terça-feira, 19 de julho de 2011

PEC dos Recursos em debate

          Em artigo publicado na Folha de São Paulo, de 29 de junho deste ano, sob o título "Impunidade e a PEC dos Recursos", o ministro Jorge Hage esclarece que todos os sistemas judiciários adotam meios para a correção de suas decisões que, costumeiramente, são agrupadas pela doutrina em duas categorias: os recursos e as ações autônomas de impugnação.

          A diferença essencial é que os recursos atacam a decisão antes do trânsito em julgado, prolongando a duração do processo, já as ações autônomas de impugnação, ou ações rescisórias, servem para rescindir a decisão, após o trânsito em julgado (quando a sentença já começou a produzir seus efeitos). Mas os dois instrumentos servem ao mesmo propósito: garantir a não perpetuação de injustiça ou de nulidade.

          Indaga, Hage: "Qual deveria ser, então, o critério para a escolha por uma ou outra dessas espécies? Dentre outros, a maior ou menor probabilidade de ocorrência de equívocos naquela altura do processo. Se elevada, vale a pena sacrificar a rapidez do desfecho, vale dizer, deve-se optar pelos recursos. Ao contrário, se baixa a probabilidade de erro e consequente reforma, deve-se optar pelas ações autônomas, que não impedem o imediato cumprimento da decisão".

          Na sua visão, no Brasil, campeão mundial em recursos, a PEC apresentada pelo ministro Peluso é oportuna porque substitui os recursos especial e extraordinário, que vêm fazendo o STJ e o STF serem usados como 3a. e 4a. instâncias (não previstas aqui nem alhures), por ações rescisórias. E conclui: "Se aprovada essa emenda, o Brasil aproximará seu sistema judiciário dos padrões de países em que as garantias processuais dos réus não são biombos para a impunidade". E finaliza enfatizando que não é por ofensa à ampla defesa que nosso país se expõe à crítica internacional, mas, sim, por dificilmente conseguir colocar na cadeia os corruptos e os criminosos da alta fiança.

          Por sua vez, ao defender na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 15/2011), conhecida por PEC dos Recursos, o ministro Cezar Peluso afirmou se tratar de uma "revolução pacífica" para melhorar a eficiência da Justiça brasileira contra um "sistema jurisdicional perverso e ineficiente".

          Embasado em dados estatísticos por ele apresentados, demonstrou que nos últimos 29 meses foram autuados no STF 133.754 recursos apenas na esfera cível, sendo que 53.189 foram devolvidos pela Presidência do Supremo por inviabilidade - 40% do total. Dos 80.565 recursos que foram distribuídos, 75.315 tiveram provimento negado, ou seja ficou mantido o entendimento da instância anterior. Em somente 4% do total de recursos houve mudança de entendimento.

          Como os dados revelam que a quantidade de recursos que tem a decisão das instâncias anteriores modificada é muito pequena, o ministro classificou o sistema de "ineficiente, danoso e perverso, que prejudica 95% das pessoas que procuram o Judiciário." Para ele, são pessoas que procuram a Justiça com razão e que só verão sua causa ganha 10, 15, 20 e não raro 30 anos depois. Citou como exemplo as ações expropriatórias, cujas indenizações não são recebidas pelos credores originais, mas por seus filhos e netos.

          Observando que na esfera criminal a situação não é diferente, afirmou que a demora nesses casos traz uma impressão de impunidade para a sociedade e o risco de impunidade  se efetiva com a prescrição dos processos em razão da demora na tramitação.

          Citando estudo da Fundação Getúlio Vargas que aponta 37 vias de acesso ao STF, por meio de recursos exraordinários, agravos regimentais e de instrumento, embargos e outros, observou que a PEC dos Recusos pretende exatamente barrar o uso indiscriminado desses recursos.

           Na defesa feita no Senado, o presidente do Supremo procurou deixar claro que a proposta não vai impedir que o cidadão recorra à Justiça caso se sinta prejudicado. Haverá a antecipação do trânsito em julgado das decisões, mas sem abolir os recursos que continuarão existindo tanto no Supremo Tribunal quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A diferença,segundo ele, é que tais recursos assumem tecnicamente a função rescindente ou rescisória.

          Ao terminar a sua explanação, o ministro Peluso procurou desconstituir alguns mitos criados em torno da discussão da proposta, como ameaça aos direitos e garantias individuais, ofensa ao chamado princípio de inocência, a ameaça à uniformização do entendimento das leis pelos tribunais superiores e o prejuízo para o cidadão com a redução dos graus de jurisdição.

