Alcançamos um tempo não muito distante em que as audiências eram feitas na mão, como assim cara pálida? Isso mesmo, as atas de audiência e a tomada de depoimentos eram escritos na mão mesmo em um livro gigante chamado de tombo. Não raras as vezes que atacado pelo cansaço, errávamos e usávamos o famoso "digo" e continuávamos a escrever indefinidamente. Era uma tortura, um crime contra nossos dedos consentida a bem do serviço público.
Depois, veio a famosa máquina de datilografia, quanta saudade daquele barulho que parecia pipoca pulando dentro de uma panela, nossos dedos já não sofriam tanto e a agilidade no cumprimento dos atos judiciais e as audiências começavam a ficar mais céleres, quando isso aconteceu foi uma festa, inclusive para mim então serventuário do Poder Judiciário do Ceará. Foi um acontecimento mesmo.
Por fim, após passarmos por tudo isso chegou, enfim, o computador e seus sistemas lentos e complicados, foi um Deus nos acuda, tivemos que ser treinados e orientados de como usá-los em proveito do serviço forense. Na época ninguém sequer pensava ainda em Processo Judicial Eletrônico, ou pensava sei lá, mas, uma nova revolução tecnológica estava chegando para ficar e assim, facilitar ainda mais o acesso a justiça e a celerização dela. Será?
Encontrei importante artigo publicado na Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), escrito pelo Juiz Luiz Guilherme Marques, da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora - MG que julgo importante transcrevê-lo fielmente aqui neste artigo:
A responsabilidade de cada um pela morosidade da Justiça
O Consultor Jurídico (www.conjur.com.br) de 22/05/2008 traz um informativo intitulado Adaptação à tecnologia - Advogados reclamam de filas para digitalizar ações em SP:
Os advogados estão insatisfeitos com as longas filas para a digitalização de processo no Fórum Digital da Freguesia do Ó, em São Paulo. Inaugurado há quase um ano, o fórum foi apresentado como o grande passo da Justiça paulista rumo à celeridade. A expectativa era a de reduzir o tempo de tramitação dos processos, todos digitais, em até 70% dos casos.
O avanço tecnológico representado pelas Varas da Freguesia do Ó, em São Paulo, com funcionamento integral no sistema digital representa uma das conquistas mais importantes do Judiciário brasileiro.
No entanto, passados poucos meses do início das atividades inovadoras, surge a informação da formação de filas, agora de advogados para a digitalização dos seus trabalhos forenses que serão inseridos nos processos digitais.
Com todo respeito e amizade que tenha à valorosa classe dos advogados, entendo que cada advogado deve investir no aperfeiçoamento do seu escritório, adquirindo equipamentos como computador, scanner, pen drive, notebook etc.
Querer economizar nesse aspecto para contar com a digitalização de papéis de seu interesse por esperar o recurso e o tempo do Tribunal representa um tanto de comodismo e desinteresse pela qualidade do seu próprio trabalho.
A propósito, lembro-me de que, em 1999, celebramos uma parceria em Juiz de Fora - MG, entre a Diretoria do Foro local e a OAB-MG para a implantação de um dos primeiros serviços de peticionamento eletrônico do país.
No entanto, a maioria dos advogados não utilizou o serviço simplesmente porque, na época, não tinha implantado a Internet no seu escritório ou não sabia utilizar bem a Internet que tinha... Um deles me disse que sabia receber, mas não enviar arquivos...
Quando se fala em morosidade da Justiça é preciso que cada operador do Direito assuma sua parcela de culpa pela situação, ao invés de atribuir toda a responsabilidade ao Judiciário.
Chega-se, num caso como o das Varas da Freguesia do Ó, ao absurdo dos recursos tecnológicos disponibilizados pelo TJ paulista começarem a ficar emperrados pelo descaso de advogados quanto aos seu próprio interesse profissional em melhorar a estrutura do seu escritório.
A OAB deveria realizar convênios com empresas fornecedoras de equipamentos de informática, propiciar cursos sobre a matéria, incentivar seus inscritos ao aperfeiçoamento tecnológico etc.
Caso os advogados não invistam maciçamente em seu aperfeiçoamento tecnológico, o Judiciário não terá solução para o problema das novas filas... (http://www.amb.com.br/)
Alguém pode dizer, porque a culpa sempre recai sobre os advogados? Talvez porque seja mais fácil culpá-los do que admitir que a ineficiência passa em grande escala pelo Poder Judiciário e sua organização em nada organizada. Esquecem eles que o advogado, que também faz parte da administração da justiça, é apenas um usuário do sistema, uma ponte entre o jurisdicionado e a própria justiça. Esquecem eles que o maior interessado em se adequar ao sistema e as novidades do poder é o próprio advogado afinal, ele vive do seu trabalho... É o seu ganha pão.
Por outro lado ou, de outra sorte (?), passados alguns janeiros da virtualização dos processos nos tribunais brasileiros o que vemos é que a lentidão do judiciário não mudou muita coisa, são milhares de processos digitais emperrados esperando despachos, decisões e outros atos necessários para o seu desenvolvimento válido e regular, culpa de quem? Do advogado? Das partes? Dos auxiliares da justiça? Do juiz? De todos nós? Isso merece uma análise mais acentuada, inclusive pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que por mais esforços que empreenda ainda encontra resistências nos próprios tribunais quando o quesito é celeridade processual.
O que estou querendo dizer é que de nada adianta os operadores do direito (leia-se advogados) perderem os cabelos e a paciência cumprindo seus prazos e agilizando seus feitos virtuais, se a justiça não faz o seu dever de casa e deveria fazer, andar nos mesmos passos ou até mais rápido já que dispõe de uma máquina judiciária informatizada e pronta para uso contínuo sem maiores problemas. Quem não tem processos virtuais parados sem movimentação a espera de decisão neste país levante a mão por favor!
Um exemplo clássico do que escrevo aqui neste artigo, são os processos digitais que tramitam nos Juizados Especiais, cuja finalidade seria desafogar os fóruns de demandas pequenas e pouco valor econômico (seria mas não foi) e que se encontram emperrados e entulhados a espera de solução jurídica. Insegurança jurídica? Acho que sim. Nem vou comentar as opiniões das partes, são as piores.
Criados por uma lei federal de 1995, com o objetivo de dar celeridade à Justiça, os Juizados Especiais de Pequenas Causas estão, após 20 anos, abarrotados, com a fila de processos comparável à da Justiça comum. Inadmissível...
Afinal quem está emperrando mesmo os processos virtuais?
Nenhum comentário:
Postar um comentário