sábado, 27 de junho de 2015

OAB contra a nova PEC dos precatórios

O conto do vigário dos precatórios
MARCO ANTONIO INNOCENTI - O ESTADO DE S.PAULO*
O governador e o prefeito de São Paulo, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, lançaram um engodo no Congresso Nacional travestido de carta de boas intenções. Para anular decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que manda Estados e municípios pagarem seus precatórios até 2020, redigiram uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que, ao contrário do discurso, inviabiliza a ordem judicial, jogando mais uma vez para as calendas gregas os pagamentos.
É fácil de entender. O STF determinou o pagamento da dívida em 5 anos, a partir de janeiro de 2016, em parcelas mensais que correspondam a 1/60 do valor total, de forma a quitá-la totalmente até o fim de 2020.
Para isso, o desembolso mensal deve ser elevado. Mas, em vez de aumentar, o projeto reduz o montante. Possibilita o pagamento pela média dos valores pagos entre 2010 a 2014, período em que os desembolsos foram bem menores. Na prática, o fluxo de recursos cairá entre 30% e 40% em relação ao que é destinado atualmente.
Se os valores pagos hoje são insuficientes para cumprir a decisão, como seria possível diminuí-los e, ainda assim, quitar a dívida até 2020? Tome-se como exemplo o caso do Município e do Estado de São Paulo. Juntos, devem 40% do estoque nacional, estimado em R$ 97 bilhões pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A Prefeitura paga cerca de R$ 110 milhões ao mês. Para obedecer ao STF, deveria triplicar essa quantia. Mas a PEC sugerida permite que se pague ainda menos do que é pago hoje.
O projeto incorpora algumas medidas que podem até auxiliar no financiamento da diferença dos recursos necessários para cumprir o prazo fixado pelo STF, entre elas a autorização para realização de operações de crédito. Mas não há na proposta enviada à Câmara nenhuma garantia de que tais operações serão de fato levadas a efeito na amortização dos pagamentos.Pelo projeto, a única obrigação que Estados e municípios teriam, a partir do ano que vem, seria desembolsar, mensalmente até o fim de 2020, a média do que pagaram nos últimos 5 anos. Nenhum centavo a mais. Não se prevê nenhuma sanção se a diferença não for paga. E, se não prevê, é porque não se pretende pagar.
A única razão que tem levado as entidades públicas a pagar precatórios é o conjunto de sanções previsto no § 10 do art. 97-ADCT, especialmente o sequestro de rendas, o que levou o STF a mantê-lo como garantia de que os débitos vencidos serão, de fato, liquidados até 2020 mediante amortizações mensais correspondentes ao valor total da dívida. Ao retirar as sanções fixadas, deixando ao critério das próprias entidades devedoras a utilização dos mecanismos de financiamento previstos, é bastante óbvio que o projeto pretende apenas reeditar um novo calote contra os credores, aplicando um bypass na decisão proferida pelo Supremo.
As condições impostas pelo STF para a liquidação dos débitos, resultantes do julgamento da modulação da decisão proferida na ADI 4357, são perfeitamente factíveis, ainda mais considerando a implementação de medidas que não só reduzirão a dívida, como propiciarão condições de financiamento. Contudo, é essencial que a referida proposta legislativa mantenha as sanções que, tal como fixadas, garantam, já a partir de janeiro de 2016, a satisfação integral do pagamento, sob pena de sequestro da diferença mensal correspondente ao valor necessário à liquidação dos precatórios vencidos até o final do exercício de 2020.
Da forma como foi apresentado, apenas para fugir dos critérios estabelecidos pelo STF, sem nenhuma obrigatoriedade na satisfação dos pagamentos integrais, o projeto do governador e do prefeito é um engodo. Merece o mais veemente repúdio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pois propiciará, na prática, a partir de 2016 (ano eleitoral), uma substancial redução dos pagamentos mensais de precatórios, resultando, em pouco tempo, no aumento da dívida, criando uma situação ainda mais grave que a atual, em total desarmonia com o julgamento do STF.
* É presidente da Comissão de Precatórios da OAB Nacional

sexta-feira, 26 de junho de 2015

OAB contra proposta de adiamento do novo CPC

OAB critica proposta de adiar novo Código de Processo Civil
A proposta do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes de adiar por até cinco anos o início da vigência do novo CPC (Código do Processo Civil) gerou polêmica nesta terça (23).
O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Marcus Vinicius Furtado Coêlho, reagiu: ''A sociedade não tolera mais um Judiciário moroso, onde os litígios são eternos. Adiar a vigência do novo CPC vai na contramão deste desejo'', afirmou.
Mendes rebateu. Disse que alterar prazos processuais de cinco dias corridos para cinco dias úteis, demanda dos advogados incluída no CPC, prejudicam a celeridade dos processos. "Quem tem pressa não adota esse tipo de critério [...]. Se querem atender determinados interesses, coloquem placa", afirmou.
Sancionado em março, o novo CPC está programado para entrar em vigor em março de 2016. Mendes teme que o STF fique sobrecarregado. Hoje, quem decide se o recurso sobe ou não a tribunal superior é a corte de origem. Agora, caberá aos ministros do STF opinarem sobre isso.
Além de voltar a defender o adiamento, Mendes criticou quem não abre mão da data sancionada pelo Congresso: ''Calcem um pouco as sandálias da humildade", disse.
Sua ideia é alterar o início da vigência via projeto de lei, o que está sendo costurado pelo ministro no Congresso. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi procurado por Mendes. Nesta terça, o ministro voltou a conversar com Cunha, acompanhado pelo ministro José Dias Toffoli.
Apesar dos pedidos dos magistrados, Cunha defendeu que o CPC deve entrar em vigor no prazo previsto e, como solução para o problema do excesso de trabalho, sugeriu que o Congresso aprove até o fim do ano um projeto de lei para restabelecer a regra tradicional de aceitação de recursos.
O peemedebista informou ainda que já pediu para que os magistrados enviem um projeto de lei para o Congresso para tratar do assunto.
Coêlho diz que a retirada da admissibilidade pelo presidente do tribunal dos recursos ao STJ e ao STF não foi formulada pela OAB. E diz que, se os tribunais superiores entendem que tal medida vai inviabilizar seu funcionamento, " mais adequado é apenas alterar esta regra, possibilitando que o novo CPC entre em vigor no prazo previsto".
A reforma foi elaborada por uma comissão de juristas, coordenada pelo ministro do STF Luiz Fux antes de ser submetida aos congressistas. A discussão durou cinco anos.
O presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, disse à Folha que o tribunal estará preparado para receber o novo código dentro do prazo estabelecido pelo Congresso.