        Explicou que nenhum país civilizado tem quatro  instâncias de jurisdição como o Brasil. "Duplo grau de jurisdição é suficiente para a garantia do Estado Democrático de Direito, tanto que é duplo grau e não quádrupo", salientou.

          Ao terminar a sua explanação, rebatendo a ideia de desconfiança em relação aos juízes de primeiro e segundo graus, disse que a proposta irá valorizar esses juízes, até porque os tribunais superiores em geral mantém 96% das decisões dos tribunais locais ou regionais.

          Não resta dúvida que o tema é polêmico e exige debate e reflexão. Nesse sentido, como uma forma de contribuir para o debate, a Escola de Direito do RJ da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a partir de 22 de março deste ano, abriu espaço para que todos os operadores do direito, acadêmicos e interessados,  possam ajudar a construir a melhor proposta de alteração da Constituição, no seguinte endereço eletrônico: http://www.democraciaonline.fgv.br/   

          Sobre o assunto, ver minhas postagens de 27.01.11, 12.02.11, 16.04.11 e 07.04.11.      


sábado, 16 de julho de 2011

Notícias Interessantes

 1.          Ações contra os planos de saúde.        
             
             Em matéria relatada pelo conselheiro Milton Nobre, foi aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça, dia 05.07, recomendação a todos os tribunais no sentido de adotarem medidas para subsidiar os magistrados e demais operadores do direito no estudo e julgamento das ações contra os planos de saúde.

            Por intermédio do Forum de Saúde, o CNJ tem monitorado as ações judiciais na área. Os dois primeiros levanamentos constataram a existência de 241.000 processos em tramitação nos tribunais do país.  O Forum Nacional do Judiciário para a Saúde passará a monitorar as demandas judiciais referentes ao setor, notadamente as que tiverem como partes as operadoras de plano de saúde suplementar.

            Do ponto de vista prático, o texto recomenda aos tribunais que celebrem convênios, sem qualquer ônus, para oferecimento de apoio técnico aos magistrados, de médicos e farmacêuticos indicados pelos comitês executivos estaduais do Forum de Saúde, que auxiliarão os juízes e desembargadores na formação de um juízo de valor quanto à apreciação das questões clínicas apresentadas pelas partes. Os magistrados também serão orientados, por meio das corregedorias de seus tribunais, a oficiar à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ao Conselho Federal de Medicina (CFM) e ao Conselho Federal de Odontologia (CFO) sobre os processos. A pretensão é fazer com que tais entidades possam se manifestar sobre a matéria debatida dentro de suas atribuições e sobre obrigações regulamentares das operadoras, bem como medicamentos, materiais, órteses, próteses e tratamentos experimentais.

2.          Ações coletivas não impedem o ajuizamento de ação individual

            Conforme decisão da 1ª Turma do TRT - MG, embasada no artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor, o ajuizamento de ação coletiva pelo sindicato da categoria, na condição de substituto processual, não impede que o trabalhador peça os mesmos direitos em ação individual, uma vez que não ocorre litispendência (quando, em duas ou mais ações, as partes, as causas de pedir e os pedidos são idênticos, na forma prevista no artigo 301, § 2 º do CPC). A desembargadora Maria Laura Franco Lima de Faria enfatizou que a legitimidade da entidade sindical para propor ação coletiva não pode se sobrepor ao interesse do próprio titular do direito em fazer o mesmo pedido, individualmente.

3.         Destruição  de documentos do período da ditadura militar

            Em ofício, datado de 07.07.11, encaminhado ao Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, solicitou a abertura de inquérito civil público para a apuração de possível crime praticado por funcionários da administração pública, que teriam inutilizado documentos do período da ditadura militar (1964-1985). O requerimento foi fundamentado em declarações recentes do ministro da Defesa, Nelson Jobim, de que documentos públicos mantidos em sigilo, referentes ao período de exceção "desapareceram, foram consumidos à época". Ophir destacou que a destruição de documentos, que pode ter havido no caso, é crime definido no artigo 314 do Código Penal, com punição prevista de um a quatro anos de prisão, se o fato não constituir crime mais grave.

