domingo, 17 de outubro de 2010

A ineficácia do Judiciário nos crimes de corrupção

              No lançamento do convênio objetivando melhorar a fiscalização de recursos federais, assinado entre a Procuradoria Geral da República e a Controladoria Geral da União, os representantes desses órgãos, Roberto Gurgel e Jorge Hage, criticaram as garantias que a lei brasileira prevê para os acusados em casos de corrupção, que na prática impedem a sua punição.

              O ministro Jorge Hage, da CGU, afirmou que, com a atual legislação, o Brasil é um dos países que mais permitem protelar os processos. Por isso a maioria dos casos prescreve, deixando impunes os criminosos de colarinho branco. Isso leva a ineficácia da Justiça e alimenta a sensação de impunidade.

              Já o Procurador-Geral da República Roberto Gurgel, ao pedir mudanças legais, afirmou haver um garantismo exarcebado da legislação. Em suas palavras: "Claro que deve haver a preocupação com o direito daqueles que são acusados de algum crime, mas é preciso haver uma preocupação igual com a efetividade da tutela penal".

              Embora a necessidade de mudança da legislação sobre a matéria seja voz corrente, o fato é que algumas medidas a serem tomadas nesse sentido, ainda não sairam do papel, tais como:

              - Votação do projeto de lei, enviado pelo governo ao Congresso, em fevereiro desse ano, propondo sanções administrativas claramente definidas contra pessoas jurídicas que lesem a administração pública;
              - Em atendimento à orientação da ONU, estabelecer como crime o enriquecimento ilícito. Já existe projeto em andamento no Congresso, mas ainda não foi votado;

               - Possibilidade de se processar criminalmente uma empresa. Está prevista na Constituição Federal, mas ainda não foi regulamentada pelo Congresso, por falta de interesse.

               Além dessas, outras medidas existem, que já foram implantadas nos EUA, Inglaterra, Colômbia, Itália, como a Ação Civil de Domínio, cujo objetivo é recuperar valores de pessoas físicas obtidos com a corrupção.

               Conforme relatório preliminar do GAFI (Grupo de Ação Financeira), órgão internacional ligado à ONU, que além de sugerir, monitora políticas contra a lavagem de dinheiro, o Brasil não consegue punir o chamado crime de lavagem de dinheiro, praticado por traficantes de drogas, corruptos e criminosos do colarinho branco. Os principais problemas citados são:
               a) inexperiência das cortes superiores (os casos de lavagem de dinheiro tendem a ser mais complexos que outros tipos de delito);
               b)  recursos excessivos (o Brasil possui um sistema de recursos com um entendimento muito liberal sobre os direitos do réu: uma condenação de primeira instância, mesmo mantida por um tribunal superior, não é suficiente para a execução da pena, como ocorre na maior parte do mundo). Conforme dados do relatório, em 2008, as varas judiciais especializadas em crime financeiro registraram 1.311 processos, dos quais somente dez tiveram uma sentença definitiva;
              c)  dificuldade de se obter a quebra de sigilo (visto por alguns juízes como direito absoluto);
              d)  pouca utilização da medida de apreensão de bens pelas autoridades e tribunais  no Brasil. (Em 2006 aconteceram em pouco mais de 15% dos casos e, em 2007, caiu para pouco mais de 5%).
              e)  inexistência de responsabilidade penal das empresas.

              Diante da ineficiência do Judiciário na punição desses delitos é de se esperar que o Congresso Nacional faça a sua parte e vote as leis fornecendo os mecanismos necessários para investigar a corrupção.

              Indagado porque na Vara por ele dirigida, especializada em lavagem de dinheiro, não tem processo de corrupção, o juiz Fausto Martins de Sanctis afirmou: "O país se ressente de mecanismos para investigar a corrupção. Aqui as pessoas estão acovardadas pela ineficácia do sistema. Pessoas que querem delatar crimes não se sentem motivadas a fazê-lo por medo de represálias".