O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dará publicidade, no dia 31 de maio, durante a 232ª Sessão Ordinária, à tradução oficial das chamadas Regras de Mandela, preceitos mínimos da Organização das Nações Unidas (ONU) para o tratamento de presos atualizadas no ano passado pela instituição internacional. O documento oferece balizas para a estruturação dos sistemas penais nos diferentes países e reveem as "Regras Mínimas para o Tratamento de Presos" aprovadas em 1955. As normas vão ao encontro de programas implantados pelo CNJ para melhoria das condições do sistema carcerário e garantia do tratamento digno oferecido às pessoas em situação de privação de liberdade, como os programas Audiência de Custódia e Cidadania nos Presídios.
As Regras de Mandela levam em consideração os instrumentos internacionais vigentes no Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. De acordo com o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, juiz Luís Geraldo Lanfredi, as regras têm caráter programático, e se prestam, primordialmente, a orientar a atuação e influenciar o desenho de novas políticas pelo Poder Judiciário para o sistema carcerário. “A tradução e a publicação das Regras de Mandela conferem instrumental e qualificam o trabalho dos juízes, na medida em que atualizam as orientações das Nações Unidas para os mínimos padrões que devem nortear o tratamento das pessoas presas no país”, diz o juiz Lanfredi.
As regras buscam estabelecer bons princípios e sugerir boas práticas no tratamento de presos e para a gestão prisional, assegurando a dignidade e respeito não só às pessoas privadas de liberdade, como também a seus familiares. O documento está dividido em regras de aplicação geral, direcionadas a toda categoria de presos, e regras aplicáveis a categorias especiais, como presos sentenciados, presos com transtornos mentais ou problemas de saúde, entre outros tipos. Na apresentação da publicação, o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, reconhece que as Regras de Mandela podem e devem ser utilizadas como instrumentos a serviço da jurisdição, porque têm aptidão para transformarem o paradigma de encarceramento praticado pela Justiça brasileira.
Sem tortura - Entre as regras de aplicação geral, está previsto que “nenhum preso deverá ser submetido à tortura ou tratamentos cruéis e desumanos”, e que “não haverá discriminação baseada em raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou qualquer outra opinião”. O documento também enfatiza a necessidade da separação de presos homens de mulheres, bem como dos jovens de adultos.
Em relação às acomodações dos presos, as Regras de Mandela estabelecem que todos os ambientes de uso dos presos, inclusive as celas, devem satisfazer exigências de higiene e saúde, levando-se em conta as condições climáticas, a iluminação e a ventilação. Há previsão também em relação ao vestuário, roupas de cama, alimentação, exercício e esporte, bem como serviços de saúde que deverão estar à disposição dos presos.
Revistas íntimas – As regras deixam claro que revistas íntimas e inspeções não serão utilizadas para assediar, intimidar ou invadir desnecessariamente a privacidade do preso. As revistas das partes íntimas de pessoas serão conduzidas apenas por profissionais de saúde qualificados. Onde forem permitidas visitas conjugais, as Regras de Mandela estabelecem que este direito deverá ser garantido sem discriminação, e as mulheres presas exercerão este direito nas mesmas bases que os homens.
De acordo com as novas regras, os instrumentos de restrição, como é o caso das algemas, não devem ser utilizados em mulheres em trabalho de parto, nem durante nem imediatamente após o parto. Em relação aos presos com transtorno mental ou problemas de saúde, o documento prevê que os indivíduos considerados inimputáveis, ou que posteriormente forem diagnosticados com deficiência mental ou problemas de saúde severos, não devem ser detidos em unidades prisionais, a eles reservando-se instituições para doentes mentais assim que possível. As regras estabelecem, ainda, que os serviços de saúde das instituições penais devem proporcionar tratamento psiquiátrico a todos os outros prisioneiros que necessitarem.
Atuação do CNJ – Três programas específicos do CNJ se destacam pelo esforço e aposta na melhoria das condições das unidades prisionais e tratamento digno às pessoas presas. O Audiências de Custódia, em fase de expansão em todo o país, garante a apresentação de presos em flagrante ou por mandado de prisão à autoridade judicial competente, em até 24 horas. Entre outros encaminhamentos, a entrevista pessoal entre juiz e a pessoa presa em flagrante permite detectar situações de vulnerabilidade social, drogadição, alcoolismo, além de contribuir para a redução da reincidência criminal.
O Cidadania nos Presídios, em experiência-piloto no Espírito Santo, propõe um olhar mais humano, sobretudo, para os recém-egressos do sistema. Além de alterar as rotinas das varas de execução penal e qualificar a “porta de saída dos estabelecimentos prisionais”, o investimento do programa é no fortalecimento da rede público-privada de instituições, visando a otimizar as opções para a criação de oportunidades e qualificação pessoal daqueles que passaram pelo sistema de Justiça.
Já o PAISA será a terceira aposta do CNJ para modificar o cenário do sistema prisional brasileiro. Com seu lançamento programado para o mês de junho, o objetivo do programa é investir em melhores condições de saúde para o contingente carcerário, alcançando-se, assim, um melhor padrão de ambiência prisional junto às carceragens em todo país.
Situação do Brasil – Segundo o último Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), publicado neste ano, o retrato do encarceramento no país, em dezembro de 2014, mostra que o Brasil mantém sob custódia mais de 620 mil pessoas, 41% delas ainda sem condenação definitiva. No período de 1990 a 2014, o aumento da população prisional foi de 575%, algo que, sensivelmente, colaborou para agravar o problema da superlotação nos presídios brasileiros.
Luiza Fariello
Agência CNJ de Notícias
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