O excesso de prisões processuais na "lava jato" demonstra crise da justiça
Alana Abílio Diniz Vila-Nova e Daniel Augusto Diniz Vila-Nova
Na manhã desta sexta-feira (19/6), a Polícia Federal deflagrou a 14ª fase da operação "lava jato" — batizada de operação erga omnes. Desta vez, os alvos envolvem a cúpula da diretoria de duas das maiores empreiteiras do país, suspeitas de corrupção e cartel.
Segundo noticiado, cerca de 220 policiais federais cumprem 59 mandados judiciais em quatro estados (Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul), sendo 38 mandados de busca e apreensão, nove mandados de condução coercitiva, oito mandados de prisão preventiva e quatro mandados de prisão temporária.
Nas primeiras 13 fases da operação "lava jato", a Polícia Federal cumpriu mais de 400 mandados judiciais, que incluem prisões preventivas, temporárias, busca e apreensão e condução coercitiva. Ao todo, 19 ações penais e cinco ações civis públicas foram instauradas na Justiça Federal. O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da "lava jato" na primeira instância, até o presente momento, aceitou por volta de 80 denúncias.
Se consideramos os números de prisões processuais realizadas relativamente ao número de denúncias aceitas pelo Poder Judiciário, teremos um retrato claro da excessiva utilização da prisão processual no Brasil.
Segundo estudos do CNJ, o número de “presos provisórios” indica o percentual de 32% incidente sobre a população presa de 715.655 pessoas, chegar-se-ia ao quantitativo estimado de mais de 229 mil “presos provisórios” — esse montante não fica tão distante do número total de presos do México (país que, segundo o mesmo estudo do CNJ, possui 118 milhões habitantes e 249,9 mil “presos”, dentre condenados e provisórios)[1].
Destaca-se, que no universo das prisões processuais, há um dado que envolve aspectos de mais pura injustiça: os cidadãos temporariamente aprisionados que, ao final do processo, são absolvidos ou apenados com as denominadas “penas alternativas” (ou substitutivas à pena de prisão, nos termos do artigo 44 do Código Penal – CP – Decreto-Lei 2.848/1943).
Levando-se em conta pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), essas situações envolveriam, aproximadamente 37,2% do total de “presos provisórios” — ou seja, em mais de 1/3 dos casos! [2]
Apesar dos dados alarmantes, continuamos a acompanhar, pela televisão, obig brother das prisões processuais no país.
Infelizmente, mesmo após quase 30 anos de vigência da Carta Cidadã, a prisão ainda não é tida medida excepcional, isso, sem dúvidas, demonstra crise no judiciário (ou, ao menos, na justiça).
[1] Estudo do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas, do CNJ (DMF/CNJ).
[2] Informe constante do Portal da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC)M disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-11/cadeias-brasileiras-abrigam-90-mil-presos-provisorios.
Alana Abílio Diniz Vila-Nova é advogada, pós-graduada em Direito Público e em Direito Penal e Processo Penal pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
Daniel Augusto Diniz Vila Nova é mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB).
Revista Consultor Jurídico, 19 de junho de 2015.
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