segunda-feira, 27 de abril de 2015

Empresas: Alternativas à Judicialização dos conflitos


Empresas não precisam judicializar todos os conflitos


As empresas sempre apresentaram grande competitividade no mundo corporativo, principalmente no momento atual e turbulento pelo qual o país atravessa. É necessário que demonstrem eficiência para alavancar a lucratividade. Acontece que os conflitos que surgem da relação corporativa, sejam eles entre colaboradores, colaborador versus empregador, sócios entre si ou, ainda, consumidor versus fornecedor, são impeditivos para o bom desenvolvimento das empresas.Por 

Tais conflitos normalmente são resolvidos pela via judicial, com a dispensa do funcionário, dissolução da sociedade ou, ainda, a rescisão do contrato com fornecedores ou prestadores de serviços. Entretanto, as soluções, na grande maioria dos casos, são prejudiciais às empresas. O motivo é simples. Normalmente, servem para afastá-las do alcance da alta performance empresarial.
Então, qual seria a melhor solução para resolver esses conflitos oriundos do mundo corporativo? Para essa resposta, deve-se primeiro saber que a solução dos conflitos poderá ocorrer por meio da Justiça Estatal ou da Justiça Privada. A primeira é pelo caminho do Poder Judiciário. O juiz sentencia o que entende ser a melhor solução, gerando a insatisfação daquele que perde e até mesmo da parte vencedora em alguns casos. É o sistema ganha-perde. Termina o litígio, mas o conflito pode continuar a existir.
A outra vertente seria a Justiça Privada, representada pelos institutos da Negociação, Conciliação, Mediação e Arbitragem, ou seja, Métodos Adequados de Solução de Conflitos (MASC), os quais serão a seguir conceituados.
A conciliação é muito usada pelo Poder Judiciário, na qual um conciliador, indicado pelo juiz, intervém entre as partes para a construção do acordo. Nota-se a intervenção estatal e do conciliador na construção do acordo.
Na mediação, diferentemente da conciliação, as partes elegem um terceiro — o mediador. Ele deve ser imparcial e neutro. Este método é sigiloso e muito usado nos casos em que as partes querem manter o relacionamento após o término do conflito. A mediação pode ser feita em casos como: conflitos entre sócios ou empresas, relações de consumo, questões imobiliárias e divórcio, por exemplo, entre outros. A grande vantagem da mediação é que a construção do acordo é facilitada pelo mediador. É o chamado sistema ganha–ganha. Não há perdedores. Neste caso, há a real pacificação entre as partes ou a pacificação social. Atualmente, está em trâmite no Congresso Nacional um projeto de lei que regula a mediação. Importante salientar que este instituto já é reconhecido pelo Poder Judiciário brasileiro. Se houver um acordo entre as partes, este poderá ser homologado pelo juiz, tornando-se título executivo.
A arbitragem é o método usado nas demandas que envolvem valores financeiros expressivos. Ela é muito utilizada no direito internacional, nas quais geralmente são partes as empresas públicas ou privadas. A arbitragem possui uma característica interessante para as partes. Isso porque elas podem eleger um árbitro especialista no tema em discussão, ou seja, profundo conhecedor do assunto ou realidade vivenciada pelos envolvidos. As vantagens principais da arbitragem são:o sigilo, a rapidez e a certeza que o caso será apreciado e julgado por um especialista no assunto demandado.
Já a negociação é o método pelo qual as partes negociam um acordo entre elas, sem a interferência de terceiros. Este é conceito simplista da negociação.Na realidade, este mecanismo é muito mais abrangente, com técnicas próprias. Pode ser considerada uma arte, fundamentada em regras, estratagemas, táticas e todo arcabouço específico. A negociação é pouco usada pelos colegas advogados, que não podem receber críticas por isso. Afinal, a formação acadêmica brasileira é direcionada para o processo judicial.
As pessoas, normalmente, olham a negociação como uma prática normal, que não demanda conhecimentos específicos e nem a presença de um profissional. Talvez, por ser uma característica natural da convivência social. Todavia, este método, deve ser conduzido por profissionais competentes, que cuidarão dos interesses das partes que representam. Não deve ser utilizado por pessoas que consideram que, por terem o dom da argumentação, estão aptas para realizar acordos de posição empresarial estratégica, financeiros e de fusão e incorporação empresarial, por exemplo.
Assim, a negociação é uma “arma” que deve ser utilizada no cotidiano da sociedade. Mas com a segurança da capacidade de negociação. Caso contrário, é necessário contratar um profissional especializado a fim de alcançar resultados satisfatórios.
Neste contexto, para obter resultados desejáveis, o empresário deve estar atento para as várias possibilidades de soluções de conflitos disponíveis atualmente. A informação ainda é muito limitada neste sentido. É preciso ter a mente aberta para entender que nem todos os conflitos precisam ser judicializados. Há caminhos adequados para soluções de conflitos fora do Poder Judiciário. E esses caminhos já têm sido adotados por muitos empresários na realidade atual brasileira.
Revista Consultor Jurídico, 19 de março de 2015

