução n. 125. A medida determinou a criação de núcleos e centros voltados à promoção da conciliação nos estados brasileiros e a busca pela conciliação na fase pré-processual, como já falei anteriormente. É uma forma de evitar que os conflitos sejam judicializados sem necessidade. Este ano, o CNJ intensificou o estímulo à formação de conciliadores e mediadores e realizou vários cursos para a capacitação de magistrados e servidores do Judiciário, que, por sua vez, estão ajudando na capacitação de outros tantos em todos os tribunais. Com isso, estamos formando uma rede de pessoas aptas à prática de conciliação no Judiciário brasileiro, o que certamente se refletirá não apenas nos índices da próxima Semana Nacional da Conciliação como também nos resultados obtidos ao longo deste ano nos diversos mutirões que são feitos de janeiro a dezembro em todos os tribunais.
 
Existem gargalos ou peculiaridades observadas em alguns tribunais durante a prática da conciliação que podem ser destacados?
Os tribunais têm realizado excelente trabalho e buscado, em todo esse período, alternativas de acordo com o número de processos observado a partir da realidade de cada estado. A prova disso é que temos visto mutirões setorizados que têm obtido excelentes índices de acordos, como as questões previdenciárias e outros trabalhos, criados para quem possui dívidas com taxas como Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e Taxa de Limpeza Urbana (TLP). Também têm sido realizados vários mutirões para resolução de pendências das pessoas com o Detran e com o seguro de veículos automotores (DPVAT); para quitação de dívidas com o Sistema Financeiro de Habitação (SFH); com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Esses são apenas alguns dos vários exemplos que podemos citar vindos dos tribunais estaduais e federais de todas as regiões.
 
Pelo que o sr. está afirmando, o Judiciário tem feito sua parte. Mas ainda não pode existir uma espécie de resistência por parte da população em conciliar, por achar que é melhor ver o processo decidido, a causa ganha propriamente, em todas as instâncias da Justiça, por mais moroso que isso seja?
Não vejo assim. Acho que a população está cada vez mais conscientizada sobre a importância de se conciliar. Até porque a conciliação não apenas contribui para a solução dos litígios dos cidadãos como também estimula a própria sociedade para o fato de que é melhor conciliar do que mitigar. Sabemos que essa mudança no modo de pensar não é uma coisa fácil e, de certa forma, reflete um modo de ser da própria sociedade, que tem sido orientada a mitigar desde décadas passadas, mas o Direito também transporta práticas conciliatórias.
 
O CNJ também tem entregue, ao final de cada Semana Nacional da Conciliação, o prêmio Conciliar é Legal, tradicionalmente concedido aos tribunais, magistrados e servidores que se destacam com boas práticas. Poderia nos falar sobre a importância dessa homenagem?
Vejo como uma valorização fundamental aos que tanto se empenham na conciliação. A mediação e a conciliação são institutos que devem ser amplamente divulgados, e esse é um dos caminhos que encontramos para levar isso às pessoas, assim como acho que valorizar e estimular as faculdades de Direito no ensino dessa prática também é fundamental para fortalecer a negociação na resolução dos conflitos sociais.
 
Durante workshop ocorrido no Encontro Nacional dos Núcleos de Conciliação dos tribunais, o sr. mencionou o alto valor dos processos nas justiças estaduais e na federal. Acredita que o bom trabalho da conciliação precisa passar por esses núcleos, instituídos pela Resolução n. 125?
Acredito que esse projeto [dos núcleos de conciliação] deve ser levado à frente. A maioria dos tribunais tem boa vontade e já está desenvolvendo seus núcleos. No Rio de Janeiro, por exemplo, as salas de mediação e os profissionais envolvidos nessa ação se destacam, assim como em outros estados, mas precisamos avançar ainda mais. Obtivemos excelentes índices de acordos nas últimas edições da Semana e nossa expectativa é de, este ano, conseguir repetir, senão ampliar ainda mais tais resultados. Apenas no ano passado foram realizadas perto de 160 mil audiências e formalizados aproximadamente 79 mil acordos, em valores homologados que totalizam aproximadamente R$ 600 milhões.
Hylda Cavalcanti
Agência CNJ de Notícia

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Jurisprudência do STJ consolida arbitragem no Brasil

A arbitragem tem sido cada vez mais usada como forma de resolver conflitos no Brasil, principalmente por empresas. Uma solução encontrada o país que tem cerca de 90 milhões de processos em andamento, e os julgamentos demoram anos para acontecer, principalmente se envolver questão de alta complexidade técnica.