            Na hipótese de se comprovar a prática de ato criminoso em relação aos documentos desaparecidos no período da ditadura, Ophir ressaltou que não cabem alegação de anistia nem de ocorrência da precrição penal, pois esses argumentos já foram afastados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

4.          Pesquisa do CNJ sobre a efetividade da conciliação.

            O Conselho Nacional de Justiça vai pesquisar a efetividade da conciliação no Brasil. "Queremos saber qual é a realidade da conciliação no país", afirmou a conselheira Morgana Richa, que presidiu reunião sobre a pesquisa nesta terça-feira (12.07), na sede do Conselho, em Brasília.

            Atualmente, todos os tribunais que participam da Semana Nacional da Conciliação informam ao CNJ quantas audiências foram realizadas e quantos acordos foram firmados. A ideia é que o CNJ receba essas informações sobre o desempenho da conciliação, mensalmente, por intermédio dos centros de conciliação.

5.          Isenção de custas processuais em processos resolvidos pela conciliação ou mediação

             O Conselho Nacional de Justiça estuda a criação de um projeto de lei para isentar de custas processuais as pessoas que resolverem suas disputas em audiência de conciliação e mediação. A ideia será discutida no segundo semestre deste ano e, se concretizada, deve ser enviada para votação no Congresso Nacional.

             De acordo com o presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, a isenção pode incentivar a utilização das vias alternativas de resolução de conflitos como meios de se chegar a conclusões pacíficas nos processos. "É preciso criar uma cultura de conciliação no país", afirmou. (Sobre a importância da mediação, ver meu artigo postado em 15.06.11).



terça-feira, 5 de julho de 2011

Homicídio e estupro X Violência contra as mulheres

          Objetivando ampliar dados e direcionar políticas de violência doméstica, os homicídios no país passarão a ser contabilizados pelo governo federal com recorte por gênero. Juntamente com o Ministério da Justiça, a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) prepara a criação de um protocolo de ocorrências policiais para coletar dados confiáveis sobre a violência contra a mulher. Atualmente, muitas unidades da Federação - como Rio Grande do Sul, Paraná, Sergipe e Tocantins - não diferenciam assassinatos de homens e mulheres. A pretensão é que todos os policiais militares e civis passem a registrar o sexo das vítimas de homicídio, ajudando a nortear políticas para o setor.

          Estimativas apontam que houve aumento médio de 30% de homicídos contra as mulheres (femicídio) na última década. Sem resposta eficiente do Estado, a violência doméstica persiste, apesar da aprovação da Lei Maria da Penha, em 2006.

          No Brasil, desde o início de 2000, as políticas de segurança preocupam-se em reduzir o número de homicídios, com prioridade para  negros e pobres. Mas não há essa mesma preocupação em relação às mulheres.

          Na verdade, a elevada proporção de homens vítimas de homicídio, mascara o fenômeno do femicídio, pouco estudado no País. Nas palavras de Wânia Pasionato do Núcleo de Estudo de Gênero da Universidade de São Paulo (USP): "Estamos num país que não conta suas mortes como deveria. O máximo que sabemos é o tipo de instrumento. Precisamos entender onde essas mulheres estão, de quais meios participam e em que contexto são assassinadas. Só assim poderemos propor uma categoria de morte".

          Diversamente de países como Costa Rica, Guatemala, Chile, Colômbia e El Salvador, que além de monitorarem as mortes de mulheres, tipificam o crime em lei, nosso país não faz nem uma coisa, nem outra.

          Inobstante serem falhas as estatísticas, um dado é incontestável: houve um grande aumento no assassinato de mulheres. No ano passado 4,5 mil mulheres foram vítimas de homicídio. No Pará, o índice chegou a 256%. Em Alagoas foi de 104%. Em São Paulo, cresceu de 9% para 15%. No Espírito Santo, passou de 7% para 10,3%, no ano passado. Em Goiás, em 2010, 200 mulheres foram assassinadas, atingindo uma média superior a de Ciudad Juarez, no México (176 casos por ano), uma das regiões mais violentas da América Latina.

          Além da violência doméstica que persiste, apesar da Lei Maria da Penha - há uma certa resistência da sociedade machista em aplicá-la - são cada vez maiores as mortes de mulheres por organizações ligadas ao tráfico de drogas.

          Conforme reportagem do Correio Braziliense de 17 de abril deste ano, a dificuldade em mapear as informações é a primeira comprovação da invisibilidade do problema para o Poder Público.