sábado, 25 de abril de 2015

Sistema penitenciário: inútil, caro e desumano

Inútil, caro, desumano

Há condenados, primários ou reincidentes, que não precisariam estar atrás das grades, mas estão
Em meio ao noticiário das balas perdidas e da menoridade penal, também merece atenção o da anomalia que atinge as penas alternativas em São Paulo.
Longe de executar com presteza, dignidade e justiça a pena dos encarcerados, o poder público ainda falha ao administrar as penas restritivas de direito, que substituem a privativa de liberdade.
Segundo reportagem de Daniel Marcondes, da 59ª turma do Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha, grande parte das punições que deveriam ser cumpridas fora das prisões não acontece.
Em 2014, pelo menos 24% dos condenados foram beneficiados pela prescrição (perda do poder de punir pela passagem do tempo), o que indica ineficiência, e 30% foram alcançados por indulto presidencial, o que não parece ser adequado. Outros 27% descumpriram obrigações fixadas e foram transferidos para o regime aberto, tido como "vantajoso" pela falta de fiscalização. Descontados os que morreram, apenas 17% foram efetivamente punidos conforme a sentença original. É pouco.
Já temos a quarta maior população carcerária do mundo: 567 mil. Se levarmos em conta os que cumprem prisão domiciliar, o número chega a 715 mil. A polícia abusa de armamento letal, mata demais, as leis são endurecidas, às vezes contra o princípio da proporcionalidade, a mão dos juízes é cada vez mais pesada, e, paradoxalmente, reina a sensação de impunidade.
O deficit no sistema penitenciário é expressivo (210 mil vagas) e, agora, com apoio da maioria da população, querem acrescentar ao contingente de presos os adolescentes maiores de 16 anos. Agimos por impulso, não por planejamento.
Mais barato que construir e gerir penitenciárias é estabelecer roteiros alternativos de punição e controle. É uma oportunidade para aplicar medidas capazes, sim, de apresentar resultados. Autores de pequenos delitos podem ser destinatários de serviços que o Estado está apto a oferecer, como terapias e formação escolar ou profissional. O remédio pode condizer com a doença.
Há condenados, primários ou reincidentes, que não precisariam estar atrás das grades, mas estão. É inútil, é caro, é desumano.
Hoje, penas restritivas de direito substituem a de prisão em casos de crime culposo (não intencional) e em condenações de até quatro anos de prisão por crime doloso cometido sem violência ou grave ameaça. É possível ampliar e aperfeiçoar as hipóteses de desencarceramento, com criatividade e sem desmoralizá-las.
O índice de 17% (é assim só em São Paulo?) sugere o fecho de um círculo vicioso de incompetência e descaso. Falta política de Estado para a segurança pública no Brasil.
Por algum motivo, governantes e economistas recomendam gastar com obras de engenharia, símbolo de investimento e prosperidade, e não com custeio. Erguemos penitenciárias, mas não há programas e pessoal treinado para acompanhamento de condenados não perigosos.
Por vários motivos, o Poder Judiciário não se interessa pelo passado e pelo futuro da pessoa acusada de um crime. O réu percorre uma teia burocrática incapaz de apreender por que o fato aconteceu e o que depois pode ser feito.
Não tratamos dos soltos, porque a prioridade é maltratar os presos. É o avesso do avesso do avesso.
    Artigo do jornalista Luís Francisco Carvalho Filho, transcrito do jornal Folha de São Paulo