 
O rito é mais simples que o de um processo judicial. As partes, numa corte arbitral, aceitam se submeter à decisão do árbitro, que não é necessariamente advogado ou juiz, podendo ser especialista da área onde há controvérsia. Segundo a presidenta do Comitê Brasileiro de Arbitragem e doutora em direito pela Universidade de São Paulo, Adriana Braghetta, esse sistema é um método complementar de solução de controvérsias legais, disponível para empresas e cidadãos.
 
A arbitragem existe praticamente desde o Império Romano e sempre foi amplamente utilizado na Europa. No Brasil, é regulamentada pela Lei 9.307/1996, a Lei da Arbitragem. O Brasil é signatário da Convenção de Nova York, de 1958, que trata do reconhecimento e execução das sentenças arbitrais estrangeiras. O país ratificou a convenção em 2002 e tem se destacado pela eficiência e transparência desse sistema. Uma comissão está sendo criada pelo Senado Federal para aprimorar a Lei da Arbitragem e deverá ser presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça Luis Felipe Salomão.
 
Jurisprudência
Em decisão recente da 3ª Turma do STJ, ficou estabelecido que o Judiciário não pode intervir em discussões que já acontecem em corte arbitral, nem mesmo julgando ações cautelares. O entendimento foi dado no Recurso Especial 1.297.974, relatado pela ministra Nancy Andrighi.
 
Duas empresas iniciaram um projeto ligado a energias renováveis. Posteriormente, uma delas ajuizou medida cautelar alegando inadimplência contratual da outra. O pedido foi negado, mas antes do julgamento da apelação foi instaurado o tribunal arbitral. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, entretanto, decidiu que a arbitragem não impediria a análise das questões urgentes.
Em recurso ao STJ, a ministra Andrighi entendeu que a competência do TJ-RJ era precária, não se estendendo após a instalação da corte arbitral. Segundo ela, caberia ao juiz enviar o processo ao árbitro, para ele decidir sobre a cautelar. Para a ministra, isso evitaria o prolongamento desnecessário do processo.
O entendimento da ministra Nancy foi acompanhado pelo ministro Luís Felipe Salomão. No mesmo julgamento, afirmou que a instauração do juízo arbitral revoga as decisões judiciais anteriores. Para o ministro, depois de conclamada a corte arbitral, o Judiciário só pode ser usado para fazer valer uma decisão tomada no processo de arbitragem.
 
Nancy Andrighi também relatou outro recurso fixando as possibilidades de uso da arbitragem envolvendo empresas falimentares. Na Medida Cautelar 14.295, a ministra decidiu monocraticamente que o instituto pode ser aplicado mesmo se uma das empresas envolvidas se encontrar em liquidação. A massa falida de uma operadora de planos de saúde entrou com a medida para suspender o procedimento, pois, com o patrimônio indisponível, estaria impedida de concluir negócios pendentes.
Para a ministra, não haveria risco na participação na arbitragem, pois a defesa dos direitos da massa falida seria levada em conta, juntamente com os dos credores e demais interessados. Além disso, ponderou, a empresa optou pela arbitragem no contratoe eventuais acordos deveriam passar pelo crivo das autoridades competentes.
 
Efeito retroativo Um dos entendimentos fixados pelo STJ é no sentido de que a Lei 9.307 se aplica aos contratos firmados antes de sua vigência e que contenham cláusula admitindo a arbitragem. Uma das decisões mais antigas nesse sentido foi dada na Sentença Estrangeira Contestada 349, relatada pela ministra Eliana Calmon. O então ministro do STJ Luiz Fux, hoje no Supremo Tribunal Federal, afirmou que a lei, por ser eminentemente processual, aplica-se de forma imediata a fatos pendentes.
A 1ª Turma, no julgamento do Recurso Especial 933.371, chegou à mesma conclusão em processo envolvendo a Itaipu Binacional e a prestadora de serviços Logos Engenharia. A prestadora de serviço ajuizou ação de cobrança contra a Itaipu, para o pagamento de multa e correções por pagamentos atrasados. A Itaipu afirmou que o processo deveria ser extinto e submetido à arbitragem, pois havia cláusula compromissória.
 