terça-feira, 23 de junho de 2015

TJ-SP é denunciado à ONU por remover juiz que não privilegia prisões

O Tribunal de Justiça de São Paulo foi denunciado nesta segunda-feira (22/6) no Conselho de Direitos Humanos da ONU por afastar de suas áreas juízes que, supostamente, emitem sentenças mais favoráveis à liberdade do que à prisão. A denúncia foi feita pela organização não governamental Conectas Direitos Humanos e pela Associação de Juízes pela Democracia (AJD).
O caso levado como exemplo foi o do juiz Roberto Luiz Corcioli Filho, afastado da área criminal desde 2013 a pedido do Ministério Público. Segundo a Conectas, um e-mail da Presidência do TJ-SP foi recebido pelo juiz afirmando que o afastamento foi por conta do teor garantista de suas decisões. Procurado pela reportagem, o TJ-SP afirmou que "atendendo a pedido do próprio magistrado, o designou para a 2ª Vara Cível da Comarca de Itapevi".
Embora use o caso como paradigma, a Conectas afirma que a prática é sistemática e atinge outros magistrados. Para as entidades que denunciaram o TJ-SP à ONU, esta postura do tribunal vem contribuindo com a cultura de encarceramento em massa no estado que já tem a maior população carcerária do país. Segundo as organizações, o caso demonstra como a falta de critérios impessoais e objetivos para a nomeação e movimentação de magistrados tem prejudicado a independência judicial no país. 
"A atual política de encarceramento em massa do Brasil contribui para a ocorrência de graves violações de direitos humanos cometidas dentro do sistema prisional brasileiro e leva o Brasil ao terceiro lugar dos países que mais prendem no mundo. O Poder Judiciário tem um papel determinante dentro dessa política e, no mínimo, deve preservar as garantias de uma prestação jurisdicional independente. O controle ideológico de juízes que rompem com a cultura da prisão deve ser banido", disse a Conectas no pronunciamento oral na ONU.
No Supremo
Após ter sido afastado, o juiz recorreu ao Conselho Nacional de Justiça que decidiu, em junho de 2014, que o juiz deveria voltar à vara criminal e determinou que o TJ-SP criasse em 60 dias regulamentação para as designações de juízes. 
No entanto, o TJ-SP recorreu da decisão no Supremo Tribunal Federal e uma liminar proferida pelo ministro Ricardo Lewandowski suspendeu a decisão do CNJ. Agora, o Mandado de Segurança (MS 33.078) aguarda decisão da ministra Rosa Weber. Em maio, a Conectas pediu para ingressar no processo como amigo da corte, mas o pedido ainda não foi analisado.
A Procuradoria-Geral da República se manifestou pela improcedência do MS. "O que não se admite, em nenhuma hipótese, é a possibilidade de os juízes serem designados para atuar nas diversas unidades de competência sem nenhum critério anterior conhecido, permitindo, em tese, direcionamentos, favorecimentos ou perseguições, em afronta às garantias da inamovibilidade e independência do juiz", afirmou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Revista Consultor Jurídico, 23 de junho de 2015, 7h43

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Excesso de prisões na "lava jato" X crise da Justiça

O excesso de prisões processuais na "lava jato" demonstra crise da justiça

Alana Abílio Diniz Vila-Nova e Daniel Augusto Diniz Vila-Nova

Na manhã desta sexta-feira (19/6), a Polícia Federal deflagrou a 14ª fase da operação "lava jato" — batizada de operação erga omnes. Desta vez, os alvos envolvem a cúpula da diretoria de duas das maiores empreiteiras do país, suspeitas de corrupção e cartel.
Segundo noticiado, cerca de 220 policiais federais cumprem 59 mandados judiciais em quatro estados (Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul), sendo 38 mandados de busca e apreensão, nove mandados de condução coercitiva, oito mandados de prisão preventiva e quatro mandados de prisão temporária.
Nas primeiras 13 fases da operação "lava jato", a Polícia Federal cumpriu mais de 400 mandados judiciais, que incluem prisões preventivas, temporárias, busca e apreensão e condução coercitiva. Ao todo, 19 ações penais e cinco ações civis públicas foram instauradas na Justiça Federal. O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da "lava jato" na primeira instância, até o presente momento, aceitou por volta de 80 denúncias.
Se consideramos os números de prisões processuais realizadas relativamente ao número de denúncias aceitas pelo Poder Judiciário, teremos um retrato claro da excessiva utilização da prisão processual no Brasil.
Segundo estudos do CNJ, o número de “presos provisórios” indica o percentual de 32% incidente sobre a população presa de 715.655 pessoas, chegar-se-ia ao quantitativo estimado de mais de 229 mil “presos provisórios” — esse montante não fica tão distante do número total de presos do México (país que, segundo o mesmo estudo do CNJ, possui 118 milhões habitantes e 249,9 mil “presos”, dentre condenados e provisórios)[1].
Destaca-se, que no universo das prisões processuais, há um dado que envolve aspectos de mais pura injustiça: os cidadãos temporariamente aprisionados que, ao final do processo, são absolvidos ou apenados com as denominadas “penas alternativas” (ou substitutivas à pena de prisão, nos termos do artigo 44 do Código Penal – CP – Decreto-Lei 2.848/1943).
Levando-se em conta pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), essas situações envolveriam, aproximadamente 37,2% do total de “presos provisórios” — ou seja, em mais de 1/3 dos casos[2]
Apesar dos dados alarmantes, continuamos a acompanhar, pela televisão, obig brother das prisões processuais no país.
Infelizmente, mesmo após quase 30 anos de vigência da Carta Cidadã, a prisão ainda não é tida medida excepcional, isso, sem dúvidas, demonstra crise no judiciário (ou, ao menos, na justiça).

[1] Estudo do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas, do CNJ (DMF/CNJ).
[2] Informe constante do Portal da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC)M disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-11/cadeias-brasileiras-abrigam-90-mil-presos-provisorios.
 é advogada, pós-graduada em Direito Público e em Direito Penal e Processo Penal pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
Daniel Augusto Diniz Vila Nova  é mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB).
Revista Consultor Jurídico, 19 de junho de 2015.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Justiça Restaurativa usada com jovens infratores do DF

As práticas de Justiça Restaurativa – método alternativo de solução de conflitos usado em diversas etapas dos processos criminais – serão implantadas no cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto por adolescentes no Distrito Federal a partir do segundo semestre. No DF, há 4.267 adolescentes cumprindo medidas socioeducativas, sendo que, destes, 1.659 cumprem medidas em meio aberto, o que engloba medidas de liberdade assistida e de trabalho comunitário. A Vara de Execução de Medidas Socioeducativas do DF (Vemse), que desenvolve o projeto, fará a capacitação de profissionais das 15 Unidades de Atendimento em Meio Aberto (UAMAs) do DF para aplicação dos círculos restaurativos.

O método da Justiça Restaurativa, que pode ser utilizado em qualquer etapa do processo criminal, consiste na aproximação entre vítima, agressor, suas famílias e a sociedade para a reparação dos danos causados por um crime ou infração e a solução de situações de conflito e violência. Dessa forma, a Justiça Restaurativa aplica o conceito de corresponsabilidade social do crime, envolvendo diferentes pessoas e instituições na resolução de um conflito, na reparação dos danos causados e na recuperação social do agressor.
A prática da Justiça Restaurativa é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Protocolo de Cooperação para a Difusão da Justiça Restaurativa, firmado em agosto de 2014 com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). A introdução da prática atende à Resolução 125/2010 do CNJ, que estimula a busca por soluções extrajudiciais para os conflitos. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) já possui um programa de Justiça Restaurativa em andamento, mas não contemplava adolescentes cumprindo medidas socioeducativas.