quinta-feira, 23 de abril de 2015

JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA X POLITIZAÇÃO DA JUSTIÇA

A judicialização da política conduz à politização da justiça


O fato é que hoje o Brasil vive uma situação surreal: um juiz de 1ª instância governa o país, atuando de Norte a Sul, faz o que bem entende, quebra empresas, gera desemprego, prende pessoas em qualquer lugar, a mídia induz o aplauso e muitos morrem de medo. Por que as pessoas aplaudem ou tem medo dele? Eu não aplaudo e não tenho medo. Evidentemente estou satisfeito com a independência e eficiência das policias, mas coloco sob suspeição a imparcialidade de parcela do Ministério Público e de parcela do Poder Judiciário.Teno escrito faz alguns anos que as relações entre o sistema judicial e o sistema político atravessam um momento de tensão sem precedentes, cuja natureza se pode resumir numa frase: a judicialização da política conduz à politização da justiça e a opinião não é só minha. 

A errônea aplicação da “Teoria do Domínio do Fato” pelo STF, a omissão do Inquérito 2474 pelo então Ministro Joaquim Barbosa, ambos os fatos na AP 470, o vazamento seletivo de informações no caso do processo da “lava jato”, dentre outros exemplos, me autorizam a colocar sob suspeição a atuação de alguns membros do Ministério Público do Poder Judiciário.
Especialmente porque compartilho a ideia da Ministra Carmem Lucia de que “A pessoa passa a ser chamada de excelência todos os dias. Daqui a pouco, começa a acreditar que é mesmo”, talvez ela, como eu, veja que há um triste paralelo entre aristocracia e o Poder Judiciário no Brasil.
E dos três poderes clássicos do Estado Democrático de Direito apenas o Judiciário não é essencialmente democrático, já que não é submetido ao escrutínio do "demos" (do povo) na definição de seu acesso, composição, promoção e acesso às funções de direção dos tribunais, e isso em pleno século XXI merece reflexão. Por que não é democrático? Porque o acesso dos membros do Poder Judiciário dá-se com fundamento na meritocracia [1] na medida em que seus membros são escolhidos com base numa demonstração de mérito técnico, ou profissional, mediante concursos públicos. No Executivo e no Legislativo os detentores do poder decisório principal são políticos eleitos diretamente pelo povo.
Assistimos um processo de judicialização sem precedentes da história do país. Uma verdadeira ditadura do Poder Judiciário.
Há judicialização da política sempre que os tribunais, no desempenho normal das suas funções, afetam de modo significativo as condições da ação política, ou de questões que originariamente deveriam ser resolvidas na arena política e não nos tribunais.
A tal judicialização pode ocorrer por duas vias principais: uma, de baixa intensidade, quando membros isolados da classe política são investigadores e eventualmente julgados por atividades criminosas que podem ter ou não a ver com o poder ou a função que a sua posição social destacada lhes confere.
Mas há outra via, de alta intensidade, quando parte da classe política – não se conformando ou não podendo resolver a luta pelo poder pelos mecanismos habituais do sistema político democrático – transfere para os tribunais os seus conflitos internos, por meio de denúncias ao Ministério Público (e algumas vezes do próprio MP), ou ajuizando ações diversas.
Ocorre a judicialização de alta intensidade, por exemplo, que vemos quando partidos e parlamentares renunciam ao debate democrático e deslocam para o Judiciário os conflitos que não são, a priori, jurídicos ou judiciais. Ou quando vemos o Ministério Público usar a credibilidade da imprensa para obter apoio da opinião pública para afirmação de suas convicções.
E o objetivo dessa tática (transferir tudo para o Judiciário e usar a imprensa) é – por meio da exposição judicial e em conjunto com os órgãos de imprensa de seus adversários – qualquer que seja o desenlace, enfraquecer, ou mesmo o liquidar, politicamente o adversário. Isso é algo questionável sob o ponto de vista ético e democrático.