A jurisprudência do STJ já estabelecia que contratos prevendo a arbitragem estão sujeitos à Lei da Arbitragem, sendo possível sua aplicação retroativa. E, concluiu a Turma, a Súmula 5 do próprio tribunal veda a análise de cláusulas de contrato.
Tal fundamentação também foi adotada pelo ministro Luis Felipe Salomão no REsp 934.771, no qual um laboratório queria encerrar contrato firmado em 1964 com um hospital de São Paulo. Para o ministro Salomão, a Lei de Arbitragem tem aplicação imediata nos contratos que preveem esse instituto, especialmente se aceito de forma expressa.
Essa jurisprudência é tão pacífica que já foi até transformada em súmula no STJ. O enunciado, de número 485, diz: “A Lei de Arbitragem aplica-se aos contratos que contenham cláusula arbitral, ainda que celebrados antes da sua edição”.
 
Árbitro x Juiz
Para o ex-conselheiro do CNJ Marcelo Nobre, especialista na Lei de Arbitragem e advogado, Marcelo Nobre, o diferencial do Brasil foi equiparar o árbitro ao juiz togado. O árbitro, segundo ele, pode ser muito mais próximo da parte técnica e ter um entendimento mais profundo sobre o tema.
Nobre afirma que a arbitragem retira do Judiciário matérias muito complexas e específicas, cuja análise tomaria tempo excessivo dos julgadores, mas no sistema arbitral podem ser resolvidas em menos de um ano. Outro ponto positivo é o tratamento dado a questões que envolvem empresas estrangeiras e ordenamentos jurídicos de outros países, que poderiam gerar “intermináveis polêmicas”.
 
No caso da Sentença Estrangeira Contestada 3.709, relatada pelo ministro Teori Zavascki, foram abordadas regras de constituição de advogados. A Corte Especial do STJ entendeu, de forma unânime, que em casos de arbitragem internacional as regras para constituição de advogado seguem as leis às quais as partes se submeterem. Se não houver regra específica, adota-se a legislação do país onde se deu a arbitragem.
No caso, a filial brasileira de uma empresa de telecomunicações contestou a sentença que a condenou a pagar R$ 12 milhões a uma empresa norte-americana por descumprimento de contrato. Só que o contrato foi firmado pela filial chilena, sem participação das outras unidades.
A empresa credora iniciou um processo judicial e pediu a participação das filiais do Brasil e de outros países latino-americanos, pois os objetivos do contrato também as afetavam. Alegando que ela não teria firmado contrato direto com a empresa credora, nem concordado em ser representada pelo advogado da unidade chilena, a filial brasileira contestou a ação.
 
O ministro Zavascki, porém, observou que a constituição de advogado por simples comunicação à corte arbitral é procedimento aceito nos Estados Unidos, não sendo admissível à filial brasileira tentar adotar regras locais em arbitragem internacional. Além disso, ela participou de todas as fases do procedimento, inclusive do julgamento pelo árbitro.
 
Outra decisão importante envolvendo entidades estrangeiras foi dada no REsp 1.231.554, na qual a 3ª Turma do STJ entendeu, de forma unânime, não ser necessária homologação de sentença de tribunal arbitral estrangeiro proferida no Brasil. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora da matéria, essa sentença pode ser considerada brasileira, pois a legislação nacional adotou o princípio territorialista para definir a nacionalidade da arbitragem.
 
Para ela, ao adotar esse princípio, a Lei 9.307 desconsiderou qualquer outro elemento. O fato de o procedimento ter sido apresentado à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, com sede em Paris, não altera a nacionalidade da sentença.
 
