sexta-feira, 19 de junho de 2015

Justiça Restaurativa usada com jovens infratores do DF

As práticas de Justiça Restaurativa – método alternativo de solução de conflitos usado em diversas etapas dos processos criminais – serão implantadas no cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto por adolescentes no Distrito Federal a partir do segundo semestre. No DF, há 4.267 adolescentes cumprindo medidas socioeducativas, sendo que, destes, 1.659 cumprem medidas em meio aberto, o que engloba medidas de liberdade assistida e de trabalho comunitário. A Vara de Execução de Medidas Socioeducativas do DF (Vemse), que desenvolve o projeto, fará a capacitação de profissionais das 15 Unidades de Atendimento em Meio Aberto (UAMAs) do DF para aplicação dos círculos restaurativos.

O método da Justiça Restaurativa, que pode ser utilizado em qualquer etapa do processo criminal, consiste na aproximação entre vítima, agressor, suas famílias e a sociedade para a reparação dos danos causados por um crime ou infração e a solução de situações de conflito e violência. Dessa forma, a Justiça Restaurativa aplica o conceito de corresponsabilidade social do crime, envolvendo diferentes pessoas e instituições na resolução de um conflito, na reparação dos danos causados e na recuperação social do agressor.
A prática da Justiça Restaurativa é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Protocolo de Cooperação para a Difusão da Justiça Restaurativa, firmado em agosto de 2014 com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). A introdução da prática atende à Resolução 125/2010 do CNJ, que estimula a busca por soluções extrajudiciais para os conflitos. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) já possui um programa de Justiça Restaurativa em andamento, mas não contemplava adolescentes cumprindo medidas socioeducativas.

O projeto desenvolvido pela Seção de Assessoramento Técnico (SEAT) da Vemse, que tem o apoio da juíza da Vara de Infância e Juventude, Lavínia Tupy Vieira Fonseca, tem como objetivo a aplicação de práticas restaurativas, por meio da realização de círculos restaurativos envolvendo as famílias e os jovens que já estão cumprindo sentença em meio aberto.
“Acreditamos que é preciso priorizar as medidas em meio aberto, tornando mais efetivo o seu cumprimento e evitando que o jovem reincida no cometimento de atos infracionais e acabe cumprindo outra medida restritiva de liberdade futuramente”, diz Adelaide de Souza Ferreira, assistente social da Vemse e uma das responsáveis pelo projeto. “O grande objetivo das práticas restaurativas nesse momento da execução da medida é propiciar a reflexão acerca do ato infracional praticado, os motivos que o levaram a isso, não só para o adolescente, mas para sua família”, diz Adelaide.

As equipes das UAMAs, que receberão a capacitação para a aplicação das práticas restaurativas, são compostas por psicólogos, assistentes sociais, pedagogos e atendentes de reintegração social – esses profissionais também serão responsáveis por fazer a sensibilização dos jovens e suas famílias para adesão ao programa, o que deve ser feito de forma voluntária.
Presença da vítima – Embora a Justiça Restaurativa preconize que a vítima e o ofensor participem do círculo de encontros, especialmente quando este acontece antes da judicialização do conflito, no projeto a ser implantado com os adolescentes do DF, não necessariamente a vítima participará do encontro. Essa relação poderá ser realizada de forma indireta. “Caso a vítima não queira participar do encontro, podemos, por exemplo, gravar uma mensagem ou levar uma carta feita pelo adolescente à vítima, contando sobre os sentimentos dele que o levaram a cometer o ato e também é possível que a vítima mande uma mensagem a ele, caso sinta vontade de dizer algo”, diz Adelaide.

Na opinião do psicólogo Cássio, quando esse encontro entre vítima e ofensor acontece, há humanização do processo. “A vítima e o ofensor têm oportunidade de sair desse papel para se transformar em duas pessoas que se encontraram em determinada situação muito ruim, mas que pode ser ressignificada”, diz Cássio.

Risco de reincidência – Um grande diferencial do programa de Justiça Restaurativa a ser implantado com os adolescentes no DF em relação aos já desenvolvidos no país – como, por exemplo, na cidade de São Paulo, em que as práticas são aplicadas antes da judicialização do conflito – é a capacitação para avaliação do risco de reincidência dos jovens no crime. A ideia é que os profissionais que participarão dos círculos restaurativos com os jovens e suas famílias estejam aptos para avaliar fatores associados pela literatura técnica à persistência na conduta infracional.
Entre eles está a associação do jovem com pares antissociais, baixo desempenho escolar e abuso de álcool e outras drogas. “Outro fator de risco é a constatação de que o pai e a mãe não representam autoridade para o jovem, que tem dificuldade em demonstrar respeito por eles”, diz Cássio Marcelo Batista Veludo, psicólogo da Vemse.
A partir da identificação desses fatores, essas informações passarão a constar no Plano Individual de Atendimento (PIA) do jovem, pelo qual é feito o acompanhamento de todo o cumprimento da medida, fixando metas nos mais variados aspectos da vida, como o escolar, profissionalizante, familiar e social. Para auxiliar no cumprimento dessas metas, o programa deve contar com o apoio de programas de intervenção – uma das opções, por exemplo, é a parceria com faculdades -, que abordem treinamento para resolução de problemas, controle da raiva, habilidades parentais e uso abusivo de drogas.

Luiza de Carvalho Fariello
Agência CNJ de Notícias