No momento em que isso ocorre, a classe política, ou parte dela, “tende a provocar convulsões sérias no sistema político”. Isso se dá quando ocorre a renúncia ao debate democrático e a transformação da luta política em luta judicial o fato.
A judicialização da política pode a conduzir a outro fenômeno: a politização da justiça. Esta consiste num tipo de questionamento da justiça que põe em causa, não só a sua funcionalidade, como também a sua credibilidade, ao atribuir-lhe desígnios que violam as regras da separação dos poderes dos órgãos de soberania, penso que o espetáculo patrocinado de forma autoritária pelo Ministro Joaquim Barbosa fala por si.
Ademais, a politização da justiça coloca o sistema judicial numa situação de estresse institucional que, dependendo da forma como o gerir, tanto pode revelar dramaticamente a sua fraqueza, como a sua força.
Sobre a midiatização de fatos judicializados.
Quando ocorre a midiatização (ou espetacularização) de fatos judicializados, das investigações e das operações do Ministério Público, quando ocorrem vazamentos seletivos como os patrocinados pelo Juiz de Curitiba, por exemplo, o que se busca em verdade é transformar a plácida obscuridade dos processos judiciais na trepidante ribalta mediática dos dramas.
Esta transformação é problemática devido às diferenças entre a lógica da ação midiática, dominada por tempos instantâneos, e a lógica da ação judicial, dominada por tempos processuais próprios.
É certo que tanto a ação judicial como a ação midiática partilham o gosto pelas dicotomias drásticas entre ganhadores e perdedores. Mas, enquanto a primeiro exige prolongados procedimentos de contraditório e provas convincentes, a segunda dispensa tais exigências.
Em face disso, quando o conflito entre o judicial e o político ocorre na mídia, esta, longe de abranger veículos neutros, é um fator autônomo e importante do conflito. Não há neutralidade na mídia.
E, sendo assim, as iniciativas tomadas para atenuar ou regular o conflito entre o judicial e o político não terão qualquer eficácia se os meios de comunicação social não forem incluídos no pacto institucional. É preocupante que tal fato passe despercebido e que, com isso, se trivialize a lei da selva mediática em curso.
O uso do judiciário e da mídia, o deslocamento desmedido de questões políticas e policiais para o campo judicial e midiático pode revelar ausência de espírito democrático de quem age assim e, em tese, verdadeira litigância de má-fé e ausência de espírito republicano e conduz para uma armadilha que é a criminalização da Política. Um desserviço sem precedentes à Democracia e à nação.
Sobre a ditadura do Judiciário.
José Joaquim Gomes Canotilho professor português de direito constitucional recentemente se mostrou perplexo com o fato de não existir um órgão que possa corrigir as decisões equivocadas da nossa corte constitucional.
A nossa Constituição, nossa República, está assentada na separação dos Poderes. Os Poderes são independentes e harmônicos e em tempos de judicialização da política não poderíamos deixar que a politização e a midiatização do judiciário ocorresse.  Pois o Poder Judiciário não é infalível e a sua atuação é vinculada ao direito posto e à Constituição Federal.
Mas o fato é que o Poder Judiciário vem se transformando num superpoder, como sinalizado pelo professor Canotilho e pela Ministra Carmem Lucia. Penso que cabe à sociedade reagir democraticamente reconhecendo e denunciando o fato e cuidando para que a meritocracia e a burocracia institucional, ambas de viés aristocrático, não sejam vistas com mais respeito que a democracia.
Pedro Benedito Maciel Neto, 51, advogado e sócio da MACIEL NETO ADVOCACIA, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, ed. Komedi, 2007.