Brasil
A disposição brasileira em adotar o instituto da arbitragem tem merecido elogios de peritos internacionais, como do holandês Albert Jan van den Berg, doutor em Direito e professor. Em recente evento no STJ, ele afirmou que a Justiça do país vem se tornando exemplo para o mundo. O Brasil, na visão do especialista, nos últimos dez anos, passou a ser o “melhor aluno da classe” sobre o tema. O fato de o STJ centralizar e uniformizar as decisões sobre arbitragem seria um ponto-chave para o sucesso, disse.
 
Adriana Braghetta espera que possíveis mudanças não alterem a trajetória de sucesso da Lei de Arbitragem. Ela lembra que, com a proximidade da Copa do Mundo em 2014, e das Olimpíadas em 2016 no Brasil, muito mais contratos terão o mecanismo da arbitragem, e a insegurança jurídica para empresas e investidores estrangeiros deve ser evitada.
Com informações da Assessoria de Imprensa do Superior Tribunal de Justiça.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Cursos pretendem reduzir processos de separação

 A nova arma da Justiça para diminuir o ajuizamento de ações nos tribunais é um curso oferecido aos casais que estão se divorciando. O projeto, do Conselho Nacional de Justiça, já está em andamento há quase um ano na Bahia e no Distrito Federal e vem sendo incentivado em todo o país.

 
A ideia é dar aos casais ferramentas e confiança para que evitem levar a separação conjugal à Justiça e busquem a conciliação ou a mediação. Os juízes treinados pelo CNJ para dar as chamadas "oficinas de parentalidade" apontam que o divórcio não deve ser tratado como disputa ou vingança.
“É uma nova fase na vida do casal, uma continuação, pois continuarão sendo uma família, mas com uma formação diferente”, explica o juiz Andre Gomma de Azevedo, da Bahia, que tem viajado pelo Brasil em nome do CNJ dando cursos para formar conciliadores e mediadores.
 
As oficinas são mais um passo no que Gomma chama de “transformação mais profunda dos últimos séculos” do Judiciário, que é sua popularização e, assim, a necessidade de desafogá-lo.
Um dos pontos destacados pelo juiz é que a autocomposição (conciliação ou mediação) não substitui o julgamento. Esse é um dos pontos-chave, segundo ele, para que juízes aceitem que haja conciliação e mediação nas varas em que trabalham. Como exemplo, o juiz cita a empresa que quer lucrar ludibriando o cliente: “O empresário que faz isso está errado e não quer arrumar uma solução melhor para os dois. Para isso, existe um juiz, que vai julgar a disputa entre esse sujeito e o cliente dele, pensando até mesmo no caráter punitivo da pena”.
 
Convencer os juízes da necessidade de se implantar centros de mediação ou de conciliação é um dos grandes degraus a serem superados. A advogada Carla Boin, sócia da Basv advogados explica que, para instalar o setor de mediação das Varas de Família e Sucessão de Santo Amaro, foi preciso apresentar a cada juiz como o sistema poderia auxiliá-lo em seu trabalho.
“O sucesso da mediação não se mede em números de acordos, mas pela facilitação da solução do conflito entre aqueles que optam por dar uma chance à negociação”, explica ela, que, no dia 3 de outubro lançou livro falando sobre a experiência de Santo Amaro. A advogada diz admirar a iniciativa do CNJ, mas é contrária à avaliação feita pelo Conselho, que leva os números muito em conta.
 
O principal objetivo, diz ela, é a autonomia e responsabilização. “As pessoas passam a se sentir responsáveis e autônomas, pois não é um juiz que vai resolver quem está certo e quem está errado, mas os envolvidos que chegarão à melhor solução.”
Carla aponta que, principalmente nas varas de família, cujas discussões estão "cercadas de emoções é que as soluções extrajudiciais se mostram mais eficientes.“Muitas vezes, processos de separação são movidos por vingança”, conta.
 
