Uma decisão que limitou a população carcerária em dois Centros de Detenção Provisória (CDPs) de Osasco, região metropolitana de São Paulo/SP, deu ao juiz substituto da 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) Marcelo Semer uma premiação no I Concurso Nacional de Decisões Judiciais e Acórdãos em Direitos Humanos. O magistrado determinou que fosse reduzido de 5.196 para 2.000 o número máximo de presos dos dois centros de detenção. A capacidade de alojamento de cada um destes centros é de 768 detentos.
Promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SDH), do Ministério da Justiça, o concurso premiou sentenças que efetivamente protegeram os direitos de vários segmentos da população. Proferida no dia 19 de setembro do ano passado, a decisão Marcelo Semer foi a vencedora na categoria Direitos da População em Privação de Liberdade.
A decisão ocorreu no julgamento de um recurso da Defensoria Pública de São Paulo contra decisão que julgou improcedente pedido para que fosse imposto limite na lotação prisional ou para que os presos fossem transferidos.
Além do excesso de presos, eram mantidos no mesmo estabelecimento detentos que deveriam ter sido encaminhados a tratamento psiquiátrico. Também não havia separação entre presos provisórios e definitivos ou entre réus primários e reincidentes, como estabelece o Código de Processo Penal.
Em sua defesa, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo alegou, resumidamente, que o problema era complexo e que não poderia ser resolvido por meio de ações civis públicas, pois sua solução demandaria providências de outros Poderes e entidades. Ao analisar o pedido, o magistrado entendeu que a falência do sistema penitenciário impõe à população carcerária pena cruel e degradante, por isso o Poder Judiciário não pode se omitir a apreciar qualquer lesão ou ameaça de direito, sob a justificativa de que há outros indivíduos em condições similares.
“Não existem cidadãos mais ou menos humanos que outros. Os condenados não são responsáveis pela desumanidade da pena que recebem”, afirma o Juiz.
Marcelo Samer disse que há certa tendência de responsabilizar moralmente os condenados pela precariedade da situação em que se encontram, porque, afinal de contas, teriam praticado o ilícito que os levou à reclusão. “Todavia, eles não são mais responsáveis do que as sanções que se lhes atribui, no caso, a privação da liberdade. A partir daí a responsabilidade por estabelecer uma forma humana do cumprimento desta sanção é do Estado”, diz o magistrado em sua decisão.
De acordo com Samer, as condições carcerárias encontradas nas prisões de Osasco e em diversas outras em todo o Brasil violam a Constituição Federal e desrespeitam as regras mínimas para o tratamento de prisioneiros estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU).
“A ação do Judiciário vista, sobretudo, impedir que a omissão do Executivo amolde as cadeias como masmorras impenetráveis, palco de descasos que convirjam para violências, doenças e mortes, que, no futuro, retornarão como pedidos de indenização ao próprio Estado”, diz a decisão.
O juiz determinou então ao governo estadual que mantivesse em cada uma das unidades o número de encarcerados de no máximo, 1.000 detentos. Entrevistado na última terça-feira (14/2) logo após receber o prêmio das mãos da presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, o magistrado disse que o tema abordado na decisão é extremamente atual e que o juiz deve colocar sempre a dignidade da pessoa humana acima de todas as outras normas a serem observadas.
“A decisão não é de agora, mas a cada dia estamos descobrindo que nosso sistema carcerário é praticamente falido, não recupera presos e destroça pessoas, onde a dignidade é praticamente inexistente”, afirmou. Ele acredita que uma maior divulgação das decisões emblemáticas em Direitos Humanos pode contribuir para que outros juízes decidam no mesmo sentido.
Em julgamento realizado nesta quinta-feira (16/2), o STF decidiu que o Estado é obrigado a indenizar presos mantidos em situação degradante. A decisão fixou indenização de R$ 2 mil por danos morais a um condenado que cumpriu pena no presídio de Corumbá/MS.
Tatiane FreireAgência CNJ de Notícias
Nenhum comentário:
Postar um comentário