Revista Consultor Jurídico, 22 de abril de 2015.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

O esvaziamento do CNJ

O enterro precoce do Conselho Nacional de Justiça

Por Gisela Gondin  Ramos, Conselheira do CNJ, indicada pela OAB
Há pouco mais de três anos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que a competência do Conselho Nacional de Justiça para instaurar processos administrativos e investigar juízes é concorrente à das corregedorias dos tribunais. Trocando em miúdos, o CNJ manteve o poder de passar a magistratura a limpo, quando necessário, sem ficar refém dos tribunais que tem de fiscalizar. Trata-se de algo que, sempre bom frisar, é uma de suas mais importantes atribuições.
Na ocasião, a então corregedora nacional de Justiça, bradava que, caso a decisão do Supremo fosse diferente, o CNJ se transformaria em um “leão sem dentes”. Ao menos a figura de um leão, mesmo sem mostrar os dentes, é capaz de inspirar respeito. Já o que se pretende fazer com o Conselho, hoje, é algo sem precedentes. Estão em pleno curso, sem velas ou coroas de flores, os preparativos para o cortejo fúnebre do CNJ.
Não é a primeira vez — e custo a crer que seja a última — que o Conselho está sob ataque. Em seus breves 10 anos de vida, o CNJ já enfrentou toda espécie de resistência. Antes mesmo de sua instauração, em 2005, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) questionou no STF a existência do Conselho. Em abril daquele ano, a Corte Suprema decidiu que a criação do CNJ foi legítima e que é constitucional seu papel de órgão administrativo máximo do Poder Judiciário brasileiro.
Anos depois, a mesma a AMB tentou cassar a competência investigativa do CNJ. Em vão, mais uma vez, graças ao bom senso e à independência do Supremo Tribunal Federal. Poderíamos imaginar, então, que as ameaças ao bom trabalho do Conselho terminariam por ali. Ledo engano.
Se for aprovada como está a proposta da nova Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), o CNJ se transformará em uma repartição burocrática de pouca utilidade para o país. A pretexto de zelar pela autonomia administrativa dos tribunais — que, como bem mostra a história nacional, poucas vezes serviu ao bom funcionamento da Justiça — a proposta acaba com o Conselho Nacional de Justiça.
O que as entidades da magistratura não conseguiram fazer pela via judicial, porque não tiveram suas ações acolhidas pelo STF, está sendo feito, agora, por meio de portarias editadas pelo presidente do Conselho, e chegará ao ápice com a aprovação na nova Loman. E o ápice é o fim do CNJ, pois a ideia de fundo das ações é suprimir da sociedade a possibilidade de controlar a atuação da magistratura e cobrar dela a necessária prestação de contas acerca do trabalho desenvolvido.
Muitos podem dizer que essa seria uma leitura exagerada do texto da nova Loman e das ações da Presidência do CNJ. Então, vamos ao projeto. Em seu artigo 92, inciso IV, o texto fixa como prerrogativa de juízes e desembargadores “não ser interrogado em processo disciplinar ou criminal, a não ser por magistrado de instância igual ou superior, ainda que integrante ou designado pelo Conselho Nacional de Justiça”. Ora, seis dos 15 membros do CNJ não são magistrados. Outros são juízes de primeira instância. Quem tomaria depoimento, por exemplo, de um desembargador investigado por corrupção? Um colega seu. Se isso não é um privilégio indevido, será difícil nomear o que seja.
Há mais. A proposta impede o CNJ de “criar novas atribuições por meio de atos internos do Plenário ou de quaisquer de seus órgãos fracionários”. Na prática, por exemplo, o Conselho não poderá mais tomar a iniciativa de propor ações como as semanas de conciliação ou os mutirões carcerários. Metas de julgamento, então, nem pensar, já que o artigo 273, parágrafo 5º, do projeto, é bem claro ao afirmar que “as metas e demais determinações aos tribunais” só poderão ser estabelecidas “após a oitiva dos seus respectivos presidentes”. O parágrafo 2º, do mesmo artigo, de outro lado, impede claramente o CNJ de expedir “normas abstratas”, conceito no qual se insere, por exemplo, a resolução sobre nepotismo, festejada pela sociedade brasileira em outubro de 2005, quando foi editada.
Os pontos destacados são apenas amostras de uma proposta que parece feita sob medida para esvaziar o Conselho. Por se tratar de um anteprojeto em discussão, as medidas ainda não estão em vigor. Mas, enquanto não vigoram, o CNJ está sendo enquadrado por meio de portarias.
Sem qualquer discussão prévia com o Plenário, o presidente do órgão criou dois conselhos consultivos para assessorar sua gestão. Um é formado por presidentes de associações de classe da magistratura. Outro por integrantes do chamado “Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça”, entidade de caráter privado, que não integra a estrutura judiciária brasileira.
Com justificativas bastante subjetivas, como “a necessidade de defesa das garantias e direitos dos magistrados” e a “necessidade de estabelecer rotina de atenção prévia no trato de assuntos de interesse direto da magistratura nacional”, na prática, e com o devido respeito, o presidente trouxe para dentro de sua gestão o lobby direto dos juízes, que poderão fazer pressão para pautar e tirar de pauta os temas que lhes interessam.
E a história — novamente ela — está recheada de exemplos de que a pauta corporativa dos juízes nem sempre é a pauta da sociedade. Para que não haja dúvidas: as portarias permitem que os líderes de entidades de classes de juízes, portadores legítimos das bandeiras corporativistas de sua classe, ditem a pauta do órgão de controle dos juízes. Salta aos olhos a incoerência. E é sempre bom lembrar: O CNJ é do Brasil, não dos seus juízes.
A sua principal missão é trabalhar pelo aperfeiçoamento da prestação da justiça, para que o Judiciário se torne transparente e que suas decisões sejam tomadas em tempo hábil. O papel vem sendo cumprido com excelência, na medida do possível, pelas composições dos últimos dez anos. Mas todo o trabalho está prestes a ser jogado fora.
Repito: estão em pleno curso os preparativos do cortejo fúnebre do CNJ. A bem da verdade, o cortejo já saiu. Cabe a nós, inspirados pela Páscoa que acabamos de celebrar, agir acreditando no milagre da ressurreição para impedir o enterro deste importante órgão da República.
Revista Consultor Jurídico, 09 de abril de 2015.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