O juiz Gomma de Azevedo explica que a ideia da conciliação e da mediação é mudar a forma de enfrentar o problema, mostrando pontos de vista positivos, que levam o casal à chamada “espiral produtiva”. “Em vez de polarizar as partes e atribuir culpa, buscamos mostrar como elas podem construir novas normas para seguirem nesse novo momento, compartilhando o poder decisório”, explica.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

CNJ apoia texto proposto para novo CPC

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) encaminhará à Câmara dos Deputados nota técnica de apoio à aprovação do novo Código de Processo Civil (Projeto de Lei n. 8.046/2010), com propostas de ajuste no capítulo que trata sobre conciliação e mediação.
 
O texto aprovado nesta terça-feira (2/10), durante a 155ª sessão plenária do Conselho, sugere que o novo Código obrigue os tribunais a criarem núcleos e centros de conciliação, conforme já prevê a Resolução n. 125/2010 do CNJ, além de tratar a tentativa de acordo amigável como meio prioritário para solucionar os conflitos judiciais.
 
“A tentativa de conciliação e mediação deve ter cunho obrigatório no desempenho da atividade jurisdicional a ser perseguida em todo o processo”, sugere a nota técnica elaborada pela Comissão Permanente de Articulação Federativa e Parlamentar, presidida pelo conselheiro Bruno Dantas, e aprovada por unanimidade no Plenário do Conselho.
 
O texto será encaminhado à Câmara pelo presidente do CNJ, ministro Ayres Britto. Segundo ele, a proposta do novo Código, ao prestigiar o trabalho dos juízes de primeiro grau, fortalece a democracia. “Quanto mais o Direito prestigia as instâncias de base, mais tonifica a ascensão da democracia”, afirmou. No documento, o CNJ posiciona-se favoravelmente à aprovação do novo Código, que está afinado com diversas das políticas públicas desenvolvidas pelo próprio Conselho com o objetivo de aprimorar a prestação jurisdicional.
 
No entendimento dos conselheiros, o novo Código reafirma as atribuições do CNJ, no sentido de fiscalizar a atividade administrativa e financeira do Judiciário. Ao submeter as propostas ao Plenário, o conselheiro Bruno Dantas ressaltou que a proposta cria mecanismos para acelerar a conclusão dos processos, sobretudo os mais antigos. Além disso, uniformiza procedimentos, reduzindo a quantidade de recursos e eliminando o efeito suspensivo automático do recurso de apelação, o que contribui para a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.
 
O Projeto de Lei n. 8.046/2010 já foi aprovado pelo Plenário do Senado Federal. Atualmente tramita na Câmara dos Deputados, onde aguarda votação do relatório-geral apresentado pelo deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT/BA).
Agência CNJ de Notícias

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

As perguntas mais frequentes sobre herança

Transcrevo, na íntegra, artigo publicado na Revista Consultor Jurídico:

As perguntas mais frequentes sobre herança

Herança parece ser um daqueles assuntos inesgotáveis e embora os testamentos sejam muito populares em outros países, no Brasil ainda há certa dose de superstição. Contudo, volta e meia recebo em meu escritório herdeiros e pretendentes ao posto de herdeiro, ansiosos para entender os meandros legais que os aproximam – ou que os afastam – da herança. Revendo esses processos, selecionei algumas dúvidas mais comuns:
O que acontece com a herança quando não há testamento?
Se uma pessoa morre sem deixar testamento, seu patrimônio será dividido entre os herdeiros de acordo com a ordem da vocação hereditária, isto é, a ordem sucessória estabelecida pelo Código Civil. Os primeiros na ordem sucessória são os descendentes (filhos, netos e bisnetos) e o cônjuge do falecido. Se não houver descendentes, os próximos a serem chamados serão os ascendentes (pais ou, na ausência destes, avós e bisavós), e também o cônjuge. Não havendo descendentes nem ascendentes, a totalidade dos bens cabe somente ao cônjuge. Na linguagem jurídica, este grupo é chamado de herdeiros necessários. Se não houver cônjuge, a herança caberá aos parentes colaterais, na seguinte ordem: irmãos, sobrinhos, tios e primos. No que diz respeito aos primos, estão incluídos apenas os colaterais de quarto grau, popularmente chamados de primos-irmãos. É importante notar que uma classe de herdeiros exclui a outra. Por exemplo: se o falecido tiver esposa e filhos, os pais não recebem nada. Se tiver apenas esposa, a herança será dividida entre ela e os pais do falecido. Se tiver apenas pais, ou apenas esposa, os irmãos não têm direito à herança. Se tiver apenas irmãos (e nenhum herdeiro necessário), os tios e sobrinhos não irão herdar coisa alguma, e assim por diante. Se o autor da herança quiser beneficiar algum parente que não seja herdeiro necessário, ele deverá fazer um testamento.
 