O projeto desenvolvido pela Seção de Assessoramento Técnico (SEAT) da Vemse, que tem o apoio da juíza da Vara de Infância e Juventude, Lavínia Tupy Vieira Fonseca, tem como objetivo a aplicação de práticas restaurativas, por meio da realização de círculos restaurativos envolvendo as famílias e os jovens que já estão cumprindo sentença em meio aberto.
“Acreditamos que é preciso priorizar as medidas em meio aberto, tornando mais efetivo o seu cumprimento e evitando que o jovem reincida no cometimento de atos infracionais e acabe cumprindo outra medida restritiva de liberdade futuramente”, diz Adelaide de Souza Ferreira, assistente social da Vemse e uma das responsáveis pelo projeto. “O grande objetivo das práticas restaurativas nesse momento da execução da medida é propiciar a reflexão acerca do ato infracional praticado, os motivos que o levaram a isso, não só para o adolescente, mas para sua família”, diz Adelaide.

As equipes das UAMAs, que receberão a capacitação para a aplicação das práticas restaurativas, são compostas por psicólogos, assistentes sociais, pedagogos e atendentes de reintegração social – esses profissionais também serão responsáveis por fazer a sensibilização dos jovens e suas famílias para adesão ao programa, o que deve ser feito de forma voluntária.
Presença da vítima – Embora a Justiça Restaurativa preconize que a vítima e o ofensor participem do círculo de encontros, especialmente quando este acontece antes da judicialização do conflito, no projeto a ser implantado com os adolescentes do DF, não necessariamente a vítima participará do encontro. Essa relação poderá ser realizada de forma indireta. “Caso a vítima não queira participar do encontro, podemos, por exemplo, gravar uma mensagem ou levar uma carta feita pelo adolescente à vítima, contando sobre os sentimentos dele que o levaram a cometer o ato e também é possível que a vítima mande uma mensagem a ele, caso sinta vontade de dizer algo”, diz Adelaide.

Na opinião do psicólogo Cássio, quando esse encontro entre vítima e ofensor acontece, há humanização do processo. “A vítima e o ofensor têm oportunidade de sair desse papel para se transformar em duas pessoas que se encontraram em determinada situação muito ruim, mas que pode ser ressignificada”, diz Cássio.

Risco de reincidência – Um grande diferencial do programa de Justiça Restaurativa a ser implantado com os adolescentes no DF em relação aos já desenvolvidos no país – como, por exemplo, na cidade de São Paulo, em que as práticas são aplicadas antes da judicialização do conflito – é a capacitação para avaliação do risco de reincidência dos jovens no crime. A ideia é que os profissionais que participarão dos círculos restaurativos com os jovens e suas famílias estejam aptos para avaliar fatores associados pela literatura técnica à persistência na conduta infracional.
Entre eles está a associação do jovem com pares antissociais, baixo desempenho escolar e abuso de álcool e outras drogas. “Outro fator de risco é a constatação de que o pai e a mãe não representam autoridade para o jovem, que tem dificuldade em demonstrar respeito por eles”, diz Cássio Marcelo Batista Veludo, psicólogo da Vemse.
A partir da identificação desses fatores, essas informações passarão a constar no Plano Individual de Atendimento (PIA) do jovem, pelo qual é feito o acompanhamento de todo o cumprimento da medida, fixando metas nos mais variados aspectos da vida, como o escolar, profissionalizante, familiar e social. Para auxiliar no cumprimento dessas metas, o programa deve contar com o apoio de programas de intervenção – uma das opções, por exemplo, é a parceria com faculdades -, que abordem treinamento para resolução de problemas, controle da raiva, habilidades parentais e uso abusivo de drogas.

Luiza de Carvalho Fariello
Agência CNJ de Notícias

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Tecnologias favorecem proteção a mulheres vítimas de violência