PL sobre mediação é aprovado na CCJ da Câmara

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (7/4) um projeto de lei que regulamenta o uso da mediação, em casos judiciais ou extrajudiciais. O texto passou em caráter conclusivo, e por isso não precisará ser votado pelo Plenário da Casa, exceto se houver recurso. Como passou por modificações, vai voltar ao Senado.
Não existe hoje uma lei específica sobre o tema, apenas uma resolução do Conselho Nacional de Justiça. O PL 7.169/2014 define que todas as mediações serão confidenciais e poderão ser feitas pela internet ou por outros meios de comunicação à distância. Diz ainda que o Poder Público pode criar câmaras para prevenir e resolver por conta própria questões administrativas.
Quando processos forem protocolados no Judiciário, caberá ao juiz responsável enviar cada caso ao mediador judicial, se considerar que a controvérsia poderá ser resolvida dessa forma. O prazo de negociação será de 60 dias. Mas o texto afirma que ninguém poderá ser obrigado a passar pelo procedimento.
Qualquer pessoa com confiança das partes poderá ser mediador extrajudicial, sem precisar se inscrever em qualquer tipo de conselho ou associação. Já o mediador judicial deverá ser graduado há pelo menos dois anos em curso superior e ter capacitação em instituição reconhecida pela Escola Nacional de Formação de Magistrados ou pelos próprios tribunais. Caberá a cada tribunal manter o cadastro deles e definir a remuneração, a ser paga pelas partes do processo.
Segundo a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, a comissão decidiu que a proposta não valerá para conflitos trabalhistas individuais e coletivos, que deverão ser tratados em lei específica.
A mediação é uma das apostas para desafogar a Justiça brasileira. O governo federal, que acompanha o andamento da proposta por meio da Secretaria de Reforma do Judiciário, esperava que as regras fossem criadas em 2014. Outro projeto, que altera a Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), foi enviado em março ao Senado Federal.
 Com informações da Agência Câmara Notícias.