E se a pessoa não tem herdeiros, para onde vai a herança?
Se o falecido não tem herdeiros nem deixou testamento, a herança é considerada jacente, isto é, ficará em poder do Estado.
 
O regime de bens do casamento influencia a parte que cabe ao viúvo ou viúva?
Sim, e é muito importante dispor dessa informação ao optar pelo regime de bens (o que, convém lembrar, deve ser feito antes do casamento). Se, por exemplo, o regime escolhido for o da comunhão parcial de bens, o cônjuge sobrevivente tem direito à metade do que foi adquirido durante o casamento (meação) e à parte do que foi adquirido ou herdado antes do casamento (que é a herança propriamente dita). Cada regime tem suas peculiaridades no que diz respeito à sucessão. A única exceção é quando o falecido não possui descendentes nem ascendentes. Nesse caso, só o cônjuge herda tudo, independentemente do regime de bens.
 
Quais são os direitos dos sogros, genros, noras e enteados?
Este grupo, que recebe o nome de parentes por afinidade, não está incluído na herança – a menos que o falecido tenha deixado um testamento no qual eles são beneficiados. Se não deixar, eles não recebem nada. Isso é válido inclusive nos casos em que o falecido não temnenhum outro parente além dos enteados, por exemplo. A única forma de garantir que eles recebam alguma coisa é por meio de testamento.
 
Filhos adotivos são herdeiros?
A Constituição Federal de 1988 extinguiu toda e qualquer diferença entre filhos. Se a adoção foi feita conforme determina a lei, os adotivos possuem os mesmos direitos que os filhos biológicos no que diz respeito à herança.
 
Divorciada tem direito à herança do ex-marido?
Se a sentença do divórcio já foi publicada e a partilha dos bens do casal já foi feita, o ex-cônjuge não tem direito à herança.
 
E na união estável? O companheiro fica com alguma coisa?
Se a união estável for comprovada, o companheiro sobrevivente tem direito à parte do que foi adquirido durante a união. Porém, embora o artigo 1.725 do Código Civil estabeleça que na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se o regime da comunhão parcial de bens, o fato é que existem exceções no que diz respeito à sucessão. No caso do regime da comunhão parcial de bens, na ausência de outros herdeiros necessários (descendentes e ascendentes), o cônjuge herda tudo. Mas o mesmo não se aplica à união estável. Nesse caso, o companheiro sobrevivente só será o único herdeiro quando o falecido não tiver parentes sucessíveis (incisos III e IV do artigo 1.790), o que inclui, além dos herdeiros necessários, os colaterais até o quarto grau (irmãos, tios, sobrinhos ou primos). Se tiver, a herança será dividida entre eles e o companheiro sobrevivente.
 
Quem herda alguma coisa é obrigado a pagar imposto? Quanto?
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de quaisquer Bens ou Direitos, ou ITCMD, é pago apenas quando a herança ultrapassa um determinado valor. Porém, como se trata de um tributo estadual, o valor a partir do qual é necessário pagá-lo pode variar de estado para estado. O mesmo ocorre com as regras usadas para calcular os valores a serem pagos. No estado de São Paulo, por exemplo, as isenções são calculadas com base na unidades fiscal estadual (Ufesp). Estão isentos de impostos de transmissão causa mortis: o imóvel residencial cujo valor não ultrapassar 5 mil Ufesps, desde que os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel; e o imóvel cujo valor não ultrapassar 2.500 Ufesps, desde que seja o único transmitido. O valor da Ufesp costuma ser reajustado. O deste ano, por exemplo, foi fixado em R$ 18,44.
Revista Consultor Jurídico, 29 de setembro de 2012