          O levantamento feito pelo jornal, que considerou dados das secretarias de segurança pública, das polícias e dos movimentos feministas, informa que, em média, 4,6 mulheres são assassinadas, num universo de 100 mil habitantes do sexo feminino. Tais índices, sozinhos, são iguais ou mesmo superam a taxa total de homicídios (homens e mulheres), de países europeus ocidentais, que conforme dados da Organização Mundial da Saúde, são de 3 a 4 por 100 mil, da América do Norte (2 a 6) e na Austrália ( 2 a 3).

          É  de se esperar que, com o mapeamento dos homicídios por gênero, haja uma mudança de postura no combate ao assassinato de mulheres, inclusive com mudança na legislação penal para tipificar o crime como femicídio, a exemplo de outros países. Urge que esse crime, em que os homens acreditam ter o poder sobre a vida das mulheres, deixe de ser invisível aos olhos das autoridades.

         Outro tipo de delito, que tem aumentado assustadoramente, em que a maioria das vítimas são mulheres é o da violência sexual. Em apenas 10 dias, 9 homens foram presos no Distrito Federal por terem cometido estupros. Nos cinco primeiros meses deste ano, foram registrados 283 casos de estupros.

          Contudo, embora haja aumento dessa prática, a punição para coibí-la, lamentavelmente, tem sido menos severa, quando deveria ser o contrário.

          Isso tem ocorrido, porque antigamente, o Código Penal tipificava esses delitos em dois artigos: o artigo 213, estabelecendo como crime de estupro o ato de constranger a mulher à conjunção carnal, por meio de violência ou ameaça grave. Já o artigo 214 definia como atentado violento ao pudor o uso de força física para obrigar alguém a praticar ou permitir que com ele praticasse ato libidinoso, diverso da conjunção carnal.

          A lei nº 2.015, de agosto de 2009, entretanto, revogou o artigo 214 e alterou o artigo 213 do Código Penal, deefinindo como crime de estupro o fato de "se constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou a permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso". A pena é de 6 a 10 anos de reclusão, podendo sofrer aumento, dependendo das condições em que o crime foi praticado.

          A partir daí, os magistrados passaram a divergir na aplicação do no artigo. Muitos juízes, inclusive desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e ministros da 6ª turma do Superior Tribunal de Justiça, passaram a entender que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, praticados contra a mesma vítima, em um mesmo contexto, são crime único, ou de ação continuada, segundo a nova legislação. Em razão disso, os réus condenados por estupro e atentado violento ao pudor antes da lei 12.015/09, passaram a conseguir a redução da pena, às vezes até pela metade.

         Em julgamento ocorrido agora recentemente, em junho, entretanto, a quinta turma do Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar a lei 12.015/2009, adotou a tese de que o novo crime de estupro é um tipo misto cumulativo, ou seja, as condutas de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso, embora reunidas em um mesmo artigo de lei, com uma só cominação de pena, serão punidas individualmente, se o agente praticar ambas, somando-se as penas. Havendo condutas com modo de execução distinto, não se pode reconhecer a continuidade do delito.

          Esse novo entendimento do STJ, caso prevaleça, modificará a postura até então majoritariamente adotada pela Justiça, que como afirmou o ministro Félix Fischer em seu voto, "enfraquece, em muito, a proteção da liberdade sexual porque a sua violação é crime hediondo que deixa marca permanente nas vítimas".

         O fato é que a redução do cumprimento da pena nos crimes de violência sexual  tem gerado sensação de impunidade, dificultando a recuperação das vítimas, em sua grande maioria mulheres, que sentiram na pele a violência do abuso sexual.

          


         

sábado, 2 de julho de 2011

O STF e a regulamentação do aviso prévio

          O pré-anúncio de uma das partes, manifestando seu desejo de rescindir as relações contratuais, vigora há muito tempo em nosso direito. Assim é que já existia no artigo 81 do Código Comercial de 1850, no artigo 1.221 do Código Civil de 1916 e na Consolidação das Leis do Trabalho nos artigos 487 a 491, onde ganhou aspecto relevante na relação laboral.

          Tanto é verdade que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu em seu artigo 7º, inciso XXI: "Artigo 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXI- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo mínimo de trinta dias, nos termos da lei".

          Contudo, como muitos outros dispositivos constitucionais pendentes de regulamentação, este artigo quase 23 anos após a vigência da Constituição, também não foi regulamentado. Ante a omissão legal, os empregadores vinham aplicando a todos os trabalhadores mensalistas o prazo mínimo de 30 dias, independentemente do tempo de serviço.

