domingo, 9 de janeiro de 2011

O polêmico sigilo dos processos no STF

          A inusitada decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, em vigor desde final de agosto de 2010, de determinar a substituição dos nomes das autoridades, por suas iniciais, nas capas dos inquéritos e dos processos que aguardam julgamento no STF tem causado perplexidade no meio forense.

          Na prática, o que de fato ocorre, é a tramitação dos processos em caráter confidencial, porquanto é quase impossível saber, somente pelas iniciais dos nomes, quem são as autoridades que estão sob investigação. Segundo o presidente do STF, as ações devem ser conduzidas de forma reservada, uma vez que causam danos à imagem das autoridades. "A regra é essa. Não se pode fazer divulgação desnecessária", disse.

          Contudo, na opinião do ministro Celso de Mello, "nada justifica a tramitação, em regime de sigilo,  de qualquer procedimento que tenha curso em juízo. Deve prevalecer a cláusula da publicidade". No mesmo sentido, afirmou o ministro Marco Aurélio: "É uma pretensão indevida. Será que vai haver todo esse cuidado para os cidadãos comuns? A regra é a publicidade. É preciso que haja o lançamento dos nomes por extenso para que a sociedade acompanhe o andamento dos processos".

          Na realidade, é o interesse público que está por trás na maioria dos processos abertos contra autoridades. Ocultando a identidade das autoridades sob o argumento de que é necessário preservar a sua honra e intimidade, o que se obtém, na prática, é a negativa da transparência, essencial e indispensável na relação entre governantes e governados. A vida funcional das autoridades tem de ser um livro aberto e de livre acesso ao público.

          Até  agora esse procedimento só vinha sendo utilizado nas ações judiciais, nos casos permitidos em lei, que tramitam com cláusula de sigilo, como aqueles que envolvem crianças e adolescentes e nos casos em que há quebra de sigilo fiscal, bancário ou telefônico. Por princípio, as causas judiciais são públicas, característica, aliás, de qualquer ato administrativo.

          No período em que vem presidindo o STF, o ministro Peluso já sofreu algumas derrotas por conta de iniciativas corporativas em favor de autoridades.

          Em maio, no início do julgamento do ministro Paulo Medina, do STJ, que acabou condenado, juntamente com o desembargador José Eduardo Carreira Alvim do TRF da 2ª Região, por envolvimento na venda de liminares a donos de máquinas de caça-níqueis no Rio de Janeiro, Peluso propôs que a sessão fosse fechada, para preservar a imagem do réu. A proposta porém foi rejeitada pelo plenário. Meses depois, se opôs à remessa para o Conselho Nacional de Justiça de processos administrativos contra magistrados. Com o argumento de que eles não poderiam ficar expostos a constrangimentos causados por "divulgação desnecessária do sistema judicial", Peluso defendeu, em total desacordo com a Emenda Constitucional 45, que os processos ficassem circunscritos às corregedorias dos tribunais de segunda instância, que são conhecidas pelo seu corporativismo e pouca eficiência. Mais uma vez foi derrotado.

          Indiscutivelmente a criação do Conselho Nacional de Justiça foi um avanço e sua atuação só merece elogios. Conforme levantamento efetuado pelo próprio CNJ, desde 2005, quando o Conselho foi instalado, 45 magistrados foram punidos. De todas as punições impostas pelo CNJ, 21 foram a sanção máxima em um processo adminstrativo: a aposentadoria compulsória. Nesses casos, o juiz é proibido de trabalhar, mas recebe vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Para perder o cargo definitivamente, o magistrado precisa ser condenado pela Justiça em processo criminal. Nesse mesmo período de cinco anos e meio, outros seis magistrados foram postos e disponibilidade, dois foram removidos compulsoriamente, quinze foram afastados provisoriamente e um foi censurado.

          Ficou também comprovado que Corregedor não investigava colegas. O desembargador Jovaldo dos Santos Aguiar, ex corregedor do TJ do Amazonas foi punido com aposentadoria compulsória por manter paralisados, desde 2007, 39 procedimentos disciplinares (16 de forma indevida), contra juízes e desembargadores.

          Ainda por conta de sua postura corporativa, segundo os jornais, o ministro Peluso está em rota de colisão com a Corregedora Nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, em razão das duras críticas que ela tem feito à magistratura. Há forte comentários de que a ministra deixará no primeiro semestre deste ano o cargo que assumiu em agosto passado, voltando às fileiras do STJ.