Tornozeleiras eletrônicas, botões com tecnologias sofisticadas e até aplicativos de celulares têm contribuído com o Judiciário para salvar a vida de mulheres vítimas de violência doméstica no Brasil. Utilizados no combate à violência e ao feminicídio, esses dispositivos ajudam a evitar novas agressões, aumentam o sentimento de segurança das mulheres, reduzem as ocorrências letais e permitem a prisão em flagrante dos agressores. Para a coordenadora do Movimento Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conselheira Ana Maria Amarante, “se a tecnologia puder ajudar a salvar vidas, ela é muito bem-vinda”.
Na Paraíba, que já foi um dos estados mais feminicidas do país, 70 mulheres contam, desde o ano passado, com ajuda de um dispositivo semelhante a um celular para acionar em caso de perigo iminente. Segundo a Coordenadora de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de João Pessoa, juíza Rita de Cássia Martins Andrade, muitas vidas já foram salvas. “Sentimos que esse monitoramento garante maior cumprimento das medidas pelo autor de violência. Diria que o homem fica mais contido. O S.O.S. é interligado ao Centro Integrado da Polícia e isso intimida a violência masculina”, explica a magistrada.
O dispositivo é semelhante a um celular, sem a função de discagem. Em geral, segundo a magistrada, ele é oferecido à mulher durante 180 dias, mas, se for necessário, esse tempo é renovado. E pode ser oferecido pela Justiça ou mesmo pela Delegacia da Mulher.
Botão – A técnica que vem sendo utilizada na Paraíba foi inspirada no chamado Botão do Pânico, criado no Espírito Santo e usado pelo Tribunal de Justiça capixaba como uma das mais importantes tecnologias usadas para redução da violência de gênero no estado. A Justiça entrega o aparelho às mulheres cujos agressores devem se manter afastados. De acordo com dados oficiais, o Espírito Santo é o estado com maior número de assassinatos de mulheres no país – só no começo deste ano, 24 mulheres foram assassinadas.
O dispositivo funciona como um alarme com aparelho de GPS que emite um alerta quando acionado, informando que o agressor se aproximou da mulher. O dispositivo começa a gravar o som ambiente e a gravação pode servir como prova criminal. A central de monitoramento da Prefeitura de Vitória recebe o chamado com o endereço e os dados do agressor e imediatamente uma das quatro Patrulhas Maria da Penha é enviada ao local.
No Rio Grande do Sul, as mulheres também contam com as patrulhas Maria da Penha. Apenas em Porto Alegre, são nove equipes. O estado é o primeiro a ter uma lei que estabelece o uso de tornozeleiras eletrônicas para homens agressores. No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) testa, além das tornozeleiras, um sistema de vigilância por meio do celular.
“A verdade é que apenas a tornozeleira eletrônica não é suficiente para defender essas mulheres. Precisamos implementar um equipamento que possa ser acionado quando ela está em perigo, seja em que lugar for”, afirma a juíza Madgéli Frantz Machado, titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Porto Alegre, onde tramitam 15 mil processos envolvendo violência doméstica.
O aplicativo pode ser instalado em smartphone com sistema Android e conectado a uma rede de pessoas ou instituições públicas para promover assistência, em tempo real, a mulheres vítimas de violência ou mesmo para quem deseja ser “monitorado” preventivamente.
Medidas protetivas eletrônicas – No Distrito Federal, é a rapidez das medidas protetivas em meio eletrônico que está fazendo a diferença nos casos de violência doméstica. Se, em geral, elas podem levar até quatro dias para serem liberadas, em algumas varas da capital do país as medidas estão sendo encaminhadas em questão de horas. “Com isso, temos conseguido dar maior segurança as mulheres ameaçadas, evitando que uma situação de violência desague em um fim trágico”, explica o juiz coordenador do Centro Judiciário da Mulher do TJDFT, Ben-Hur Visa, membro do Movimento Permanente de Combate à Violência Doméstica do CNJ.
Além de aumentar a rapidez com que os casos são analisados pelo juiz e, naturalmente, o tempo em que a medida protetiva é deferida, a iniciativa tem outro apelo: a economia. “Muitas vezes um agente de polícia anda mais de 200 quilômetros para entregar uma medida. Com a entrega eletrônica (da medida protetiva concedida pelo juiz), as delegacias não só terão economia de combustível, como poderão contar com a presença desse agente para outra atividade-fim”, diz. Ele lembra que, para a vítima, o tempo é muito precioso. “Muitas vezes é o tempo no deferimento de uma medida protetiva que vai salvar a vida de uma mulher”, completa.
A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar está prevista na Lei n. 11.340/2006, a chamada Lei Maria da Penha, cujos princípios e normas vêm sendo divulgados e difundidos pelo CNJ. O planejamento e a qualificação do Judiciário para lidar com os casos de violência doméstica têm sido uma preocupação constante do Conselho que, desde 2007, realiza a Jornada Maria da Penha, além de ter editado diversas normas para regulamentar a atuação do Judiciário nesse tema específico.
Uma das mais importantes ações do CNJ foi a Recomendação n. 9/2007, que instituiu a criação e a estruturação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher nas capitais e no interior dos estados e deu outras providências. Em 2011, o CNJ lançou campanha sobre a Lei Maria da Penha e editou a Resolução n. 128, que determinou a criação das Coordenadorias Estaduais da Mulher no âmbito dos Tribunais e suas competências. Desde a Lei Maria da Penha, já foram criados aproximadamente 100 juizados ou varas de violência doméstica em todo o País.
Como funcionam:
Tornozeleiras eletrônica – O juiz determina qual será o perímetro que o agressor ficará proibido de ingressar em torno da vítima. A tornozeleira, fixada no homem, permite que agentes de segurança monitorem a aproximação e possam intervir e evitar o encontro. Quando detectada a aproximação do homem na área proibida, é enviado um sinal sonoro para o dispositivo que fica com a mulher e tenta-se contato pelo celular para passar instruções.
Botão do Pânico – Microtransmissor com GPS que possui recursos para realizar o monitoramento de áudio, ou seja, quando acionado, grava o som ambiente. Para evitar o toque acidental, a mulher deve segurar o equipamento por três segundos, até disparar o sinal, que é enviado à Central. A partir das coordenadas do local onde o dispositivo foi acionado, a delegacia prontamente envia uma equipe da Patrulha Maria da Penha. O dispositivo é concedido por meio de uma ordem judicial.
Dispositivo S.O.S. – O dispositivo do programa S.O.S. Mulher, da Paraíba, funciona com três opções: o verde, para sinalizar que tudo está em paz; o vermelho, para ser acionado na iminência da agressão; e o amarelo, nas hipóteses de essa mulher vir que a pessoa está próxima. Em geral, é oferecido à mulher durante 180 dias, podendo renovar o tempo. Ele pode ser oferecido pela Justiça ou mesmo pela Delegacia da Mulher.
PLP 2.0 – A ferramenta desenvolvida para celulares com sistema Android é acionada quando a mulher se sente ameaçada. O sistema também é capaz de gravar som e imagem. Quando a mulher possui medida protetiva, o juiz faz o cadastro e a notificação é imediatamente direcionada à polícia. Mas o aplicativo também pode ser instalado conectado a uma rede de pessoas privadas, para segurança pessoal. O aplicativo permite cadastrar até cinco telefones na rede de proteção. Para enviar o pedido de socorro, basta agitar o telefone.
Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Programas do CNJ X Cidadania

Programas criados pelo CNJ contribuem para garantir direitos aos cidadãos

Protagonista na elaboração e implementação de diretrizes voltadas ao Poder Judiciário brasileiro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desenvolve, desde a sua criação há dez anos, ações e programas que objetivam transpor desafios enfrentados pela sociedade brasileira no âmbito da Justiça, como lentidão na solução dos processos judiciais, superlotação de presídios, corrupção na administração pública e combate à impunidade. A começar pela busca pela pacificação social por meio das soluções negociadas dos litígios - uma das ações mais importantes lideradas pelo CNJ desde a sua criação -, o órgão também realiza projetos e companhas nas áreas de infância e juventude, segurança pública e combate à violência contra a mulher, entre outras.
Como resultado de mutirões de conciliação promovidos pelo CNJ desde 2006, o Conselho editou a Resolução 125/2010, que criou a Política Judiciária de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesse e norteou o Judiciário na implementação dos mecanismos consensuais de solução de conflitos. Entidades públicas, privadas, universidades e cidadãos comuns já se beneficiaram dos milhares de acordos realizados nos últimos anos por meio da conciliação e da mediação.
Além da economia de recursos e de tempo, essas alternativas têm um importante impacto na sociedade: reduzem a entrada de novos processos na Justiça que, atualmente, movimenta cerca de 100 milhões de processos em seus tribunais. Somente durante as nove edições da Semana Nacional de Conciliação, que terá a décima edição em novembro de 2015, mais de um milhão de processos foram finalizados pacificamente. Coroando o sucesso dessa política pública, o Congresso Nacional aprovou, em junho deste ano, a chamada Lei de Mediação, proposta que regulamenta a prática no país e foi encampada pelo CNJ.

Pacificação e ressocialização – O sistema carcerário também tem recebido atenção do CNJ, culminando no Programa Cidadania nos Presídios, lançado neste ano, com o objetivo de desenvolver uma nova dinâmica e metodologia para o sistema de execução e fiscalização das penas, revendo o funcionamento das varas de execução penal e a superlotação dos presídios. O programa nasceu com a meta de aperfeiçoar o trabalho dos Mutirões Carcerários, iniciados em 2008, e também pretende fiscalizar as condições físicas dos presídios e acompanhar a saída do preso do sistema penitenciário, a fim de garantir a esses cidadãos a inclusão social e o acesso ao mercado de trabalho. Só no primeiro ano de funcionamento, que se estendeu até 2014, os mutirões carcerários feitos pelo CNJ libertaram 21 mil pessoas que estavam detidas ilegalmente em presídios, cadeias públicas e delegacias.
Ainda nesse campo, o Conselho firmou acordos com o Poder Executivo e entidades civis para combater a cultura do encarceramento, concretizando medidas como o projeto Audiência de Custódia. A iniciativa consiste na apresentação do preso em flagrante a um juiz no prazo de 24 horas, para que seja analisada a necessidade da prisão e a possibilidade de imposição de medidas alternativas ao cárcere. O Brasil tem, hoje, uma população carcerária que ultrapassa os 600 mil presos, sendo 42% deles provisórios, ou seja, que ainda não foram julgados. Lançado experimentalmente em São Paulo, em fevereiro de 2015, o programa já reduziu em 45% o número de prisões provisórias no estado desde então. No Espírito Santo, o índice chega a 60%. Até o final do mês de agosto, o projeto será implantado em mais 15 capitais (PR, RS, SC, MG, RJ, BA, MA, PE, PB, CE, PI, AM, TO, MT e DF).
O Programa Cidadania nos Presídios também engloba outra experiência do CNJ que é o projeto Começar de Novo, direcionado para a promoção de ações de ressocialização de presos e egressos do sistema carcerário. O intuito do Começar de Novo é reduzir as taxas de reincidência criminal por meio das oportunidades de trabalho. Contando com apoio dos tribunais, entidades civis e empresas, foram 9.970 oportunidades de trabalho preenchidas desde 2010.