          Quatro trabalhadores da Vale, porém, com tempo de serviço entre 7 e 30 anos, sentindo-se lesados, impetraram Mandado de Injunção no Supremo Tribunal. Pleitearam que o tribunal, suprindo a lacuna do Legislativo, fixe regras a serem seguidas pelos empregadores, até que o Congresso Nacional vote lei específica sobre a questão.

          Acatando o pedido dos autores, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no dia 22 de junho, que irá fixar as regras para que o aviso prévio seja proporcional ao tempo de serviço prestado. Embora concordassem com o relator, ministro Gilmar Mendes, sobre a procedência do pedido, os ministros não chegaram a um consenso sobre qual regra a ser aplicada.

          O ministro Marco Aurélio propôs 10 dias de aviso prévio para cada ano trabalhado, além do período de 30 dias. Já o ministro Luiz Fux propôs três meses de salário para cada 10 anos de serviço, além do piso de 30 dias. Cezar Peluso sugeriu um salário extra a cada seis anos de trabalho e Lewandovski sugeriu uma escala: indenização de 30 dias por tempo de serviço inferior a um ano; 45 dias para mais de um ano e 60 dias para contratos rescindidos com mais de 10 anos.

          Em decorrência, o julgamento foi suspenso para que o relator elabore seu voto sugerindo as regras a serem definidas. Segundo ele, analisará resolução da  OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre a matéria, além dos projetos de lei que tratam do tema. Não foi fixada data para conclusão do julgamento.

          As regras de compensação para empregados demitidos variam de país para país.

         Nos EUA, não há lei obrigando as empresas a pagar nada similar com o aviso prévio brasileiro. Mas de acordo com Aloísio Buoro, professor de gestão e administração do Insper, 70% e 80% das companhias oferecem um benefício parecido. Em geral é paga quantia referente a duas semanas de trabalho a quem permaneceu na empresa por pelo menos 12 meses. A partir desse patamar, leva-se em conta não só o tempo de serviço, mas também o cargo do funcionário. Gerentes chegam a receber o equivalente a 26 semanas (6 meses) em caso de demissão, e executivos em postos mais altos, até 52 semanas (12 meses).

          Na França a variação se dá segundo o modelo de contratação. Se o contrato for por tempo indeterminado, o pagamento é de 10% do salário por ano trabalhado. Se for por tempo determinado (máximo de 18 meses), o pagamento é de 6% do salário pelo período trabalhado.

          Conforme voto do ministro Luiz Fux, na Alemanha, na Dinamarca e na Suíça, o aviso prévio vai de três a seis meses. Na Itália, o prazo pode chegar a quatro meses. A diferença depende da duração do contrato de trabalho e da idade do trabalhador.

           Na ótica da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a solução mais adequada obedeceria o seguinte critério: aviso prévio de 30 dias para quem tem 10 anos na mesma empresa; 45 dias para trabalhadores com registro entre 10 e 15 anos e 60 dias para aqueles com contrato entre 15 e 20 anos.

          A postura sinalizada pelo STF, no sentido de fixar regras para que o aviso prévio seja proporcional ao tempo de serviço do trabalhador, vai de encontro a uma das principais bandeiras do movimento sindical.

          De fato, as centrais sindicais têm pressionado o Congresso para aprovar a Convenção 158 da OIT, que dificulta a demissão sem justa causa. Na opinião do secretário geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, "a tendência é que as demissões imotivadas diminuam um pouco, pois elas passarão a ficar mais caras por causa do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço".

          A Convenção 158 da OIT prevê três tipos de indenização a cargo do empregador:
          a) a do artigo 10, que trata da reintegração ou indenização. É arbitrada porque não houve justificação para a dispensa;
            b) a do artigo 11 que prevê a concessão de aviso prévio razoável ou, em seu lugar uma indenização;
            c) a do artigo 12, em razão do término do contrato de trabalho.

          De qualquer forma, caberá ao ministro Gilmar Mendes, à luz de alguns parâmetros como: o direito comparado (previsto no artigo 8º da CLT para quando não há previsão em lei), Convenção da OIT, projetos em tramitação no Congresso, elaborar seu voto com a proposta a ser levada a aprovação dos demais ministros, regulamentando o inciso XXI do artigo 7º da Carta Magna.