Direitos das mulheres e crianças – Pouco tempo depois de o censo escolar revelar a existência de 4,8 milhões de crianças e jovens sem registro paterno, o CNJ criou o projeto Pai Presente, facilitando e estimulando o reconhecimento voluntário da paternidade. Foram mais de 10 mil registros só nos primeiros 12 meses de funcionamento, entre 2010 e 2011. Com o projeto, que contou com o apoio dos cartórios de todo o país, milhares de brasileiros passaram não só a ter o nome de seu genitor na certidão de nascimento, mas a contar com os direitos e responsabilidades advindos da paternidade. Hoje, a iniciativa é gerida de forma autônoma pelos tribunais estaduais e do Distrito Federal.
Enquanto órgão de planejamento estratégico do Judiciário, o CNJ também vem trabalhando junto a entidades públicas, organizações civis e tribunais para promover a responsabilização de autores de violência doméstica. Por iniciativa do Conselho, juizados e varas especializadas no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher foram criados após a edição da Recomendação 9/2007. O CNJ também divulga e difunde a Lei Maria da Penha, assim como realiza, anualmente, as chamadas Jornadas da Lei Maria da Penha, em que magistrados se reúnem para formular propostas que contribuam de maneira efetiva para o enfrentamento à violência contra a mulher.
Outro mecanismo de proteção utilizado na Justiça, dessa vez voltado às crianças e jovens, diz respeito às oitivas especiais. Em 2010, o CNJ estabeleceu a Resolução 33, a fim de garantir depoimentos especiais menos traumáticos durante processos judiciais que envolvam crimes sexuais contra crianças e jovens. A medida aumenta em quase nove vezes os índices de condenação de autores deste tipo de crime.

Eficiência – Para garantir uma prestação jurisdicional mais eficiente e ágil, o CNJ buscou solucionar o gargalo na primeira instância da Justiça, a porta de entrada dos processos judiciais. Com base no Relatório Justiça em Números, foi diagnosticado que o primeiro grau de jurisdição de todos os ramos da Justiça respondia por 90% dos 95,1 milhões de processos que tramitavam nos tribunais em 2013. Ainda assim, a distribuição de recursos e pessoal privilegiava a segunda instância, onde a demanda de processos era bem inferior. Neste contexto, foi instituída a Resolução 195/2014, que estabeleceu a Política Nacional de Priorização do 1º Grau de Jurisdição. Nela, constam ações voltados ao reforço dos recursos humanos e orçamentários da primeira instância da Justiça.
A preocupação com um Judiciário eficiente e transparente também está presente em outros flancos abertos pelo CNJ. Em 2012, o conselho editou a Resolução 158/2012, que criou o Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), contribuindo para a uniformização na gestão e pagamento de dívidas públicas (precatórios). O Conselho também faz parte da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), grupo de entidades que, sob coordenação do Ministério da Justiça, trabalha para combater a corrupção e a impunidade na administração pública. Foi por meio de ações e metas da Enccla, por exemplo, que o CNJ instituiu o modelo único de certidões de nascimento, casamento e óbito para todo o país, permitindo a verificação da autenticidade dos documentos, aumentando a segurança das informações.
A sustentabilidade e o uso racional de recursos naturais e de bens públicos também estimularam o Conselho a formalizar, ainda em 2007, a Recomendação 11, que sugeria aos tribunais a adoção de políticas públicas visando à recuperação e a proteção do meio ambiente. O tema ganhou força e, em 2015, após consulta pública, foi elaborada a Resolução 201, determinando aos órgãos e conselhos do Judiciário a criação de unidades ou núcleos socioambientais, para estimular a mudança dos padrões de compra, consumo e gestão documental no Judiciário, bem como do corpo funcional e da força de trabalho auxiliar de cada instituição.

A política mais recente, com abrangência para todo o Judiciário brasileiro, foi a aprovação, na sessão plenária da última terça-feira (9/6), de resolução para que os tribunais brasileiros reservem 20% das vagas oferecidas em concursos públicos para cargos de servidor e juiz a candidatos negros. Com isso, a magistratura é a primeira carreira jurídica a estabelecer esse tipo de política afirmativa para preenchimento de vagas.
Esta é a quinta matéria de uma série especial sobre a atuação do CNJ ao longo de seus dez anos de existência. Neste sábado (13/6), falaremos sobre os principais eventos liderados pelo Conselho e seus resultados, como a Semana Nacional de Conciliação, a Jornada Maria da Penha, os Encontros Nacionais do Judiciário, entre outros.
Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias

domingo, 14 de junho de 2015

Brasil um dos piores sistemas de Justiça do mundo

Brasil avança no Ranking de piores sistemas de Justiça do mundo

Por Vladimir Passos de Freitas

Mesmo relembrando o significado do verbo embargar, teremos dificuldade em entender aementa de um acórdão do Supremo Tribunal Federal nos autos do Recurso extraordinário 551955/RS, Tribunal Pleno, rel. Min. Luis Fux, julgado em 23 de abril de 2015, que diz:
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DISPENSA. EXECUÇÃO NÃO EMBARGADA PELA FAZENDA PÚBLICA EM AÇÃO COLETIVA. IMPOSSIBILIDADE DE FRACIONAMENTO DA EXECUÇÃO. ENTENDIMENTO ALINHADO AO POSICIONAMENTO SEDIMENTADO PELO PLENÁRIO DESTA SUPREMA CORTE. PARADIGMA EMPREGADO COMO CAUSA DE DECIDIR DO ACÓRDÃO EMBARGADO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A controvérsia suscitada nos presentes embargos de divergência encontra respaldo na decisão do Plenário do STF. 2. Inadmissíveis os embargos de divergência quando a decisão embargada estiver alinhada ao posicionamento do Plenário desta Suprema Corte. 3. In casu, apontado como acórdão paradigma o mesmo precedente empregado para fundamentar o julgado embargado. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
Então, é agravo nos embargos, nos embargos, nos embargos, no agravo, no recurso extraordinário? O leitor poderá pensar que se trata de um erro de digitação, uma repetição de palavras por força de uma tecla tocada indevidamente. Mas, se for conferir no site do Supremo, verá que não é assim. Na verdade, cuida-se de um recurso extraordinário de menor complexidade, distribuído na Corte em 12 de junho de 2007 e que lá ficou até 2015, entre idas e vindas por força de recursos sucessivos.
Este é um caso. Quantos existem semelhantes no STF? Ou mais graves, com atrasos mais significativos? Questões de maior complexidade, com mais recorrentes e recorridos, quem sabe com indígenas, discussões envolvendo Tratados Internacionais ou as terras do oeste do Paraná, sempre pendentes entre o público e o privado. Em vez de 8 anos talvez sejam o dobro, 16. Ou será que serão 24, o triplo?
Porém, não esqueçamos de um detalhe. Esses recursos, por vezes, podem ser da fase de conhecimento, que significa decisão do mérito ou, para ser mais claro, quem tem razão. Depois de decidido quem venceu, haverá a fase de execução. Aí, excluindo algumas ações especiais ou de simplicidade máxima (p. ex., mandado de segurança), alguns pontos poderão ser discutidos. Por exemplo, uma simples dívida da correção de um plano econômico poderá ensejar mais 5 ou 8 anos de discussões sobre a incidência do índice X ou Y.
Ou então uma dívida de condomínio, que se arrasta por 10 anos, que poderá ficar entre leilões sucessivamente adiados, porque o avaliador não teve tempo de ir ao local, porque a simples correção monetária da avaliação pode ser injusta, porque o lance foi baixo ou por petição sem fundamento algum que não seja tumultuar o processo. E claro, o condômino inadimplente continuará usando o elevador e todos os demais serviços, obrigando os que pagam a arcar com a sua parte.
Na fase da execução, os que gostam de boas músicas talvez venham a lembrar-se de Ivan Lins, cantando: “Começar de novo e contar comigo, vai valer a pena...”.  Com certeza o compositor pensava em um amor rompido e jamais imaginou que suas frases poderiam ser adequadas às ações judiciais no Brasil.
Mas se a esfera cível apresenta essas peculiaridades, nas ações penais não é diferente. A fragilidade do sistema é a mesma. Claro que ele não é frágil com pessoas de poucos recursos econômicos e culturais, que respondem a ações penais por crimes sem nenhuma complexidade Brasil afora. A ineficiência se revela onde o autor do delito tem meios de valer-se do sistema. E para que isso fique bem claro, nada melhor do que um exemplo da vida real. Exatamente, não uma tese feita na Academia, mas sim um caso concreto.
Em outubro de 2006, a UTRESA, empresa localizada em Estância Velha, RS, causou vazamentos de aterro nas águas dos Arroios Portão e Cascalho e no Rio dos Sinos, causando poluição, através de resíduos líquidos e substâncias oleosas, que resultaram na morte de cerca de 86,2 toneladas de peixes. O diretor foi condenado a 30 anos de prisão (30 fatos em concurso material). Acórdão do TJRS, em 26.11.2009, deu provimento à apelação e reduziu a pena total para 7 anos e 6 meses, reconhecendo crime como continuado. Recurso especial ao STJ não foi admitido e gerou o Agravo 1383285/RS ao STJ. Nessa Corte, por decisão monocrática aos 14.11.2014, a pena foi reduzida a 2 anos e 5 meses para o crime do art. 54 e 1 ano e 9 meses de  detenção para os delitos dos arts. 68 e 69, todos da Lei 9.605/98. Ditas penas foram elevadas pelo caráter continuado para  3 anos, 7 meses e 15 dias de reclusão e 2 anos, 7 meses e 15 dias de detenção, mantido o regime semiaberto.  Interposto recurso de EDcl no AgRg no Ag 1383285 RS 2011/0004110-7, por decisão da 6ª. Turma aos  6.4.2015, foi reconhecida a prescrição dos crimes dos artigos 68 e 69 da Lei 9.605/98, pela pena aplicada. Sobrou, assim, a pena imposta no crime de poluição (art. 54). Só que agora há, ainda, recurso extraordinário a ser processado no STF, cuja decisão final é imprevisível. Assim, o último crime que restou talvez venha a prescrever.
Óbvio que o sistema não funciona, no cível ou no crime ele é anacrônico. A Constituição de 1988 pode ser festejada em diversos aspectos, mas no sistema de Justiça ela reduziu o Judiciário à ineficiência. Antes dela as ações e as execuções das sentenças tinham razoável grau de previsibilidade.
È claro que isso pode ser útil a determinadas pessoas. A ministra Carmen Lúcia, do STF,  sabidamente preocupada com a eficiência das instituições, foi clara ao dizer que a “morosidade da Justiça interessa a alguém”. Complemento a frase, dizendo a quem e como.  
A demora pode ser ótima para devedores em ações civis (inclusive o Poder Público) e réus de ações penais. Pode ser útil, pelo número crescente de processos, àqueles que almejam ingressar ou ser promovidos nas carreiras públicas (p. ex., o aumento dos Tribunais pode interessar aos juízes e às demais carreiras públicas, porque abrem novas vagas). Pode ser oportuna para um advogado que cobre pelo tempo de demora da ação (p. ex., percentual sobre atrasados devidos pelo INSS) ou pelo número de recursos (TJ, STJ e STF).
Mas, o que pode interessar a alguns, certamente não interessa à sociedade. Os que cumprem suas obrigações veem-se desestimulados a seguir nessa trilha, pois os inadimplentes sempre se beneficiam com a demora, às vezes até são anistiados (p. ex., dívidas fiscais).
As vítimas de crimes sentem-se abandonadas pelo Estado, pois o STF entende que é preciso o trânsito em julgado para ser executada a pena (HC 84.078-7/MG, rel. Eros Grau, julgado em 5 de fevereiro de 2009) e, evidentemente, isso importa em 10 ou mais anos. Não por acaso há vítimas que recorrem a tribunais paralelos, onde a eficiência lhes é assegurada, ainda que possa chocar-nos.
Evidentemente, teses restritivas são impopulares e vivemos um momento em que todos buscam a imagem de simpático, aberto a mudanças, flexível. Dificilmente alguém ousa ir contra a grande onda do acesso irrestrito à Justiça, como o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo,  Renato Nalini, e ao direito recursal infinito, mesmo que isso seja necessário.
O resultado está aí: embargos de divergência nos embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário...
 é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente eleito da "International Association for Courts Administration - IACA", com sede em Louisville (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.
Revista Consultor Jurídico, 14 de junho de 2015.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Mais de 1/3 dos presos no Brasil não sofreu condenação

Mais de um terço dos presos do país 
não sofreu condenação, diz estudo

Por Marcelo Galli
O perfil do preso no Brasil é jovem (abaixo de 29 anos), negro, com ensino fundamental incompleto e sob acusação de crimes patrimoniais. Em mais de um terço dos casos, eles estão encarcerados sem qualquer julgamento. Os dados fazem parte do Mapa do Encarceramento: os jovens do Brasil, divulgado nesta quarta-feira (3/6).
O estudo, com dados relativos a 2012, mostra que do total de 515.482 presos no Brasil, 38% é formada por provisórios, ou seja, pessoas que estão sob a custódia do Estado sem que tenham sido julgadas — outros 61% dos presos eram condenados e 1% estava sob medida de segurança. 
Em relação aos presos condenados, 69% destes estava no regime fechado, 24% no regime semiaberto e 7% no regime aberto. O levantamento aponta também que entre 2005 e 2012 a população prisional do Brasil cresceu 74%. O número absoluto de presos no País era 296.919 em 2005. 
Segundo o estudo, entre os apenados, 29,2% estava cumprindo de quatro a oito anos de prisão, sendo que outros 18,7% cumpriam, em 2012, pena de até quatro anos de prisão. Quase metade (48%) dos presos brasileiros recebeu pena de até oito anos.
Prisões desnecessárias
Em um sistema carcerário superlotado, diz o estudo, 18,7% dos presos não precisariam estar dentro de presídios porque estão no perfil para o qual o Código de Processo Penal prevê cumprimento de penas alternativas, como uso de tornozeleiras eletrônicas.
“Isto deve estar relacionado ao alto número de presos que ainda aguarda julgamento, às tendências punitivistas dos operadores da justiça criminal, às deficiências no exercício do direito de defesa e às deficiências na função fiscalizadora do Ministério Público”, afirma o estudo.
O estudo recomenda que o Ministério Público e Tribunais de Justiça monitorem a permanência de presos provisórios nas unidades penitenciárias, em especial os jovens, como medida para reduzir a vulnerabilidade deste público às condições precárias do encarceramento e ao assédio das organizações criminais.
Falta de assistência
O estudo destaca que uma das principais dificuldades do sistema prisional brasileiro é a ausência de assistência jurídica para a população encarcerada. E cita que não são raras as notícias de pessoas que permanecem presas mais tempo do que deveriam ou ainda aquelas que passam meses, e às vezes, anos presas sem nenhum contato com um defensor.
“Iniciativas como os mutirões carcerários realizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) conseguem amenizar um pouco esta situação, no entanto, somente a consolidação e o fortalecimento de um órgão institucional de assistência jurídica pode converter este cenário”, diz.
O estudo, de autoria da pesquisadora Jacqueline Sinhoretto,  é uma publicação do Plano Juventude Viva, que reúne ações de prevenção para reduzir a vulnerabilidade de jovens negros a situações de violência física e simbólica. A divulgação foi feita pela Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil.
Foram utilizados dados disponibilizados pelo Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen) e os dados referentes aos adolescentes em medidas socioeducativas do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), órgão vinculado à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, obtidos junto ao Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Clique aqui para ler a íntegra do estudo.
Revista Consultor Jurídico, 03 de junho de 2015

segunda-feira, 8 de junho de 2015

STF: pedidos de vista de processos

No STF só 20% dos pedidos de vista são devolvidos no prazo

Veto a doação de empresas a políticos está entre as 217 ações interrompidas
Prerrogativa de ministro parar julgamento para estudar o processo tem servido para obstruir decisões do plenário
FREDERICO VASCONCELOSDE SÃO PAULOO desrespeito às normas internas do STF (Supremo Tribunal Federal) por parte dos próprios ministros naturalizou-se quando o assunto é pedido de vistas --a possibilidade de o magistrado paralisar um julgamento para estudar melhor o processo.
Levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostra que só 1 de cada 5 pedidos desse tipo é devolvido no prazo regimental de duas sessões ordinárias. Segundo o STF, há hoje 217 ações com julgamento interrompido por vistas.
Alguns casos têm mais de uma década de espera. No sistema de distribuição de processos do tribunal, vários ainda estão associados a ministros que nem estão mais na corte, como Nelson Jobim, que saiu em 2006, ou Menezes Direito, morto em 2009 (confira no gráfico abaixo).
Em alguns casos, o pedido de vistas tem servido de pretexto para obstruir decisões importantes do plenário.
"Os ministros criaram uma prerrogativa para si que consiste no poder individual de vetar o julgamento de qualquer processo que seja submetido a votação pelo colegiado", diz o pesquisador Ivar Hartmann, da FGV Direito-Rio, coordenador do projeto "Supremo em Números".
Entre os julgamentos interrompidos há questões de grande relevância e interesse social. Em abril de 2014, o ministro Gilmar Mendes pediu vista no julgamento em que o plenário, por 6 votos a 1, caminhava para proibir o financiamento empresarial de campanhas eleitorais.
O caso está parado em seu gabinete até hoje. Mendes alega que a demora permitiu um maior debate sobre o tema, e fala da hipótese de colegas mudarem o voto.
Desde maio de 2012 está no gabinete de Luiz Fux uma ação em que a Procuradoria-Geral da República questiona a constitucionalidade de uma lei estadual do Rio que cria privilégios para magistrados cariocas, benefícios não previstos na Loman, a lei orgânica da magistratura.
Entre as regalias estão o pagamento de auxílio-saúde, auxílio pré-escolar, auxílio-alimentação e até um dispositivo apelidado de "auxílio-divórcio", pois permitiria licença do magistrado por motivo de afastamento do cônjuge.
Fux, carioca, alega que essa ação depende de aprovação pelo plenário do projeto do Estatuto da Magistratura, que substituirá a Loman.
Trata-se de um conjunto de sugestões do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, cujo espírito corporativista foi reforçado por propostas de Fux. Incluem, por exemplo, o pagamento de 17 salários por ano aos magistrados e a concessão de recursos públicos para o funeral dos juízes.
ABUSOS
Alguns membros do STF alegam sobrecarga de trabalho para justificar a demora na devolução dos pedidos de vista. "Mas os próprios ministros reconhecem que não há mecanismos para coibir abusos e, portanto, o poder é ilimitado", diz Hartmann.
Também estão paradas no STF --há cinco anos-- ações que tratam da aposentadoria especial de servidores públicos sujeitos a atividades prejudiciais à saúde. Calcula-se que há cinco milhões de servidores públicos estatutários. Eles pautam o STF com muitos processos sobre o tema.
Outro caso sem decisão final --paralisado em agosto de 2011 por Mendes-- é o recurso extraordinário sobre a execução extrajudicial de dívidas de financiamento habitacional. Em jogo, a possibilidade de o devedor ser submetido a expropriação do imóvel sem acesso imediato ao Poder Judiciário.
Já o julgamento de uma ação de 2001 da Confederação Nacional do Comércio sobre alterações à Lei Kandir foi suspensa naquele ano por pedido de vista de Ilmar Galvão, que se aposentou em 2003. Envolve ICMS, tributo estadual, com possibilidade de bilhões em perdas ou ganhos.
O caso foi herdado pelo gabinete de Marco Aurélio --um dos que menos pedem vista.
"Qualquer prazo sem um mecanismo real para estimular seu cumprimento é inútil", diz Hartmann. "É necessário criar um mecanismo real de coerção [no STF]."
Transcrito do Jornal Folha de São Paulo, de 07.06.2015.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Soluções extrajudiciais de conflitos X Avanço do processo civilizatório

MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM

Soluções extrajudiciais são avanço do processo civilizatório da humanidade

Por Flavio Crocce Caetano e Luiz Felipe Salomão

A Constituição de 1988 inaugurou uma nova era de garantias aos direitos dos cidadãos, sobretudo no campo do acesso à justiça, de sorte que, no afã de conferir solução às mais diversas disputas, o País vem experimentando crescimento exponencial de demandas judiciais sobre as mais diversas controvérsias, sendo a judicialização uma característica desse fenômeno.
Entretanto, o crescimento da sociedade e sua complexa estruturação num mundo globalizado orientaram a adoção de um modelo temperado de divisão de tarefas – que conferisse alternativas seguras para a solução de conflitos, com facilitação do acesso à justiça.
A implementação de instrumentos de pacificação social eficientes, mas que não desvirtuem os ideais de justiça, permite a desobstrução do Judiciário, mantendo as garantias sociais exigidas. São inúmeros os exemplos de práticas bem-sucedidas no mundo, envolvendo, dentre outros, a mediação e a arbitragem.
A arbitragem – método em que os litigantes atribuem a um terceiro a decisão do conflito – está regulada no Brasil pela Lei 9.307, de 1996. Com o seu reconhecido texto dinâmico, deflagrou uma forte tendência do uso desse mecanismo, que passou a ser observada em diplomas legislativos posteriores. Curiosamente, com o advento da Lei de Arbitragem, observou-se um número crescente de câmaras arbitrais também especializadas em mediação.
O Projeto de atualização da Lei da Arbitragem, convertido na Lei 13.129, de 26 de maio de 2015 – produzido pela Comissão de Juristas indicada pelo Senado Federal em abril de 2013 –, estabeleceu a plena utilização do instituto para a administração pública. Um salto enorme para solucionar rapidamente litígios a envolver o poder público, diminuindo a presença, no Judiciário, daquele que é o maior litigante judicial. Ademais, a possibilidade da arbitragem em contratos públicos, com a garantia de árbitros especializados nas diversas questões da infraestrutura, carrega a perspectiva de atrair grandes investimentos, nacionais e internacionais.
Ainda, a nova lei dispôs sobre a utilização desse instituto para dirimir conflitos societários, com cláusula a ser instituída por assembleia de acionistas, assegurado o direito de retirada aos sócios minoritários, o que permitirá solucionar, rapidamente, tais impasses, que, muitas vezes, acabam paralisando grandes empresas.
Foram atualizados os procedimentos, regulada a prescrição e a forma da sentença arbitral, dispondo-se também sobre medidas cautelares, ou tutelas de urgência.
Houve veto em dois pontos, que ainda serão analisados pelo Senado Federal: arbitragem para os contratos de consumo por adesão e para os contratos trabalhistas, em cargos de elevada hierarquia nas empresas. Em ambos os casos, só quando o consumidor ou trabalhador tivessem a iniciativa de instituir a arbitragem.
Por outro lado, a mediação, ainda carente de um marco legal regulatório específico, é um procedimento autocompositivo pelo qual um terceiro – imparcial e independente –, dotado de técnicas específicas e sem sugerir a solução, busca aproximar as partes, facilitando-lhes o diálogo para que compreendam a origem e as facetas de suas posições antagônicas e construam a resolução do embate, com o almejado efeito de prevenir novos desentendimentos. Nesse contexto, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 125, em outubro de 2010, indicando a mediação como meio de resolução de conflitos.
Nesse particular, o substitutivo aprovado na CCJ, de autoria do deputado federal Sergio Zveiter (PSD-RJ) e que será votado em definitivo no Plenário do Senado em 2 de junho de 2015, vem sendo trabalhado em conjunto pelo Ministério da Justiça e pela Comissão de Juristas do Senado.
Estão em destaque os seguintes pontos: a mediação, extrajudicial ou judicial, pode ser utilizada para dirimir qualquer conflito que admita transação; a mediação extrajudicial independe de registro em cadastro de mediadores; os mediadores judiciais precisarão ser graduados há pelo menos dois anos e cursar escola de formação de mediadores; a medição considera-se instituída a partir da data em que é firmado o termo inicial de mediação – marco da suspensão do prazo prescricional –, encerrando-se com a lavratura de seu termo final; é possível a utilização da mediação em conflitos envolvendo órgãos da administração pública direta e indireta de todos os entes federados; é viável a realização de mediação via internet ou qualquer outro meio que permita a transação a distância.
Em conclusão, pode-se afirmar com segurança que as soluções extrajudiciais, em especial a arbitragem e a mediação, representam o avanço do processo civilizatório da humanidade, que, de maneira consciente, busca mecanismos de pacificação social eficientes. Indiretamente, carrega perspectiva de racionalidade para a jurisdição estatal, hoje assoberbada com o decantado volume de processos.
Revista Consultor Jurídico, 31 de maio de 2015.

Diferenças regionais no acesso à Justiça chegam a 100% no Brasil

O acesso à Justiça no Brasil é muito mais desigual do que a distribuição de renda, a educação e a saúde afirmou o secretário da reforma do Judiciário durante discussão da ONU sobre os indicadores nacionais e a importâncias do acesso à Justiça para todos na agenda pós-2015.
“O acesso à justiça é fundamental para fortalecer a democracia, fortalecer os direitos dos cidadãos e, sobretudo, é um direito humano essencial básico”, afirmou a representante residente adjunta do Programa da ONU para o Desenvolvimento (PNUD), Ana Inés Mulleady, na abertura do debate entre especialistas sobre Indicadores de acesso à justiça no Brasil.
A declaração reforça o 16º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS): promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. Esse é um dos objetivos – atualmente em negociação entre os Estados-membro das Nações Unidas – da agenda de desenvolvimento pós-2015.
Realizado pelo PNUD na Casa da ONU, em Brasília, o debate teve como objetivo promover a discussão e troca de informações entre instituições que trabalham com indicadores e pesquisa sobre acesso à justiça. O tema central girou sobre a aplicação de indicadores para mensuração e o acompanhamento do acesso a Justiça no Brasil, bem como o desenvolvimento de uma estratégia de colaboração sobre o tema e aprimoramento dos indicadores de acesso à justiça disponíveis no país. Participaram representantes de órgãos de pesquisa, universidades e instituições do executivo e judiciário relacionados ao tema.
Acesso desigual no Brasil
Tendo em vista a disponibilização, para todos os brasileiros, de informações sobre a justiça e outros órgãos onde os cidadãos podem reivindicar seus direitos, a Secretaria de Reforma do Judiciário, em parceria com a UnB, desenvolveu uma ferramenta eletrônica única em âmbito global: o atlas de acesso à justiça.
Depois de apresentar o projeto, o secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Crocce Caetano, explicou que o Brasil desenvolveu um índice para quantificar o acesso à justiça dos brasileiros. O Índice Nacional de Acesso à Justiça (INAJ) revelou que 14 estados estão abaixo da média nacional em acesso à justiça; pessoas mais pobres e mais vulneráveis têm menos acesso à justiça; a unidade federativa mais bem colocada no índice – Distrito Federal – apresenta uma diferença de 1000% em relação à pior colocada – Maranhão.
“No Brasil, a diferença de IDH entre o maior e o menor estado chega a 20%, já o INAJ chega a 1000%, ou seja, o acesso à justiça no Brasil é muito mais desigual do que a distribuição de renda, a educação e a saúde”, concluiu o secretário.
Um dos instrumentos utilizados para medir o acesso à Justiça no Brasil é uma pesquisa com defensores públicos de todo o país que pode ser respondida, pela internet, até o dia 12 de junho.
Fonte: PNUD